Corações discordantes

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Recebi a primeira ligação de Regina, desde que regressei a Paradise. Mas óbvio que não pude atendê-la. Robert intrometeu-se para atender o telefone. 

Assim que Robert encerra sua falação com Regina, passa o telefone para mim, arriscando até mesmo a abrir um vagaroso sorriso. 

Oi, anjinho da mamãe — odeio quando ela me chama disso. — Aproveitando o tempo que está passando em Paradise? Adivinha só? Alfred ganhou um sorteio que nos mimaria com uma viagem por toda a Europa. Uma baita sorte, não?! 

— E foi por isso que esqueceu de ligar para mim esse tempo todo?

Ora, filhinho, não fique chateado, sei que está indo muito bem em Paradise. Só pelo fato de Bob não tê-lo mandado de volta, significa que você se comportou como um bom menino — incrível como depois de todos esses anos de separação, ela ainda chama  Robert pelo apelido dele. — Fez amigos na escola?

— Não sei. Acho que sim. Mãe, quando vou poder voltar para Los Angeles? — mudo bruscamente de assunto. 

— Por que a pergunta, John? Não está gostando de Paradise?

— Não, mãe, não é isso... — sequer consigo completar o meu raciocínio. Talvez eu queira fugir novamente, escapar de meus problemas sem querer encará-los de frente. Estou sendo covarde outra vez.

Queridinho, a mamãe está curtindo a viagem pela Europa. — escuto um barulho de vozerio ao fundo da ligação. — Não quer ver a mamãe feliz? Estou em Luxemburgo, e este lugar é simplesmente mágico. Estou sentindo-me em um conto de fadas. Alfred comprou uma câmera Polaroid e não perde a oportunidade para tirar fotos. Quando eu puder, vou enviá-las pelo correio para você.

Escuto-a tagarelar por um longo tempo, enquanto Regina elogia cada detalhe de Luxemburgo, e em como deseja morar no tal lugar, e até mesmo perguntou se eu queria conversar com Alfred, o que eu neguei, pois o que eu iria falar com meu padrasto? 

— Você vai ficar em Paradise até a sua formatura, então, comporte-se, lindinho da mamãe, e trate de estudar bastante. Robert é o seu pai. Ele vai saber cuidar de você. Beijinhos!

Ela encerra a ligação. Coloco o telefone no gancho. Regina não ligaria para mim de novo tão cedo. Ela só fez isto para não ficar com dor na consciência depois. Robert surge com uma ideia um tanto estranha, olhando para mim e para Lucy, que está soltando bolhas de sabão de sua varinha.

— Que tal irmos na videolocadora, para alugarmos uns filmes para assistir nesse fim de semana? — Robert bate e esfrega as palmas das mãos uma na outra. — O que acham da ideia?

Lucy assente, muito ansiosa, quase pulando do sofá. A empolgação através do brilho em seus olhos é contagiante, e permito-me que a aura desta "família de faz-de-conta" faça-me esquecer as bobagens que fiz em minha vida.

— Quero assistir O Mágico de Oz.

— Ah, por causa da peça da sua escola. 

— E também quero assistir Bambi, Branca de Neve e os Sete Anões, Peter Pan, Pinóquio e Cinderela.

Acho que Robert lamentou-se grandemente por sugerir a uma menina de doze anos quais filmes ela queria assistir.

— Bom, muito bom, Lucy. E você, John?

Fui pego de guarda baixa, afinal, eu não fazia ideia de que Robert tinha a intenção de levar-me para a locadora de vídeo. Dou de ombros e respondo que quando chegar no tal local, eu escolherei um filme que for de meu interesse. Susan é convidada para juntar-se conosco em nossa pequena viagem improvisada, mas ela recusa, alegando que está muito ocupada por causa dos seminários.

Nós, em uma casca de noz!Onde histórias criam vida. Descubra agora