A Noite do Primeiro Beijo

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Você sempre foi o cara mais complicado do mundo. E eu sempre tive problemas com coisas complicadas. Mas você Victor, você fazia questão. Meu amor por você foi construído em cima de dúvidas, mágoas e mentiras. Tanto que chegamos aqui, nesse ponto. Você aí e eu aqui. Agora que parei pra pensar, nunca houve um nós. Até quando achei que havia, não houve. Sempre houve eu e você. Mais você do que eu. Era pra ser compartilhado, mas você insitiu em fazer do nosso relacionamento um monólogo sobre suas inconstâncias, bebedeiras e ressacas. E eu sempre me deixei levar. Parte da culpa vem do seu sorriso. Ele sempre fez o estilo despreocupado, e quando você sorria, eu tinha a sensação de que todos os meus problemas estavam resolvidos. Você sorria e eu sorria também. Era inevitável. Mesmo sabendo que grande parte dos motivos que lhe causavam gargalhadas, eram os mesmos que me causavam dor. E isso ficou claro naquela primeira semana.

Eu sempre tive problemas em me relacionar com qualquer que fosse o ser humano. Sempre pareci um animal encurralado, assustado, com vontade de sumir. Mas decidi que era hora de mudar isso. Depois do episódio das fotografias, logo fiquei conhecido. Eu era a Cinderela do jornalismo, graças a você. E diante disso eu tinha duas opções. Ser eu mesmo e me esconder durante o resto do semestre, até você e sua turma se formarem, ou me impor e mostrar o quão merda vocês todos eram pra mim. Escolher a segunda opção era torturante pra mim. Durante toda a semana eu passava pelos corredores e toda vez que ouvia um assovio ou alguém me chamando de Cinderela, eu acenava sorrindo e cumprimentava normalmente. Difícil era chegar em casa. A vergonha, a raiva, o nojo. Eu queria matar você. E o que mais me intrigava nisso tudo é que toda vez que eu olhava pra vocês, você se escondia. Além de idiota é covarde, pensei.

Mas ignorar vocês fez com que eu também arrumasse alguns amigos. Daiana, sua colega de sala e Júlio, outro calouro. Eles me econtraram uma vez, atrás do prédio, sozinho, escrevendo e chorando, como a porcaria de uma criança que sofreu bullying no ensino fundamental. Eles me ajudaram e passaram a me fazer companhia durante as aulas e até fora da faculdade. Foi por conta deles que eu fui convidado para a festa dos calouros. Foi por conta daquele convite que me aproximei de você. Foi por conta dessa proximidade que hoje eu vejo que minha vida é um amontoado de memórias amargas.

Era a minha primeira festa na faculdade. Eu não sou uma pessoa que curte esse tipo de coisa, você sabe. Sempre achei que esses lugares eram frequentados por pessoas vazias e quase nunca estava errado. Mas eu não estava em posição de recusar um convite feito pelos meus amigos, então eu fui. E para meu maior arrependimento, quando cheguei perto do bar pra pegar a minha primeira cerveja, sinto um esbarrão e logo depois sinto minhas costas toda ensopada de bebida. Olho pra trás e vejo você.

"Me desculpe, cara!" - Você disse, calmo, como se fôssemos desconhecidos. Teu hálito fedia a cigarro, o que fez meu estômago embrulhar. Olhei bem no fundo dos seus olhos e percebi que você estava constrangido, o que me deixou confuso.

"Merda!" - Falei. " Tudo bem, eu me limpo, não tem problema"

"Realmente não foi minha intenção" - Você respondeu. E então você estendeu a mão. "Victor Olivieri, último período de Jornalismo."

Eu fiquei paralisado. Sério. Foi ali que percebi que você era maluco. Arregalei os olhos e abri a boca, embasbacado. Estendi a mão, tremendo, e apertei a tua.

"Lorenzo Ribeiro, calouro de Jornalismo." - Respondi, quase gaguejando. Eu te odiava, tinha nojo e queria distância de você, mas não naquele momento. Quando enconstei na tua mão que, apesar de estar segurando uma bebida gelada que então estava escorrendo pelas minhas costas, estava quente, eu senti como se pudesse perceber o sangue correndo pelas tuas veias. Ali, no aperto de mão, no meio daquela gentileza repentina, eu notei que a gente não fazia sentido.

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