"A Estrela do Entardecer"

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"Salva-me da boca do leão; sim, ouviste-me, desde as pontas dos unicórnios"- Salmos 22:21

             A tropa de guerreiras montadas nos unicórnios rasgava os céus e pousava a alguns metros de Leviathan. Os olhos do demônio do mar pararam na direção delas enquanto o mesmo abria um sorriso cínico e enigmático, sem expressão alguma nos olhos.

— Sério isso? — começou Leviathan em um tom de desprezo e ironia — Não posso acreditar que vocês são a "cavalaria" deles!

Dentre a tropa de guerreiras montados em unicórnios alados, saiu uma figura angélica com uma armadura metálica, com um elmo com detalhes em dourado na cabeça, com um escudo gigantesco na mão esquerda e uma lança na direita, onde ao invés da lâmina triangular na ponta, encontrava-se uma Estrela. Por causa da armadura e da distância não dava para saber se era homem ou mulher, mas, por um curto momento, Halley pode reconhecer aquela aura tão esmagadora e poderosa, sóbria mas que havia tido um pouco de luz em seu interior por muitos Éons de existência. A nefilim deu um passo para trás quando a figura abriu quatro asas de querubim belíssimas, cravejadas de todos os tipos de pedras preciosas. Halley viu quando Ícaro estremeceu ao ver aquelas asas, e pelo semblante do Arcanjo Mortal ela viu que ele percebera a quem aquelas asas pertenciam, ao senhor das trevas, a Estrela da Manhã, Lúcifer.

O anjo tirou o elmo e aquela cascata prateada — que era a cabeleira do líder dos caídos — escorreu pelos seus ombros largos e definidos do mesmo jeito que ela se lembrava desde a vez que o enfrentara no templo de Ares, o deus da Guerra. A beleza do querubim caído era tanta que chegava a ofuscar a luminosidade da pele de Leviathan. Os olhos azuis de tom turquesa, onde finas linhas douradas entrelaçavam-se no azul das irises, percorriam por todo o salão e pararam em Halley. Aquela face que um dia fora de Natan havia se perdido no meio de tantos acontecimentos que a nefilim já não podia mais vê-lo no rosto do anjo caído. A cada passo que Lúcifer dava, um som de metal ecoava no lugar, então ele parou entre Ícaro e Levih e tocou na espada do Arcanjo Mortal, desintegrando-a.

— O-o que ele e-está fazendo aqui? — Perguntou Halley a Ícaro, porém o mesmo não respondeu, pois estava ocupado demais vendo sua arma tornar-se pó.

Uma brisa passou por entre eles e fez com que os belíssimos cabelos cor de prata de Satan voassem, deixando a mostra um desenho no pescoço — semelhante a uma tatuagem — em formato do simbolo astrológico de gêmeos. O senhor do inferno apontou a lança para Leviathan e disse:

— Leviathan, seu imundo, já não bastava ter atacado a Betel da Grécia? Por que estás aqui? O que pretendes fazer destruindo todos os templos legionários?

— Querido Vésper — disse Leviathan — acho que a resposta você sabe, mas é melhor abaixar essa lança, até porque a espada que me atinge não me faz nada, nem a lança nem a flecha nem o dardo, ou já esqueceste?

Vésper? Que diabos era Vésper? E por que Lúcifer os estava protegendo? Isso não fazia sentido! Não era ele que queria matá-la por tanto tempo?!

Ícaro estremeceu-se e Halley escutou quando ele sussurrou algo para si mesmo, mas fora impossível de entender.

— Ícaro — disse Halley — o que está havendo aqui?!

— Por muito tempo, acreditei que aquela história fosse apenas mais um mito, e que não fosse possível de existir, mas... ele está aqui! Eu já deveria saber...

Halley não estava entendendo nada do que ele estava falando, até que Tsuki aproximou-se deles e disse:

— Halley, não temas! Esse não é Lúcifer, acalme-se! Ele é Luciel. É o querubim pretor da Grécia. — Como poderia um anjo ser tão idêntico ao senhor dos demônios, a não ser pela cor das asas? Aquilo era impossível, como poderia haver uma réplica perfeita de Satan, porém boa?— É confuso, eu sei. Mas querida, imagine um enorme Yin Yang na sua frente.

Halley fechou os olhos e pode ver a figura formar-se na vasta negritude que tomara conta de seus olhos.   

—A parte negra— continuou Tsuki — é chamada de Yin, as trevas, a noite, tudo ligado a escuridão, já a parte branca é chamada de Yang, a luz, o dia, e tudo que há na claridade.

Ícaro entrometeu-se e disse:

— Esse querubim, o pretor da Grécia, nasceu do mesmo raio de luz que a Estrela da Manhã, por isso muitos o consideram irmão gêmeo do próprio senhor das trevas, o chamam de a Estrela do Entardecer, contrapondo-se à Estrela da Manhã, que é Lúcifer.

— Na mitologia grega — continuou Tsuki , colocando-se entre Halley e Ícaro — haviam dois irmãos gêmeos, Heosphoro, também conhecido como Phosphoro, a própria Estrela da Manhã, e o outro que se chamava Héspero, a Estrela do Entardecer. Os romanos chamavam Heosphoro de Lúcifer e Héspero de Vésper, ambos os deuses nascidos da mesma mãe, a deusa do Alvorecer, do mesmo jeito que ambos os anjos nasceram do mesmo raio de luz. Já na mitologia ugarit, havia dois deuses gêmeos, eles eram os irmãos, Shalim, o deus do entardecer que seria Vésper, e Shahar, o deus do amanhecer que seria Heilel Ben-Shahar, a Estrela da Manhã, o Diabo

— Então — começou Halley — Lúcifer seria o Yin e Luciel seria o Yang? Um a escuridão e o outro a luz?

Antes que a pretora pudesse falar, Ícaro entrometeu-se, dizendo:

— Não necessariamente, já que a princípio, Lúcifer fora um anjo iluminado, formado unicamente de luz, então se ele não fora feito de trevas, como ele iria sê-la?

Halley virou-se para Luciel que se movimentava com passos leves, tão leves, que parecia estar deslizando, ou até, flutuando. Leviathan cerrou seus olhos amendoados e brilhantes como raios do amanhecer e abriu um belo sorriso branco, mas perolado, caminhando cada vez mais em direção a Luciel. 

— Seu imbecil  — disse Leviathan, enquanto alisava algumas madeixas de seus cabelos  — como você tem a audácia de apontar essa lança velha para mim? Logo eu, o Leviathan, que trouxe o terror aos mares?

— Cala-te! — Gritou Luciel, armando suas asas, enquanto sua lança transformava-se numa espada prateada. — Teus dias estão contados, serpente imunda! Pois com a vinda de Tehom, também virá a tua destruição.

— Não enquanto eu possuir esta belezinha aqui!  — Disse o demônio andrógeno balançando seu amuleto.

Tsuki, a pretora do Japão, virou-se para Halley, fixando aqueles olhos frios, com um par de luas ao invés de írises, na nefilim, para dizer:

— O único jeito de derrortar Levih... ou melhor, Leviathan, é destruindo aquele seu medalhão que o protege de tudo e de todos que tentam enfrentá-lo. Mas o que eles querem? Se Raphael tivesse me dito o código, tudo seria mais fácil.

E Halley lembrou que antes de saírem de Betesda, Raphael havia dito: "Quando encontrarem a pretora do lugar para onde vocês vão, digam que eu os mandei para lá, digam que foi código 145 e código 368". Ela então, virou-se para a anja dos olhos lunares e disse:

— Senhora, eram os códigos 145 e 368.

— Como? Não entendi!

Leviathan, então, tirou uma espada negra, mas resplandecente, das costas e lambeu-a, passando sua língua de serpente por entre os furos que a espada possuía, mostrando seus lábios rosados e brilhosos, enquanto fechava seus olhos, ressaltando os seus enormes cílios delicados.    

— Essa é a espada do Caído Primordial, o anjo chamado Yekun! — Leviathan abriu seus olhos, brilhosos como a luz do alvorecer, e continuou — Nossa! Ela tem gosto de triunfo com uma pitada de metal e escuridão. Estão prontos para saboreá-la também, seus vermes insolentes?

As Asas de Um Anjo - Livro II da saga 'A Última Nefilim'Onde histórias criam vida. Descubra agora