Quem sabe eu esteja me adiantando demais na história. Estou contando tudo de forma confusa, mas espero que vocês compreendam que a situação era crítica. Eu amava um clone; os outros sobreviventes não davam a mínima para ela, apenas se preocupavam para a própria sobrevivência. Éramos um grupo apenas porque era mais fácil sobreviver juntos. Mesmo assim era difícil. Brigávamos pelos recursos. A comida ficava cada vez mais rara; a água desaparecera quase que por completo. Às vezes chovia. Pingos de chuva ácida, que só serviam para prejudicar tudo.
Não era fácil viver num mundo como o nosso. Um mundo decadente.
***
Faz muito tempo que não olho para as estrelas. Quando elas aparecem, simplesmente as ignoro; mesmo que normalmente estejam encobertas por um manto de nuvens cinzentas que nunca liberam sua chuva potável... ou o que se poderia chamar disso.
Água vale muito, não importa de que maneira chegue até nós.
Contanto que mate a sede, não pode ser desperdiçada.
— E a minha parte? — Perguntou Liel. Não poderia ser ninguém outro.
Ele falava a respeito da garrafa de água que eu arranjara para Char. Normalmente dividíamos todo o líquido, assim como a comida. Ele, no entanto, estava excepcionalmente irritante nos últimos tempos.
— Guarde para quando estiver realmente com sede — rosnei. — Não é porque você deseja me irritar que precisa beber toda a sua água agora.
— Não quero irritá-lo. — Respondeu, em tom calmo.
— É o que está fazendo agora.
— Estou te irritando?
— Simplesmente fique de boca fechada.
— Calem a boca — disse Yuma. — Querem tanto assim chamar a atenção?
Estávamos na rua. A procurapor um lugar para nos escondermos à noite seria concomitante à busca por sobreviventes.Começava nossa mais nova jornada.
***
Em 11 de maio de 2031 caiu a última chuva de água potável de Nova York.
Não foi grande coisa. Pelo contrário, foi uma pequena pancada. Ainda assim, pouca gente deu-lhe atenção. Quando caiu, eu estava embaixo de uma tenda de frutas, passando o tempo tanto quanto refletia sobre qual roubaria. Foram poucos pingos, caindo com um som fraco sobre a lona da tenda.
— Droga. Era só o que me faltava. Chover! — Comentou um homem a meu lado. — Vou perder a reunião tarde.
Levantei os olhos das maçãs e o encarei.
— Você ainda tem coragem de reclamar? — Meus olhos semicerrados.
— Como é? — Ele pareceu ofendido e surpreso.
— Tem coragem de reclamar da chuva? — Repeti. — Não sabe que essa pode ser a última que você jamais verá? Depois de tudo que está acontecendo com esse lugar que chamamos de Terra, ainda tem coragem de reclamar? — Olhei fundo em seus olhos, semicerrando os meus ainda mais e apontando o indicador para seu peito. — A culpa é sua.
Afastei-me, e ele observou eu pegar uma maçã.
— Você tem de pagar por isso!
Mostrei-lhe o dedo médio e limpei a maçã no manto, deixando-a brilhante e entrando na última chuva potável que também eu jamais veria. O homem continuou gritando às minhas costas. Seria morto três dias depois. Não que isso tenha importância, é claro.
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Agora eu Morro
Science FictionEm uma grande cidade, quatro pessoas tentam sobreviver ao terrível ano de 2033, quando grande parte dos problemas mundiais, como a falta de água e o aquecimento global, explodem junto de uma bomba de hidrogênio em Berlim. A radiação se espalha pelo...