Mentira é a origem de todo mal do mundo. Porra, como a minha mãe estava certa!
"Vou retornar depois. Obrigado por atender." - Respondi, tentando desconversar
Você parou de tocar e me olhou novamente.
"O que a gente tem?" - Perguntou, sério.
"O quê?"
"Você disse que decidiu voltar para o que a gente tem... O que diabos a gente tem?"
"Eu... A gente..."
"Victor, a pergunta é muito simples."
"A gente tá junto... não está?"
"Eu não sei, me diz você"
"Estamos."
Você abriu um sorriso e caramba Enzo, eu poderia viver nele. Me levantei da mesa e fui em tua direção. Fiquei de pé na tua frente e te estendi a mão. Eu juro que poderia viver mil vidas e as mil seriam vividas pra ver teu sorriso, menino. Você apertou minha mão e me olhou com aqueles olhinhos arregalados.
"Vamos, dança comigo!" - Pedi
"Eu não sei dançar, para de palhaçada." - Você disse rindo, como se eu fosse teu presente no natal e você uma criança sedenta de amor.
Me sentei no sofá do teu lado, te abracei enquanto você segurava o violão e beijei tua orelha. Senti cada pelo da tua nuca eriçar e você gargalhou e se encolheu. Daça comigo, eu dizia. E você nem conseguia responder direito entre tantas gargalhadas.
Foi quando te soltei e você me entregou o violão.
"Vamos, eu deixo você me ensinar a dançar se você tocar uma música inteira..." - Você disse, animado.
Naquele momento eu consegui esquecer o caos que eu havia me metido. Eu consegui esquecer o caos que eu iria te envolver. Assenti com a cabeça e peguei o violão. Tentei dedilhar algumas notas e foi um desastre. Você pacientemente, me colocou mais para a beirada do sofá e sentou atrás de mim, passando as pernas envolta da minha cintura. Então, com o queixo no meu ombro, você segurou minhas mãos e as colocou na corda e na casa certa. Foi quando eu fiz a minha primeira nota.
À medida que você sussurrava as notas no meu ouvido e segurava devagar as minhas mãos, eu sentia meu coração pulsar na garganta. Minha boca tava seca. Eu posso afirmar com toda certeza que a palavra certa pra descrever o que eu sentia por você, Enzo, não era tesão. Era fome. Eu precisava de você. Precisava sentir seu cheiro, seu gosto, tua pele. Meus lábios se comprimiram como os de um predador prestes a atacar sua presa. Coloquei o violão no chão e me virei pra você, já te colocando deitado no sofá. Eu não conseguia me conter. Eu não queria te fazer carinho, não queria ficar abraçadinho. Eu sentia vontade de te sufocar em mim. É como se a raiva que eu sentia de mim mesmo por fazer tudo que eu estava fazendo se canalizasse pela pele e saísse por todos os poros. Ali mesmo, na manhã seguinte, no sofá, tivemos nossa segunda vez.
Quando finalmente nos levantamos, você disse que iria tomar banho, pois ainda iria para aula. Eu lhe acompanhei e depois que nos vestimos você me deu um beijo, desses que a gente sabe que terá muitos pela frente. Mal sabia você que não seriam tantos assim.
Voltando para casa, foi como se eu tivesse tomado um soco no estômago. Eu tinha que voltar para realidade. A realidade onde eu era um monstro e você, uma vítima. Peguei meu telefone e disquei um número.
"Alô?" - Douglas atendeu a ligação
"Você quer botar tudo a perder? Não me liga mais, quando eu quiser falar contigo, eu ligo pra você!" - Disse irritado
Douglas, sarcástico como sempre, riu do outro lado.
"O príncipe encantado parece ter esquecido o que acontece com quem atravessa o caminho do lobo mal..."
"Deixa de ser imbecil Dou..."
"Escuta aqui filho da puta, a situação está muito bem explicada pra você. Acredito que estamos muito bem conversados. Eu ligo na porra da hora que eu quiser e você que se vire pra controlar sua mulherzinha. E não vai achando que vai escapar dessa não. Daqui a três meses nós precisaremos dele,e você sabe muito bem o que vai acontecer com ele caso você resolva foder com tudo. Fui claro?"
"Foi..." - Respondi com um nó na garganta.
"Lico mandou lembranças" - Disse ele entre gargalhadas antes de desligar o telefone.
Não consegui conter as lágrimas , montei na moto e voltei pra casa. Quando abri a porta, vi Ana ajoelhada diante da mesinha de centro com uma vela acesa.
"Meu filho, oh, Victor!" - Ela chorava como se eu estivesse morto
Eu abracei-a bem forte e chorei também. Ela era tudo o que me restara. Deslizou suas mãos pelo meu rosto, enxugou minhas lágrimas e apertou minhas bochechas.
"O que fizeram com você, meu filho?"
"Eu estou bem Ana, eu fui o culpado."
"Você está vivo, meu Deus! Preciso ligar pro seu tio e avisá-lo!" - Me abraçou novamente - "Me conte o que houve, tenho certeza que podemos resolver juntos!"
Eu a afastei e disse que precisava de um banho. Ela ficou parada me olhando enquanto eu subia as escadas. Mesmo sabendo que algo estava errado, ela decidiu respeitar meus espaço. E talvez esse seja outro erro nessa história toda, Enzo. Eu não precisava de espaço. Eu precisava de socorro. E eu só tinha três meses para encontrar uma saída. Por te envolver nisso, me perdoe.
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Era Pra Ser
RomanceLorenzo é um jovem de 19 anos que acaba de passar no vestibular pra jornalismo. Ao ver-se obrigado a mudar de cidade, ele finalmente encontra a possibilidade de recomeçar sua história longe de todas as confusões e dores do passado. Tudo estava saind...