Garota das meias listradas

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Durante o percurso para a minha nova casa, Robert não fizera mais perguntas idiotas sobre a estranha garota na árvore ou mesmo questionou meu gosto duvidoso por cigarros falsificados, que no fim danificará meus pulmões. Apenas tornou a repetir como eu deveria ser um bom menino com a minha falsa mamãe, se eu quisesse ganhar presentes no Natal.

— Repito, mais uma vez... — Robert começa sua falação desnecessária.

— Já sei! — levanto uma das mãos, enquanto com a outra, esfrego meu olho arroxeado. — Já sei. Ser bonzinho com a madrasta.

— John... — Robert resmunga entre dentes. — Não há necessidade em chamá-la disso. O nome dela é Susan.

— Tá. — minha boca se entortar em uma linha de desagrado. — Susan, madrasta. Tanto faz.

Ah, "lar doce lar". Esta será minha casa pelo resto do ano. A residência de Robert fica no fim de uma rua íngreme, apertada entre casas velhas possivelmente com famílias grandes. É uma morada de dois andares, de madeira e pintada de amarelo. Os anões de jardim feitos de cerâmica possuem cores pálidas, quase desbotadas.

Salto do carro e coloco minha enorme mochila nas costas. Robert oferece ajuda, mas recuso. Afundo meus tênis na trilha de lama, enquanto Robert dispara na minha frente, abrindo a porta.

— Bem-vindo ao lar! — a voz de Susan, a minha nova "mamãe", emerge, balançando meus tímpanos com seu agudo desnecessário.

Assim que adentro a casa de Robert, sou pego totalmente de surpresa por minha madrasta, que posa diante de um bolo nada receptivo de cor verde-musgo, e pela filha dela, Lucy, que estoura uma gigante bola de chiclete cor de rosa. É bem crescida e posso julgar que deve ter entre doze e treze anos. Ela tem olhos azuis e cabelos pretos, lisos, e curtos na altura dos ombros, e uma franja reta sobre a testa. Ah, esqueci de explicar: Lucy não é minha irmã. Meu pai casou-se com Susan há cerca de quatro anos (no mesmo tempo em que parei de passar minhas férias escolares em Paradise), e, de brinde, ganhou uma filha. Que meigo, não?! Ele pode ser para ela, o pai que nunca foi para mim.

 Nem quero saber o gosto desse bolo de cor estranha. Há uma faixa de boas-vindas pregada na parede que poderá cair com um simples sopro. Ah, e minha madrasta enfeitou a casa com bexigas coloridas. Que meigo. Quantos anos ela pensou que eu tinha?

— Que merda. — resmungo de forma quase inaudível.

— O que disse, John querido? — Susan abre um sorriso largo. Dou de ombros.

— Nada. — rebato.

Reviro os olhos, arrumando a alça da mochila. Atrevo-me a subir as escadas e fugir daquela recepção constrangedora.

— Espere, filho. — Robert segura meu pulso. — Susan teve muito trabalho para fazer isso para você. Deveria ao menos, agradecê-la.

— Não tem problema, Robert. — Susan intervém como uma boa e intrometida fada madrinha. — Ele deve estar cansado da viagem. Pobrezinho. Deixemos ele descansar.

— Ouviu o que ela disse, não é? — aproveito a brecha que Susan deixou. — Estou morto de cansado e com dor nesse olho aqui. — aponto para minha pálpebra roxa, para o horror de minha madrasta.

— Quer um saco de gelo para pôr nesse olho, querido? — a gentileza de Susan está me dando nos nervos.

— Não, valeu. — apoio a mochila sobre um dos ombros. — Estou indo nessa. Pode fazer o favor de me soltar, papai?

Robert solta o meu pulso. Subo os primeiros degraus.

— Seu quarto é o terceiro à direita — a madrasta diz, inutilmente.

Nós, em uma casca de noz!Onde histórias criam vida. Descubra agora