Tia Laureen

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Callum acordou tarde na manhã seguinte, tinha bebido muito rum e sentia-se exausto. Os seus lábios traíram-no ao moverem-se num sorriso curto e lateral quando se lembrou da noite anterior. Afinal o que tinha acontecido? Não saberia dizer.

Levantou-se da cama, sempre dormia nu e andou até as janelas médias para as abrir. O ar frio entrou pelo quarto e arrepiou a sua pele branca e alva, arejando também o quarto abafado pelo cheiro de rum. Ele andou até a pequena mesa onde estava a bacia e com ajuda da jarra de metal, lavou a sua face. Olhou para o seu reflexo na água trémula e pela primeira vez percebeu que nem tudo o que parece é. Respirou fundo e passou os dedos húmidos pelos fios loiros. Caminhou até ao armário e tirou um robe para cobrir o seu corpo distribuído por um metro e noventa de altura e noventa quilos de massa muscular. Sempre se fazia notar por onde passava e lembrava-se que Ian Birmingham sempre insistira para ele trabalhar na polícia, mas Callum nunca quisera trabalhar. Vivia para a corte e a boémia.

Foi para o quarto de banho tomar um banho quente, mas não deixava de pensar que no fundo ele não passava de ninguém, não sabia fazer nada com o qual pudesse se orgulhar. Seu irmão Dante era o melhor jornalista, reconhecido e respeitado por todos, e ele apenas se faria notar porque ia casar com uma mulher rica. Nunca tal facto o incomodara tanto como naquele instante e esfregou-se com força como se pudesse tirar tudo aquilo de si. Terminou, se vestiu com calma e em seguida desceu as escadas devagar, algo raro vindo de si. Olhou para o relógio e marcavam quase dez horas da manhã, já era tarde para quem tinha sido obrigado a levantar-se cedo nas últimas semanas. Ao chegar a sala, escutou vozes e risos que vinham da copa, franziu e apressou-se até lá. Abriu a boca com a cena a sua frente.

Toda mesa da cozinha e alguma parte do chão estava coberta por farinha, os gémeos riam sem parar enquanto Dante e Miriam estavam numa luta de farinha pelo ar, a rir às gargalhadas empolgadas que nem sequer notaram a sua presença. Callum colocou as mãos nos bolsos e tossicou alto para chamar atenção. Seus olhos estavam semicerrados.

― O que vem a ser isto? ― Perguntou com a voz baixa e arrastada. O riso de todos morreu devagar e viraram-se para o ver parado na porta.

― Bons dias. ― Cumprimentou Dante a sacudir a farinha do cabelo cor de cobre e do terno cinzento. Miriam fazia o mesmo no seu vestido e no avental. ― Estava aqui a divertir-me um pouco ― respondeu com a mesma calma de sempre e esboçou um sorriso para o irmão.

― Não sei em que época sujar a cozinha virou uma brincadeira para duas pessoas adultas. Parece que certos conceitos precisam de ser revistos ― retorquiu Callum sem soltar o sobrolho unido e seus olhos tinham escurecido ligeiramente. Olhava apenas para Dante como se fosse proibido encarar olhos escuros da babá. ― Sinceramente...

― Poupa o vocabulário, meu caro irmão. Terás muito tempo para fazer o uso dele ― cortou-lhe Dante friamente. Parecia mais vivo, e Callum sabia que o mais velho passara a noite em casa de Lady Straton, mas mesmo assim perguntava-se se tal alegria devia-se a tal facto.

― Gostava de saber se devo fazer o desjejum sob a festa de farinha ― rosnou quase sem abrir a boca, falava como se de um ventríloquo se tratasse. Ele tirou as mãos dos bolsos e as cruzou no peito, indignado.

― Poderá sentar-se na sala, eu trago-lhe o...

― A hora do café da manhã já se foi! Portanto de nada adianta resmungar ― anuiu Dante cortando Miriam e aproximando-se do irmão mal-humorado, para em seguida soprar uma nuvem de farinha para a sua face. Miriam e as crianças riram sem parar e divertidas, diferente de Callum ainda sério. Deu meia-volta e saiu a andar pelo corredor, irritado. Sentiu que Dante o seguia em passos silenciosos.

― Poderei saber para onde te diriges? ― Perguntou-lhe segurando-o pelo ombro.

― Comer alguma coisa por aí ― respondeu sem lhe encarar o olhar e suspirou.

Xadrez, à Preto e BrancoOnde histórias criam vida. Descubra agora