Capítulo 2 - Sonhando (Parte II)

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Uma leve garoa começou a cair lá fora, enquanto no carro o silêncio reinava. O trânsito que já era ruim parecia piorar a cada minuto. Encostei minha cabeça no vidro gelado da janela, suspirando. Fiquei olhando os outros carros e as gotas de chuva caírem. Algo dentro de mim se remexia, era angustiante, eu não conseguia estar perto do idiota do meu chefe... Não depois dos sonhos da noite passada. Ainda bem, ainda bem que nenhum ser humano pode ler mentes...

O telefone de Alexandre tocou e eu desviei minha atenção da rua brevemente (para prestar atenção na conversa, lógico).

— Fala logo o que você quer Ruth. — Encostou o telefone entre seu ombro e seu ouvido. Eu quase ri do modo como ele a tratou, mas preferi fingir que estava desinteressada.

Alexandre era um ogro com todos, embora do seu jeito, desse certinho com Ruth, sua noiva. Ela fazia o tipo de Clarisse e Verônica: megera. Por isso não tirei sua razão em ser grosso, até eu seria, considerando o quanto Ruth era uma vadia esnobe e chata. Ok, talvez eu tenha pegado pesado.

— Eu não tenho tempo pra isso, ok? E não fique ocupando a minha linha! — ele "pediu". — Foda-se, eu não quero saber de que porra de sapato você quer comprar, o dinheiro é seu e você enfia ele aonde quiser! — dessa vez o bonitinho gritou. Estreitei os olhos. Por mais chata que ela fosse, ele merecia um tapa agora. — Olha eu preciso trabalhar. Vê se não me perturba mais.

Depois disso ele bufou e desligou o telefone em sua cara. Arregalei os olhos, surpresa. Acho que não gostou muito do papo dela. Bom, quem gosta, né? Ela só fala futilidades e blá blá blá.

E aí o silêncio já se fazia presente de novo. É, eu não gosto do silêncio.

Nem um pouquinho.

— A namoradinha já ligou pra saber onde você estava. — afirmei rindo debochadamente, arriscando um comentário maldoso. Ainda não estávamos naquela relação chefe/empregada, então, eu poderia me aproveitar um pouco disso. Pelo menos eu acho. — Ou melhor, com quem estava.

— Vê se não enche o saco você também que hoje eu não estou de bom humor. — Falou sem tirar os olhos da estrada. — Vocês duas deveriam dar as mãos e pular de um penhasco.

Olhei-o horrorizada.

— Grosso! Vai chover macarrão no dia que você estiver de bom humor.

— Eu geralmente estou, Dionísia, mas você não merece a minha boa educação. — ele deu um sorriso de canto. Ai.

Virei realmente disposta a matá-lo dessa vez. Eu odiava que me chamassem pelo meu humilhante nome do meio. Odiava!

— Não me chama de Dionísia porque você sabe que eu não gosto! — gritei, profundamente ofendida.

Ele bateu no volante e eu dei um pequeno pulo.

— Não grita comigo que eu não sou seus "pareceiros", valeu? Se ponha no seu lugar, Srta. Vasconcelos. Você não passa de uma empregadinha, então tem que fazer o que eu mandar. — disparou, aparentemente alterado. — E como você é lerda e não percebe quando alguém não está a fim de papo, eu te falo com todas as letras: cale a maldita boca. Se possível não respire. Não se mexa. Não faça nada que me lembre que você está aqui. Talvez assim eu goste um pouquinho mais de você. — o cínico encerrou.

Ah, eu podia ter ficado quietinha, não podia? Murchei na hora. Eu sei a hora de ficar calada... Pelo menos isso. Acabei sendo o outro alvo das grosserias matinais dele, mais do que eu já era. Merda.

Assim que o carro estacionou na garagem do prédio, agradeci mentalmente por chegarmos do que pareceu uma eternidade de enclausuramento ao seu lado. Nem quis esperar. Abri a porta e saltei do carro às pressas, indo em direção ao elevador. Ele estava quase chegando, mas só de raiva eu não segurei o elevador para ele. Então eu estava subindo rumo ao oitavo andar, finalmente podendo jogar-me em minha cadeira. Longe do Martins... Mas no máximo por cinco minutos. Eu estava pronta para ser xingada pela minha "petulância", mas de novo, não me importei.

O que eu sempre quisOnde histórias criam vida. Descubra agora