01. Há algum sentido?

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Eu estava descendo as escadas com a maior velocidade - e cuidado- que eu podia. Infelizmente, acordei mais tarde essa manhã, coisa que é rara quando se trata de mim. Normalmente sou bem matinal.

-April! Vem logo! Você vai se atrasar!- Minha mãe gritava da cozinha.

Aliás, acho que toda a família Wrink era bem matinal. Minha mãe estava provando esse fato para os nossos vizinhos nesse exato momento.

-Eu sei disso, mamãe.- Falei baixo, mas em um tom que ela pudesse ouvir da cozinha. Cheguei na sala de jantar e o café da manhã estava posto sobre a mesa.

-Bom dia, filha!- Meu pai disse, sempre com um bom humor notável. Seus cabelos grisalhos ainda não tinham sido penteados e estavam numa grande confusão cinzenta.

-Bom dia, pai.- Eu respondi, retribuindo o sorriso.- Bom dia, August.- Eu disse para a criatura de 15 anos sentada ao meu lado, que comia sorrindo. Acho que todos estavam muito felizes, mas fala sério, que razão teríamos para não estar?

-Bom dia, mana- Ele respondeu, terminando seu cereal e indo em direção á cozinha para jogá-lo na pia.- Já estou indo embora, vai demorar muito?- Ele perguntou gritando de onde estava.

-Já estou indo!- Respondi, pegando uma maçã e saindo da sala de jantar.- Tchau mãe, tchau pai, amo vocês.- Eu disse, tentando memorizar cada peça de roupa que eles vestiam. Era um hábito que eu tinha, gravar o que as pessoas que eu amo estão fazendo sempre que nos separamos. Não quero ser pessimista, longe disso, mas eu não sei quando vou voltar a vê-los. Tudo pode acontecer em alguns pequenos segundos.

Corri para a porta e consegui alcançar August. Fomos andando para a escola, e, ao chegar lá, ele foi conversar com seus amigos. O grande letreiro com as palavras: " ASC High. A sabedoria é a arma mais letal." brilhava sobre o Sol reluzente.

Eu rio um pouco lendo esse dizeres, mas não há um motivo aparente. Adentro a escola e passo pelos inúmeros corredores até avistar Nika.

-Ah...Olá!- Ela sorriu.- Como vai?- Seus cabelos balançavam de um lado para o outro enquanto ela andava.

-Eaí senhorita Dominica Donovan.- Brinquei, atingindo o ponto fraco dela: O nome histórico.

-Já disse que é Nika!- Ela falou, apressando o passo, apesar de não dar muito certo, já que suas pernas eram super curtinhas.- Você não pode me zoar, mês do meu aniversário.

Pois é, agora ela me pegou no meu ponto fraco, que, por coincidência também era o nome. O problema é que me chamo April, e Dominica faz aniversário em abril, então ela tem suas piadinhas bobas.

Mas não para por aí...Como se já não bastasse o meu nome de mês, minha família inteira têm nomes de meses!

Meu irmão se chama August, minha mãe se chama May...Eu não queria mencionar, mas tenho que falar sobre o tio Oct.

Sim, o nome dele é October.

-Como quiser, rainha da França medieval.- Ri um pouco e nós paramos em nossos armários, que ficavam lado a lado.

-Está ansiosa para o baile de formatura? Pode acreditar que já temos 17? Nós estamos indo para a faculdade daqui a dois meses!- Ela deu pulinhos de alegria enquanto pegava seu livro de ciências. Seu otimismo era típico, e muitas vezes até estressante, mas eu não ligava muito. Gostava de sua companhia e de nosso contraste.

-Ah...Não sei se vou no baile.- Eu disse, sem demonstrar pra ela sobre os meus planos.

-April Denver Wrink! Não ouse! Você só vai ter essa oportunidade uma vez na vida! Como pode deixar sua amiga sozinha lá plantada na pista de dança!?- Ela me deu um tapa no braço de brincadeira.- Pare de palhaçada!

O sinal tocou e ele foi a minha deixa para escapar do assunto. Murmurei um "tchau" para Nika e fui para a minha sala de aula.

[...]

Se passaram, quatro aulas e eu não conseguia pensar sobre outra coisa sem ser o mês que vinha por aí.

No final desse mês nossas aulas acabarão, então vamos ter um mês de "férias" e depois nossa formatura. A única coisa que desejo é que isso acabe logo para que eu possa viver!

Que sentido a vida tem se você não sente o mundo, não se comunica com ele, não tem o prazer de fazer tudo sem pensar uma vez sequer!?

Fui exemplar a minha vida inteira, tudo para mim é ótimo, minha família devia ganhar o nobel da felicidade- se existisse- e eu tenho tudo o que que preciso. Mas o que a vida é além de estudar, se formar, ter um emprego, casar, ter filhos e se aposentar?

Quando a pessoa ter tudo o que deseja ela vai viver? Quando ela for velha ela vai viver? Não posso deixar isso acontecer! É instigante pensar em como seria deprimente me ver daqui á uns 60 anos numa cadeira de balanço pensando em como eu deveria ter aproveitado...Não posso deixar isso acontecer...Não posso!

Meu pai viveu. Ele me contou que, quando ele completou 18 anos ele saiu em uma viagem com seus amigos e passeou por diversos lugares, fez milhares de loucuras...Era incrível ouvir esse tipo de história.

Desde quando a ouvi pela primeira vez, comecei a guardar dinheiro desesperadamente. Tia July sempre me dava uns 80,00 doláres nas datas comemorativas, então foi fácil juntar.
Hoje eu não sei mais quanto tenho, apenas sei que dá para três potes de vidro cheios até a boca com notas.

É por isso tudo que, mês que vem, quando eu entrar de férias vou deixar um bilhete que escrevi há alguns anos para a minha família em cima do balcão da cozinha e vou partir, sem rumo, pelos Estados Unidos. Vou usar esse dinheiro e uma câmera que eu tenho com exatamente 15 fotos no filme, por isso, vou ter que registrar só os momentos mais importantes.

Vou sair daqui de ônibus e deixar a vida escolher meu caminho.

Pode até parecer perigoso, mas a vida não é imune aos perigos. Viver sem correr riscos é não errar, e consequentemente não aprender.

Ou seja, posso ser louca sim, isso pode ser tudo uma loucura. Eu posso ser uma pessoa que vai ter que parar no hospício depois de tudo, mas tenho certeza que eu ficaria mais arrependida de não ter feito isso, do que do contrário.

The World Is Ours || Cam. BoyceOnde histórias criam vida. Descubra agora