Prólogo

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Os dois remos pairavam depositados no fundo da pequena canoa, perto dos três pares de pés descalços. Enfeites coloridos de algodão entrelaçados a sementes, enfeitavam os tornozelos, braços, cinturas e eram as únicas indicações de vestes. Alguns peixes, recém pescados, pulavam dentro da tosca embarcação, em uma agonizante luta pela vida.

As águas, para onde quer que se olhasse ou a vista alcançasse, eram totalmente límpidas e transparentes. A cor azul, em diferentes tonalidades, dominava praticamente todas as direções em uma sequência quase infinita, quebrada somente pelo verde da vegetação da enorme ilha do lado oeste, onde palmeiras e árvores altas, balançavam ao vento em uma floresta densa.

A leve canoa subia e descia ao sabor das águas. Seus ocupantes satisfeitos, consideravam o dia ganho. O pai em seus trinta e poucos anos, forte, olhos negros, cabelos longos, da mesma cor dos olhos, observava orgulhoso os dois filhos: Ubiratã de quatorze anos, de pé na canoa, com arco e flecha empunhados, ainda queria pegar mais alguns peixes, mesmo que o pai tivesse dito que já tinham o suficiente para a família por, pelo menos, uns dois dias; já Aimberê, o jovenzinho de apenas doze anos, exibia sua última conquista, um peixe enorme, mais que a metade de sua perna. Pescara com o arco e precisou da ajuda do pai para retirá-lo da água. Eles teriam uma boa refeição para levar para a família em terra firme.

O irmão menor voltou a examinar os peixes. Acompanhava com os olhos o movimento dos que ainda não haviam morrido. Então, ao endireitar o corpo e levantar os olhos, sua visão foi atraída por algo na imensidão azul. Um movimento estranho sobrepunha às águas no horizonte, como um pequeno objeto flutuante com uma ponta preta. Ele percebeu atento, que alguma coisa surgia das profundezas oceânicas. Ainda eram só pequenos pontos emergindo e destoando do azul contínuo, mas havia alguma coisa lá.

***

Instantes depois já era possível, aos três, perceberem que as coisas, surgidas no limiar do oceano, eram três, enormes e estranhas. Podiam visualizar cerca de três cabeças, ou mais, em cada um dos seres. Ou talvez fossem asas. Mas se eram asas, eles não as estavam usando para voar, pois somente deslizavam sobre as águas. Ainda assim, rapidamente se tornavam mais próximos, maiores, mais nítidos e assustadores. E, com certeza, vinham em direção a eles, ainda que muito distantes.

***

Agora pai, e filho mais velho, de costas para o mar, remavam sofregamente em direção à praia. O menino mais novo, sentado em direção contrária, segurava com força na beirada da canoa, com olhos arregalados, fixos no horizonte. O verde das matas ainda se encontrava longe, mas eles continuavam avançando. Cada metro vencido os deixava mais perto da praia. Eles acreditavam que lá teriam mais chances contra aquelas coisas. Em terra, com certeza, haveria mais homens do seu grupo. Também tinham esperanças de que os monstros não chegassem em terra.

As tantas lendas diziam de seres grandes e desconhecidos, que habitavam os mares. Falavam de deuses que habitavam os lugares celestiais e subterrâneos, davam conta de demônios e seres maléficos. Que fossem como muitas lendas diziam: monstros marinhos.

Os braços insistiam com força nos remos, perfurando as águas. A respiração demonstrava cansaço e os músculos estavam retesados. Persistiam fortes, incansáveis o irmão mais velho tentava ler o olhar e face do pequeno. Mas, por mais que se esforçasse, Aimberê não conseguia entender o que via.

Os três seres que emergiram do grande precipício onde o mar desaba, eram parecidos uns com os outros. Possuíam várias asas que, ao vento, se deixavam conduzir em direção a eles. O corpo enorme deslizava sobre a superfície marítima, como as aves selvagens nos lagos. O corpo era escuro e asas brancas.

Os corações batiam acelerado, as mãos estavam trêmulas. O pai clamou por seu deus. Os filhos o imitaram. Era só chegar em terra, só isso. Depois correriam para a floresta. Lá não seriam encontrados, se os grandes monstros os seguissem.

No mar azul os seres, em número de três, pararam. 

 

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