— E então vocês foram para a Espanha.
— Chamávamos de Hispânia, na época. Fomos para Nova Cartago para auxiliar Aníbal em suas campanhas.
— Nova Cartago?
— Hoje se chama Cartagena. Achei que você saberia disto.
Char deu um murro fraco em meu ombro, rindo.
— Minha memória de estudos não é mais a mesma. Ainda que me lembrei de Aníbal Barca, e isso é uma grande coisa! — disse ela. — No final das contas, sempre dizem que você esquece tudo que aprendeu na escola. Ou é o que eu ouvi dizer. Aprendi no instituto, mas, mesmo assim, ando esquecendo de tudo isso. Sorte que eu gostava de estudar história.
— É verdade — eu disse. — Memórias que não acessamos são esquecidas, uma hora ou outra. Tanto que nem mesmo lembro de meu nome — falei, tentando dar motivos para não revelá-lo.
Ela riu. Quando parou, pareceu séria.
— Estranho — ela disse.
— O quê?
— Não vi nenhum sedento por aqui.
— Melhor para nós — eu disse, me sentando e olhando para a rua em frente ao hotel. Havia uma grade em toda a volta, mas o portão continuava aberto. Como eu não havia me lembrado de fechá-lo?
Mesmo assim, não havia sinal sedentos gritando ou vindo em nossa direção. Não havia sinal de alma viva, excetuando-se nós. Olhei por toda a extensão da rua. Estava deserta.
— Será que...
— Morreram? Sim. Acredito que sim.
— Acho que não tem muita água por aqui — disse Char. — Será que a falta de água matou a todos? Ou quem sabe estejam apenas se escondendo.
— Vamos falar sério, Char — eu disse. — Essa não é uma cidade pequena. Nós sobrevivemos em Nova York, e não fomos os únicos. Ainda existiam sedentos. Aqui eles não existem mais, e é uma bênção! Pode ser que eles não tenham tido acesso à água por que alguém conseguiu pegá-la antes deles. Além do mais, porque estariam se escondendo? E de quem?
— De nós, Imort... estão se escondendo de nós para fazer uma armadilha.
— Uma armadilha?
— Para pegar nossa água.
Pensei a respeito e percebi ser possível. Por mais que fossem um pouco loucos, devido à sua situação de sedentos, ainda eram seres humanos. E seres humanos geralmente são inteligentes.
***
— Está bem — disse Aníbal, apontando para o mapa à sua frente, em algum ponto que de minha posição eu não conseguia enxergar. Não entendo realmente como acabei entrando na tenda do general, mas lá estava eu. Às vésperas da Batalha de Cannae. Hanno também estava lá, dando ideias.
Eu não sabia que estava prestes a presenciar e viver a maior das batalhas daquele general. E quem sabe a maior batalha da minha vida. Um marco que faria eu me tornar um imortal.
Eles estavam criando uma estratégia incrível, mas eu chegara tarde e não entendera muita coisa.
— Está decidido — ele disse. — Amanhã começamos a pôr o plano em prática.
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Agora eu Morro
Science FictionEm uma grande cidade, quatro pessoas tentam sobreviver ao terrível ano de 2033, quando grande parte dos problemas mundiais, como a falta de água e o aquecimento global, explodem junto de uma bomba de hidrogênio em Berlim. A radiação se espalha pelo...