Novela mexicana

13 0 1
                                    

Camilanão queria ir há sua festa de quinze anos. Para os pais que tinhaminvestido em buffet, conviteescrito a mão, colunas sociais e pingentes de ouro de lembrancinhaera um verdadeiro desastre. "Como assim ela não quer ir?",questionava a vó. "Não sei. Ela simplesmente disse que não querir. Esta com uma cara horrível. Nem quer se vestir. Já falei dabanda que ela gosta que vai tocar, dos presentes que ela vai ganhar,que o filho dos Quinilhas vai estar lá. Ela só diz que não vai.Não sei mais o que fazer.", respondeu a mãe aflita. "Isso ésua culpa. Ela faz tudo que quer, fala tudo que quer, vê tudo quequer, a vida não é assim. Ela tem que entender que ela não tem quequerer nada, tem que fazer o que você falar e pronto." Foi assimque a vó criou três filhas que casaram com três milionários. Seisso não era uma criação certa de família, o que era? "Tá bom,mas o que eu vou fazer?" A mãe, acostumada a obedecer, precisavade uma ordem. "Cadê o pai dela?" "Vai chegar da Coréia diretopara festa. Esta no avião, não consigo falar com ele." "Éoutro molenga."

No quarto Camila espalhava a notícia. Contava para as amigas noFacebook e WhatsAPP que não ia para a própria festa porque nãoestava com vontade. Todas se mostravam chocadas e incrédulas.Qualquer uma delas ia ficar em êxtase com uma festa no salão nobredo Clube A++. Algumas amigas ainda queriam ir do mesmo jeito, afinal,era uma mega festa, o filho dos Quinilhas ia com certeza, a superbanda ia tocar e a lembrancinhas iam ser pingentes de ouro! Camilanão queria saber se o evento ia ser cancelado ou não, se não, quefosse quem quisesse. Ela não ia. "Como você é boba. Queria euter uma festa dessas. Meus pais são naturebas. Não tenho nemcoragem de falar sobre isso com eles." Reclamava uma. "Quandovocê ver as fotos na Internet vai se arrepender." Advertia aoutra. Em uma conversa mais privada ela tentava convencer Pedro, umamigo da escola que não sabia que era seu aniversário, a matar umdia de aula e ir no cinema do shopping. "O filme é muitoengraçado. Tem um cachorro que fala de verdade."

Com o tempo passando e a hora da festa se aproximando vó e mãecomeçaram a se desesperar. Aquela hora já não daria mais tempo deela se aprontar como deveria. A manicure, inclusive, tinha outrocompromisso e queria ir embora. Impulsionadas por essa grande pressãoque o motorista da família arrombasse a porta do quarto. Camilatomou um susto e gritou quando escutou o estrondo e viu um machadoatravessar a madeira. Sua mãe não estava preparada para o barulho etambém gritou ordenando que o arrombador parasse com aquilo. EntãoCamila abriu a porta. Sua vó fuzilava ela com os olhos, osempregados se mostravam chocados com a situação, sua mãe estavacom o rosto vermelho e os olhos lacrimejando. "O que estaacontecendo minha filha? Por quê você esta fazendo isso comigo?""Eu não estou fazendo nada. Só não estou bem. Não quero ir.""Você não tem que querer menina insolente. Comece a se arrumaragora que você já esta atrasada." Para a vó o importante erademonstrar comando a qualquer custo. Camila só fez cara de poucocaso e olhou para faxineira, que fingiu que não era com ela com medoda culpa e do desemprego. Sua mãe não segurou mais o choro. "Olhasó tudo que você tem. Olha o que sua mãe faz por você. É assimque você retribui? Por quê você não quer ir nessa festa? É afesta dos sonhos de todas a meninas da sua idade. Por quê você nãoquer ir?" Camila olhava para cima como quem contempla a auroraboreal. "Fala?!"

A cena não se desmontava, mas ia se acalmando. Camila continuavaparada com desdém encostada na porta, a mão tinha sentado numacadeira no corredor e chorava de soluçar e a vó andava de uma ladopara o outro culpando a internet pela forma como os jovens secomportam hoje em dia. "Eu acho que eu sei o que esta acontecendoaqui...", começou a mãe, "...ela não quer ir porque eu disseque ela não ia pendurar na parede um poster horrível que ela queriana parede, não é Camila?" Ela deu de ombros com um sorriso de'que absurdo'. A vó parou e olhou com desconfiança. "Pode colar oposter. O que mais você quer? Dinheiro para comprar uma mochilanova? Amanhã nós vamos comprar um mochila nova do jeito que vocêquiser." Camila só balançava a cabeça e ria. "Não é issonão...", a vô dava o tom de quem estava desvendado a charada,"tem alguém fazendo a cabeça dela com essa ideia. É máinfluência. É um menino, não é?" Camila fechou a cara, o quesobrou da porta do quarto e se jogou na cama. A mãe entrou no quartose descabelando e gritando: "Quem é ele? Quem é ele?" Camilacorreu e se trancou no banheiro, que ainda tinha uma fechadura quefuncionava. Depois de um tempo de silêncio sua mãe falou: "Tudobem. Vou falar para todos que você esta doente e não vai poder ir.Quando seu pai chegar conversaremos sobre isso."

Já perto da hora da festa duas batidas na porta anunciavam a chegadado pagador das contas. "Abra a porta Camila, por favor, sou eu."O pai tinha um tom calmo e sereno. "Sua mãe disse que você nãovai há festa porque um menino esta te influenciando. É verdade?"Ela não respondeu e olhou para o lado. "Essa festa não éimportante só para você, é para gente também. Um amigo meu estavindo do Japão só para ir. A televisão, os jornalistas, as amigasda sua mãe, até suas amigas, todo mundo vai estar lá. O que agente vai falar? Que tem um menino influenciando você a ficar contraa gente?" Camila mexia a cabeça olhando para o lado, para cima,para baixo, mas não abria a boca. "Você não esta me deixandooutra opção além de uma atitude drástica." Camila parou demexer a cabeça e olhou fixo nos olhos do pai. "Tudo bem, nósvamos dizer que você esta doente e não pode sair de casa, masarrume suas coisas que na próxima semana você vai estudar numcolégio interno para meninas na Suíça." Camila começou achorar, o pai levantou e saiu para a festa.

A vida é uma puta barata!Onde histórias criam vida. Descubra agora