Unicórnios antes dos garotos

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Qualquer partícula de fé que eu tenha, é minimamente esmagada. O que eu mais temo, pode ocorrer a momento, ter de fazer uma gastrostomia porque estou perdendo peso muito rápido, pois não consigo engolir ou comer mais nada. De quarenta um quilos que eu possuía, que já era um peso para lá de alarmante, estou com trinta e cinco. Ou meu maior pesadelo, ter de fazer uma traqueostomia³² porque aos poucos estou perdendo a capacidade de respirar devidamente.

Durante à noite, meus pulmões falharam, e senti que eu morreria pelo simples fato de não conseguir puxar o ar nem pelo nariz ou pela boca. Meus sintomas estão ficando cada vez piores. Obviamente, tia Ellie acordou em alerta, e tio Carl trouxera o nebulizador para mim. Foi uma terrível experiência e isto foi uma pequena amostra do que me aguarda pelo caminho. 

Pela primeira vez na vida, eu estou com medo. Porém, quando recordo-me do Infinito Amor de Deus por mim, e mesmo em tantas tribulações Ele ainda demonstra o Seu amor por mim, sinto-me imensamente grata. Nunca temi a morte, mas temo deixar sofrendo aqui na Terra todos aqueles a quem amo.

— Tia Ellie, por acaso viu em algum lugar o meu suéter de arco-íris? Não estou encontrando-o em parte alguma. 

Lanço para o alto e para os lados todas as minhas peças de roupas que estavam amassadas e empurradas no fundo do meu armário de cerejeira. O chão do meu quarto está uma verdadeira zona. Tem calças, camisas, saias e vestidos, todos jogados ao chão, pois estou em busca de meu adorado suéter de listras coloridas. 

— Menina, que bagunça é esta? Um furacão passou por aqui? Mary, você não é desse jeito! — tia Ellie até tenta me dar bronca mais não consegue, pois parece divertir-se mesmo perante à tamanha desordem. — Seu suéter está no cesto de roupas limpas.

Humm... já posso imaginar ter de usar o meu suéter limpinho e com cheirinho de amaciante de flores. É um dos pequeninos prazeres que a vida ainda reserva a mim.

— E para onde a mocinha vai com tanta pressa? 

— Ué?! Vou para a escola — anuncio com um sorriso estrelado. — Hoje vamos ao Observatório do Oregon.

— Por acaso é aquele observatório que fica em Sunriver?

— Esse mesmo.

— E que fica a uma hora daqui?

— Sim, senhora.

— E a mocinha quer ir para esse passeio assim mesmo? 

Aceno com a cabeça, em um fragmento de esperança para que a tia Ellie permita que eu vá para a excursão em Sunriver.

— Não lembro de ter assinado nenhuma autorização de viagem. Carl, venha já aqui agora mesmo!

Apesar de eu já possuir dezoito anos completos, ainda assim, preciso de uma autorização assinada pelos meus responsáveis para a excursão escolar, devido à fragilidade da minha atual condição. Seria muito irresponsável por parte da escola transportar uma garota com a saúde quase debilitada.

Tio Carl aparece, completamente calmo, como se a tempestade chamada "tia Ellie" não pudesse abalá-lo de forma alguma.

— Está sabendo a respeito desta excursão escolar, Carl? Porque, pelo o que eu sei, nenhum papel de autorização passou pelas minhas mãos.

— Eu assinei a autorização da Mary, meu bem — meu tio explica, com um sorriso amigável no rosto.

Meus tios são o exato oposto um do outro. Tia Ellie é muito esquentada, demasiado preocupada comigo, como se eu fosse estilhaçar-me diante de seus olhos a cada decisão equivocada que tomo. Já o tio Carl, é um homem de temperamento tranquilo, e ele quer que eu aproveite cada mínimo segundo que me resta. Não direi que ele é um homem que gosta de atender os meus caprichos, mas diferente da tia Ellie, ele quer eu seja feliz fazendo tudo o que gosto, ao invés de minguar trancada em meu quarto, contando as horas para a doença paralisar cada pedaço de mim.

Nós, em uma casca de noz!Onde histórias criam vida. Descubra agora