Você sempre disse que eu nunca me importei com nada e com ninguém além de mim. Mas você está errado, Lorenzo. Você sempre achou que me conhecia e que sabia cada parte de mim, mas a verdade é que não tivemos tempo pra isso. Lhe escrevo essas cartas, cada uma delas com as datas que você tem certeza que eu não faço ideia do que significam pra te mostrar que você foi o grande amor da minha vida, e o quanto isso me assustou e me fez agir como um imbecil o tempo todo. E toda minha imbecilidade deu início na manhã desta data aí, 23 de Janeiro. Foi quando eu vi o magrelo de óculos caindo na minha frente e foi quando eu cometi meu primeiro erro. O erro que seria o pontapé de tudo o que vivemos.
Não era um dia fácil pra mim, e sei que hoje você sabe disso. Havia passado a noite em claro, saí bem cedo, me despedi da Ana e fui pra faculdade. Me sentei junto com os caras da minha sala lá no pátio porque não tínhamos a primeira aula. Foi quando eu te vi correndo, todo magrelo e desajeitado, com um óculos maior que seu rosto. Não sei porquê merda de motivo fiquei te encarando desde que você apareceu. O Douglas, o imbecil que você conhece muito bem, disse algo sobre eu estar te encarando, foi então que você caiu.
Eu queria correr e te ajudar a levantar, mas isso exigiria mexer com uma parte de mim que estava enterrada a 25 anos. Uma parte a qual vinha me assombrando nos últimos tempos e o motivo da maior dor causada na minha vida. Se você entendesse, Enzo... É mais fácil ser o idiota. É mais fácil sentar em uma roda de falsos amigos, dar um tapa ou dois em um cigarro de maconha e beber a noite toda como se não existisse a mínima esperaça de um futuro. Talvez seja isso que me fez olhar pra você naquela manhã. Você não pegou o caminho mais fácil. Você assumiu quem é e estava lá, todo atrapalhado e expondo toda sua falta de coordenação na frente de todos. Quanta coragem!
Espero que você entenda que você é diferente! E é exatamente isso que me fez tomar todas as atitudes canalhas e covardes diante do que estava sentindo. Eu devia ter te ajudado a levantar, ter te dado a mão e dito meu nome, eu devia ter sido gentil, como você sempre foi. Mas é mais fácil viver num mundo de mentiras acolhedoras que enfrentar as consequências de qualquer tipo de verdade. Então eu tirei a foto, voltei pro meu círculo de amigos e te vi levantar cabisbaixo e seguir em direção ao primeiro período de Jornalismo! Porra, o mesmo curso que o meu.
Antes mesmo de saber teu nome, tu já estava escrevendo tua hisória dentro de mim.
Aquela deve ter sido uma semana difícil pra você. Lembro de você passar todos os dias e ter que lidar com os risinhos e todos te chamando de Cinderela, graças a mim. Eu sempre me escondia atrás daqueles filhos da puta para que você não me visse no meio deles. Eu tinha vergonha de você. Na verdade eu tinha raiva também. Como um cara tão novo e estranho podia ser tão bem resolvido? Quando te xingavam, você acenava e cumprimentava todos sorrindo, como se aquilo nem te afetasse. E eu ali, um merda tentando disfarçar o que pra mim, já era quase inevitável.
Existem pessoas que atravessam a nossa vida pra deixar uma marca. Marca essa que carregaremos conosco até o fim dos tempos. Na minha vida, você foi uma dessas pessoas, e a marca que você deixou em mim, Enzo, nem nossos erros, nem nossas tragédias, nem nossas bebedeiras irão apagar. Hoje eu sei que é uma marca de amor. E foi naquela noite, uma semana depois de te ver pela primeira vez, que eu percebi que você tinha vindo pra ficar.
Era pra ter sido só uma noite de doses e tragos, como todas as outras. mas não foi. Naquele momento eu arrumei a minha primeira ferida de toda essa história e foi você quem curou.
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Era Pra Ser
RomanceLorenzo é um jovem de 19 anos que acaba de passar no vestibular pra jornalismo. Ao ver-se obrigado a mudar de cidade, ele finalmente encontra a possibilidade de recomeçar sua história longe de todas as confusões e dores do passado. Tudo estava saind...