A Praia, Mais Mistérios.

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DAN SMITH - JANEIRO DE 2002.

O dia seguinte passou rápido (ou eu estava ansioso demais e não o vi passar). Saí da escola e fui direto para o parque, eu havia pedido a Dicky o dia de folga ele olhou pra mim de uma forma engraçada e me deu 50 libras "Leve-a a um lugar legal" ele disse. Tecnicamente era ela é que ia me levar, mas eu não quis corrigir, afinal de contas eu não tinha dito aos meus pais sobre o "encontro" e ele ia me dar cobertura. Às vezes eu gostaria que ele tivesse sido meu pai.

Eu esperei cerca de 30 minutos e já estava começando a achar que tinha levado um bolo quando ela apareceu toda sorridente, o dia estava quente para Londres e ela estava com roupas leves, nada do famoso casaco vermelho, eu estava pegando fogo debaixo daquele uniforme ridículo.

Ela não disse muita coisa, apenas um "vamos" enquanto me arrastava saltitante para fora do parque em direção a um carro vermelho. A viagem seguiu silenciosa, eu não sabia para onde estávamos indo mas percebi que era para fora da cidade quando entramos na rodovia principal. Eu queria perguntar muitas coisas além de onde estávamos indo, como qual era a idade dela e se ela tinha carteira de motorista, queria dizer que a vi na escola mas não consegui, eu apenas olhei para a estrada a frente e às vezes de relance para ela, ela dirigia bem.

Quando chegamos a uma pequena praia ela sorriu pra mim e me perguntou "você gosta de caçar tesouros?" Minha cabeça deu um nó, mas ela não esperou responder e me arrastou para a praia. Dirigimo-nos para debaixo de um cais antigo e ela começou a explicar que as crianças costumam enterrar seus brinquedos ali em baixo, normalmente os seus favoritos, mas elas esquecem e eles ficam por lá. O que nós íamos fazer era isso, caçar esses brinquedos que ela chamava de "pequenos tesouros".

Duas horas depois eu estava exausto, aparentemente eu não era bom nisso, tudo que eu havia conseguido era: um pneu de carrinho (só o pneu), um funil rosa mordido e um mamute alaranjado com um chifre só.

Ela tinha um giz de cera azul, uma estrela verde e um desenho todo úmido. Nós sentamos a beira da praia e lavamos os brinquedos nas pequenas ondas de maré que atingiam nossos pés. Eu percebi que aquela era a hora de fazer perguntas.

- Então como é mesmo o seu nome? - Ela sorriu com a minha insistência.

- Minha vó me chama de Molly, às vezes Moll ou Hannah. Era o nome do bebê que ela perdeu quando era mais jovem.

- Moll - eu digo num suspiro quase decepcionado - Molly é bonito.

O silêncio toma conta e eu não sei como prosseguir. Eu gostaria de saber tantas coisas dela.

- Então, eu vi você no Saint Benedict no último dia de aula antes do feriado, eu estudo lá, você também?

- Às vezes. - ela diz dando de ombros.

Fiquei me perguntando como ela poderia estudar só "às vezes" e se ela era algum tipo de criança problemática e por isso tinha essas regalias.

- Então, de quem você roubou esse carro? - Eu disse tentando ser divertido. Ela sorriu, funcionou.

- É da minha mãe, ela me emprestou, acabei de tirar a carteira temporária por isso me atrasei, você teve a honra de dar o primeiro passeio de carro comigo monseiur LeBlanc. - Ela levantou e fez uma reverência divertida.

Eu levantei e fiz os mesmo, nós estávamos sorrindo até que ela notou o pequeno mamute em minha mão.

- O que você tem aí. - Ela disse curiosa. Já se aproximando de mim para pegar o brinquedo.

Eu o ergui ainda em clima de diversão e disse:

- Venha pegar, se conseguir. - E saí correndo pela praia com ela em meu encalço. A areia úmida da maré e o meu óbvio condicionamento físico precário a deixaram em vantagem e ela me alcançou, depois de várias tentativas em pegar o brinquedo que eu ergui o mais alto que pude, ela me jogou na areia e saltou em cima de mim tentando pegá-lo a todo custo. Nós riamos como loucos até que ela pos as mãos no seu tão cobiçado tesouro. Ela deitou ao meu lado na areia e começou a observá-lo com brilho nos olhos. Eu fiquei ali, olhando, totalmente hipnotizado. Depois do que pareceu uma eternidade ela me devolveu ainda deitada com um sorriso no rosto. Eu disse que ela podia ficar com ele e ela se levantou e me deu um beijo na bochecha. Ficou em pé e me ofereceu uma mão para levantar, nos começamos a abanar a areia das nossas roupas. Já estava escurecendo e eu tinha suspeita de que ela estava seriamente encrencada com o horário, assim como eu com toda aquela areia no meu paletó.

A viajem de volta foi tão silenciosa quando a de ida, eu a convidei pra comer alguma coisa, mas ela confirmou minhas suspeitas.

DAN SMITH - ATUALMENTE.

A praia estava deserta, a essa hora e em pleno dia de semana era normal. Os últimos lampejos de Sol se escondiam no horizonte, eu caminhei e sentei ao alcance da maré assim como fizemos aquele dia.

Não é como se eu fizesse isso todos esses anos, sabe? Visitar os lugares e ficar remoendo o passado. Mas é que agora eu tenho quase trinta anos, e eu vejo todos os meus amigos casando ou namorando alguém, formando uma família, enquanto eu estou como o coração congelado no tempo.

Não, eu não passei todos esses anos congelados no tempo esperando alguém que eu se quer sei se lembra de mim. Eu já estive com outras pessoas, namorei uma garota na faculdade, mas é que o fantasma dela sempre me assombra, sinto como se fosse um assunto inacabado, o qual eu tenho que resolver para seguir em frente.

Havia sempre um elemento de mistério por trás dessa garota, e algo de errado. A última vez que nos vimos eu tive certeza, acho que é por isso que eu nunca consegui tira-la da cabeça. É que eu preciso saber o que havia de errado e principalmente, se eu poderia a ter ajudado, da mesma maneira que ela me ajudou.

A Garota Do Casaco VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora