Capítulo 12 - Trégua

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Alguns dias se passaram até que finalmente meu tio sairia do hospital. Alexandre e eu fomos os intimados a ir buscá-lo. Não achei ruim. Estávamos numa boa nos últimos dias. Certa noite chegamos a dormir sentados no sofá, por ficar até tarde conversando besteiras depois que Jonathan e Rebecca foram dormir.

Foi legal, serviu para nos conhecermos melhor... Estranho mesmo foi acordar no meio da noite e constatar que estávamos deitados numa posição bem estranha, já que provavelmente nos mexemos durante o sono. Torci para que ninguém tivesse acordado no meio da noite e passado por ali. Acordei-o e cada um foi para o seu quarto, meio acabados, já que o sofá não estava confortável.

Tio Fernando estava bem animado quando o vimos, o que me espantou de qualquer outro pensamento.

— Até que enfim o casal chegou! — comemorou.

— Pai, não fala besteira. — Alexandre pediu enquanto pegava uma pequena mala com as coisas dele, que estava com o braço na tipóia, mas apenas por mais uns dois dias.

— Acho que esses remédios estão afetando demais o senhor. — brinquei.

— Besteira. Vocês são dois, duas pessoas formam um casal, oras.

— Sim ,mas pra isso elas tem que ter envolvimento amoroso. — nós já estávamos indo para o carro quando o ouvi murmurar algo, mas quando pedi que repetisse, ele riu e disse:

— Nada. Estou feliz porque vou pra casa.

— Já era hora. Estamos animados com a sua recuperação. — Alexandre acelerou e ganhamos a estrada.

— E já que estamos falando disso... Preciso falar com vocês sobre umas coisas que andei pensando nos últimos dias. Não sei, isso tudo que aconteceu, percebi como a vida é efêmera, garotos. E eu gostaria, do fundo do coração, que vocês fossem amigos. Sabe, brigar é perda de tempo, agora mais que nunca eu percebi isso. E sempre desejei que vocês fossem próximos... E esperava que fizessem isso por mim.

— Por mim tudo bem. — não hesitei em concordar.

Alexandre ficou alguns segundos mudo antes de responder.

— Tudo ok.

Olhei tio Fernando, que sorria, e aquilo me doeu um pouco, de certa forma. Se ele tivesse morrido naquele acidente, nós dois carregaríamos a culpa de desagradá-lo com nossas brigas por todo esse tempo. Ainda bem que da tempo de reparar... Eu acho.

***

Mais uns dias e meu tio estava com o braço recuperado. Tirar a tipoia deu um ânimo louco a ele. Foi engraçado vê-lo convocando a família em peso para uma reunião na sala.

Todos se sentaram e ele começou a falar...

— Bem, os últimos dias foram de muito estresse, e eu acho que a família inteira merece um descanso.

Cadu comemorou. Tio Fernando o olhou feio.

— Você não é da família. — eu ri. Cadu pareceu extremamente ofendido, e meu tio emendou — é brincadeira. Enfim, eu acho que todos nós deveríamos ir aquele sítio do meu amigo, o Camargo, nós já fomos uma vez, se lembram?

— É aquele onde nós cavalgamos? — tio Fernando concordou. — Nós precisamos voltar lá! É incrível!

— A piscina é demais, a casa é demais, eu topo. Uma semana? — Jonathan questionou.

— Isso! Eu decreto férias ao Cadu e a Helena, e aí está feito.

— Férias... Sinto o gosto dessa palavra na boca. — brinquei.

— E a Ruth, Alexandre? — gelei ao ouvir esse nome.

— Está viajando.

— Ui, pra onde ela foi? — Verônica questionou.

— Paris. — chique!

— Enfim, somos só nós, partimos amanhã de manhã, tudo bem pra vocês? — a concordância foi geral. — Então vão fazer as malas!

Todos correram da sala. Foi engraçado. Um pouco de sossego seria bom, eu supus.

***

 Mala pronta com tudo que eu precisaria: biquínis, roupas confortáveis, protetor e óculos de sol. Depois de terminar de arrumar tudo e pôr o celular para despertar eu me joguei na cama, porém não consegui dormir direito. Fiquei virando de um lado para o outro por um bom tempo... Não sei se a ideia de viajar me deixava ansiosa, embora eu não fosse mais criança, ou se... Se a menção a Ruth me deixou daquele jeito. Foi duro admitir para mim mesma que estava com ciúmes e que ficava mal por saber que Alexandre já tinha alguém... E que cada vez mais eu me convencia de que tinha sentimentos por ele. Uma merda. Um raio já podia cair na minha cabeça e me levar daqui.

 Não vi quando o dia amanheceu porque finalmente consegui cochilar. Meus sonhos foram estranhos e sem sentido, mas não pude lembrar dos detalhes. Levantei mais cedo que o despertador e o desativei, tomei um banho e fui para a cozinha. Clarisse já estava lá preparando alguns sanduíches.

— Bom dia... — Minha voz saiu um pouco sonolenta. Só de olhar para os lanches eu estava sentindo a minha barriga doer de fome. — Você precisa de ajuda?

Ela sorriu.

— Claro.

Comecei a trabalhar ao lado dela. Era estranho como ela estava amistosa comigo nos últimos dias, quase carinhosa... Para alguém que evidentemente me detestava antes, era uma mudança e tanto.

Nós acabamos rapidamente, eu coloquei meu café e roubei um dos sanduíches. Ela riu.

— Ficou bom?

Concordei e continuei comendo. Continuamos em silêncio,mas ela estranhamente me observava atentamente, fiquei um pouco envergonhada. Seu sorriso diminuiu um pouco antes que ela começasse a falar.

— Sabe Helena, eu... — suspirou — Não sei como dizer direito, não sou muito boa com as palavras, já deve ter percebido. Mas queria agradecer pelo que fez por nós durante todos esses dias que o Fernando ficou no hospital. Segurou a barra quando ninguém estava tão bem assim emocionalmente, não nos deixou brigar, ajudou muito aqui em casa, enfim... — seus olhos estavam marejados e os meus instantaneamente ficaram também — Ser manteiga derretida é uma droga. — nós rimos. — Você nos manteve unidos. Foi bem importante.

— Foi o meu papel como membro da família... bem, pelo menos eu acho que eu sou. — sorri timidamente.

— Claro que é!

Fiquei feliz com sua resposta.Talvez aquele fosse um recomeço. Ter sua aceitação me faria ficar mais à vontade naquela casa.

— Bom, eu vou terminar de guardar os sanduíches aqui, logo os Martins vão acordar. Imagino a cara que vão fazer por acordar cedo... Prepare-se pra rir.


O que eu sempre quisOnde histórias criam vida. Descubra agora