Capítulo 4

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— Mike, esses juros são absurdos, olha só pra isso — joguei os papéis em sua mesa, irritado. Como ele podia ter deixado a situação chegar àquele ponto?
Que ele havia sido roubado eu sabia, o que eu não sabia era que o filho da puta do ex-administrador havia afundado a empresa em dívidas e pegado empréstimos com todos os bancos da cidade para tentar tapar a merda que havia feito, enchendo um buraco enorme de cobranças e contas para pagar.
Meus pés praticamente não obedeciam aos meus comandos, me levando de um lado para outro do escritório do Mike em passos furiosos enquanto minha cabeça tentava achar um jeito de nos tirar do que o infeliz do administrador havia nos metido. Meu irmão inspirava e expirava fortemente enquanto lia o dossiê que eu havia feito, seu rosto transmitia o quão doído àquela leitura estava sendo para ele; o quanto era ruim finalmente perceber que tudo que ele havia construído e batalhado havia virado, apenas por ele ter confiado na pessoa errada.
Naquela manhã de segunda, eu havia acordado extremamente puto ao saber que meu sonho não tinha sido real. Quero dizer, a festa aconteceu e eu esbarrei com ela no corredor, mas ao contrário do meu sonho, ela não chorava nem muito menos parava para ficar conversando comigo e correspondia ao meu beijo. No dia da festa, a casa estava cheia com os amiguinhos do Arch e a Eva ficou encarregada de cuidar deles e não deixar que aqueles papa-léguas vestidos de crianças quebrassem tudo e fizessem o lugar virar um pandemônio, fazendo com que eu quase não tivesse contato com ela. E ao chegar ao escritório e me deparar com tudo aquilo novamente, não ajudava em meu estado de espírito.
Desde então, eu estava com um mau-humor insuportável. E não tê-la visto no café da manhã me deixou um pouco menos suportável. Nossas conversas eram rápidas, mas de extrema importância. Normalmente, era por ali que eu sabia seus horários e quando eu deveria ou não estar em casa.
— Matt, você precisa entender que eu confiava nele. Eu assinava contratos sem ler, porque confiava nele — Mike tentou se explicar também, se levantando da cadeira em que estava e se livrando de seu paletó.
Inspirei profundamente, afrouxando a gravata ao sair de meu devaneio, e passei uma mão pelos cabelos, a fim de aliviar a tensão que já se acumulava em mim.
— Você não pode assinar contratos sem ler, nem mesmo que a Jessy peça pra você fazer isso, Mike. É uma questão de precaução — exemplifiquei enquanto o olhava. — Você confia nela e tem a absoluta certeza de que se amam e que nunca fariam algo desonesto um com o outro, mas e se ela, por algum descuido, deixasse um tópico importante passar despercebido? Tal importância que faria total diferença no contrato inteiro ao ser notada. E se você percebesse esse descuido? Seria uma prevenção. Entende o que eu digo? — fui respondido com um aceno de cabeça vindo dele junto com um olhar dolorido. Eu odiava vê-lo assim, mas no momento eu precisava que ele entendesse o que estava acontecendo.
— Tudo bem. Eu sei que também sou culpado nessa história, nunca neguei isso — respondeu, voltando seu olhar novamente para os papéis em cima da sua mesa. O olhei como se aquele fato fosse, no mínimo, óbvio. — Olha, vamos pra casa, você vive nessa empresa desde que chegou e já fez horas extras o suficiente para eu permitir que faça hoje de novo. Amanhã discutimos sobre isso, tudo bem? Tenho um jantar importante agora para tentar conseguir novos sócios, então também preciso ir para me arrumar, antes que a Jessy ligue reclamando sobre a minha falta de pontualidade não britânica.
Assenti rindo ao compreendê-lo, também nunca fui muito pontual, e fui até minha sala pegar minha pasta, seguindo-o para o estacionamento em seguida. Entramos em seu carro, já que eu havia devolvido o alugado, e ele deu partida pra casa.
Conversamos sobre algumas coisas não envolvidas com a empresa, afim de aliviar o estresse em que éramos submetidos todos os dias, e assim que ele estacionou entramos em casa. Subi para o quarto depois de cumprimentar a Jessy, que estava extremamente elegante e já arrumada, e falar com o Arch, que parecia mais entretido no videogame do que demonstrava perto da mãe.
Aproveitei para tomar um banho demorado e quente. Abri a porta, ainda enrolando a toalha na cintura, e ri ao ver o pequeno na minha cama, pulando e cantando uma música infantil que eu não fazia a menor ideia de qual desenho havia saído.
— Hey, moleque, tá fazendo o que aí? — perguntei enquanto ia até ele e o sentava na cama, fazendo uma cosquinha rápida em sua barriga. Voltei para o armário e coloquei uma roupa quente o suficiente para me aquecer na noite gélida que seria hoje.
— O papai e a mamãe já foram, e a Eva pediu para eu sair do videogame. Ela diz que se eu jogar muito num dia só, meus olhos vão saltar para fora — relatou arregalando os olhos, demonstrando o quanto sentiria medo se aquilo acontecesse, me fazendo rir alto de sua preocupação.
O desci da cama e fomos até o primeiro andar, ele voltou para a sala, mas dessa vez rumando até seus brinquedos espalhados pelo tapete. Continuei meu percurso até a cozinha e logo seu corpo entrou em meu campo de visão. A silhueta delineada por uma roupa simples de dia a dia deixava claro o quanto ela não era perfeita, e sua imperfeição me fazia admirá-la ainda mais. Isso a tornava humana, a tornava real.
— Hey Eva... — comentei como em um aviso na minha entrada pela cozinha, achei que já havíamos tido momentos de susto demais ali para adicionar mais um à coleção. Ela se virou com calma para mim enquanto eu me servia de um copo cheio de água.
— Oi — ela cumprimentou sorrindo e voltou sua atenção para as panelas que estavam no fogão. Respirei fundo, apoiando meus antebraços na bancada, aquele sonho não saía da minha cabeça e algo me dizia que não iria sair nem tão cedo.
Eu estava quase fora de órbita, a fitando de costas enquanto ela dividia sua atenção entre algumas coisas ao mesmo tempo que eu achava incrível as mulheres serem capazes. Decidi começar uma conversa antes que eu ficasse sufocado com meus próprios pensamentos, mas fui impedido disso pelo som da campainha ecoando pela casa.
Andando até a sala em passos calmos, percebi que era uma hora um pouco incomum para se receber visitas. Assim que abri a porta, estranhei ao me deparar com um ser loiro de aproximadamente 1,70 de altura pulando em meus braços e soltando gritos entusiasmados. Ri, quase incrédulo, com a animação do que eu reconheci ser a Angel e envolvi sua cintura com os braços, a tirando do chão para a pôr no mesmo novamente assim que o abraço foi cortado.
— Seu vadio, como pode você ficar cada vez mais gostoso a cada vez que nos vemos? — exclamou em um tom agudo, que fez meu ouvido reclamar. Ela só falava assim quando estava animada demais ou estressada demais. Eu faria uma aposta inteligente se dissesse que ela está um pouco dos dois no momento.
— É a sina dos Crawford, vamos ficando cada vez mais gostosos com a idade. Mas olha só pra você — ri, a fazendo dar uma voltinha. — Quem diria. Angel Stevens loira e com corpo. Isso é realmente uma novidade.
Levei um tapa ardido no ombro, mas também arranquei uma gargalhada dela além da violência. A ajudei com as malas enquanto a mesma me explicava o motivo de estar ali. Angel era uma antiga amiga de Mike, quase irmã, e também meu caso de verão.
Quando éramos jovens, costumávamos pegar o carro do meu avô e dirigir até o litoral para acamparmos e passarmos tardes na praia, e em uma dessas tardes nós acabamos ficando, e mesmo com os protestos do Mike de que não era legal ficar de vela, nós ainda nos divertimos juntos, estávamos bêbados demais para parar. Foram apenas poucas vezes que ficamos, e tudo não passava de uma aventura adolescente. Nós crescemos e seguimos caminhos diferentes pela vida, mas vez ou outra mantínhamos contato por um tempo, apenas para saber que percurso nossos destinos haviam traçado para nós.
Agora Angel nada mais era que uma ótima amiga, que estava ali para passar o fim de ano com a gente. Acomodei suas malas no quarto de hóspedes ao lado do meu e voltamos para o primeiro andar.
— Tia Angel — Arch sorriu, finalmente percebendo a mulher ali, e largou os brinquedos por uns segundos para cumprimentá-la, mas logo voltou sua atenção para seu castelo de carros e o dinossauro verde em suas mãos.
Segui com Angel para cozinha e sorri ao ver o olhar da Eva se virar para nós, provavelmente curiosa com a visita repentina. Assim que Angel saiu de trás de mim, percebi as feições da babá mudarem de um neutro e curioso pra um fechado e sem agrado, olhei para a loira ao meu lado que olhava a mais nova com desdém e constatei o que pra mim parecia ser óbvio. Seja qual for o motivo de elas estarem se olhando de um jeito nada amigável, eu provavelmente descobriria mais cedo do que imaginava. 

Babysitter Of My NephewOnde histórias criam vida. Descubra agora