Capítulo 7 - Esperança

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O solo seco me parece cada vez mais rachado. Vejo casas e prédios que um dia foram habitados, mas agora não passam de escombros; inúmeras crateras e a vegetação é quase nula.

Vejo também algumas criaturas movimentando-se apática e lentamente, sem rumo, por aquilo que um dia foi considerado uma rua.

Os dias são escuros e as noites são as trevas. Algumas pessoas lutam para continuar sobrevivendo, mas muitas não têm sucesso. As crateras afundam-se mais a cada dia, e novos vulcões surgem, engolindo cidades inteiras.

As poucas ilhas ainda funcionais que restaram estão cada dia mais próximas da extinção, seja por falta de alimento ou por ataques externos das criaturas que nós mesmos criamos em nossa arrogância e egoísmo.

Não temos mais muito tempo.

Continuo sobrevoando territórios em busca de algum sinal que nos diga que estamos errados, que o mundo não está com seus dias contados, estamos apenas sendo dramáticos... Mas não encontro nenhum.

Quanto mais eu procuro, mais encontro o sinal oposto.

Já estou há um ano e meio nessa missão. É hora de voltar para casa. Não há mais o que fazer. Só nos resta ficar junto daqueles que amamos, olhar em seus olhos e passar os últimos momentos sem mais arrependimentos, torcendo para que a nossa morte seja indolor e para que tudo acabe rápido.

Já sofremos muito em vida.

Vou de encontro ao navio UK-1405, ancorado a dois quilômetros da orla daquilo que um dia foi chamado de Moçambique. Essa distância é necessária para evitar os ataques.

Pouso no deque sem muito esforço e volto à minha forma humana, já recebendo a minha túnica branca de linho dos agentes que aguardavam meu retorno.

Visto-me e vou direto para os meus aposentos descansar. Estou exausta. Preciso deitar e dormir antes de qualquer outra coisa. O capitão do navio já foi avisado e já está levantando âncora para partir em direção ao complexo da Corporação. Minha missão chegou ao fim.

Deito-me na cama e, assim que fecho os olhos, caio em sono profundo, tão grande é o meu cansaço.

Abro os olhos algumas horas depois. Já está de noite. Levanto ainda zonza e vou direto para o banheiro tomar um banho, colocar roupas limpas e decentes. Mais tarde, vou comer alguma coisa com o resto da equipe. Tenho que começar a aproveitar mais tempo com pessoas que conheço.

Calculo que o navio chegue na ilha-porto em dois dias. Até lá, evitarei dar más notícias à equipe. Eles já temem o pior, mas a esperança é a última que deve morrer.

Suspiro fundo ao olhar-me no espelho. Estou com uma aparência horrível. A minha esperança morreu. É como se eu fosse apenas uma casca vazia. Minha pele já não brilha mais.

Eu já fui uma deusa Suprema. Hoje sou apenas um ser vivo, tão fadado ao fim quanto as criaturas que nós sempre julgamos inferiores... Criaturas que usamos como simples peças de xadrez em um tabuleiro tratado com negligência e ignorância. Quanta estupidez...

Meus olhos castanhos só transmitem cansaço e desânimo. Também vejo neles o arrependimento, a culpa e muito pesar. Começam a aparentar minha verdadeira idade, o que é um tanto quanto... Assustador.

Estou com olheiras e minha pele, antes bronzeada e imaculada agora está pálida e mal tratada. Meus longos cabelos negros estão embaraçados e sem corte. Sem paciência para ajeitá-los, apenas os enrolo num coque mal feito.

Que se dane também.

Saio de meus aposentos e sigo em direção à cozinha. A equipe se surpreende com a minha presença, mas eu apenas forço um sorriso e digo que senti vontade de ficar um pouco com eles.

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