Eu realmente tive esperanças de que Lauren retornasse dentro de um, dois dias. Mas não, já fazem duas semanas desde que Dinah veio à sua casa.
É a primeira vez que eu tenho o desgosto de viver como os personagens dos livros que leio. Nunca pensei que saudade fosse uma coisa tão séria e deteriorante, ao ponto d'eu descer para a dispensa, duas vezes, todos esses malditos e longos dias.
É certo que nem a medicina que certamente eu não conheço, consegue explicar o que a ausência de Lauren vem causando em mim.
Ah! Quem dera minha coragem fosse maior que o possível medo do arrependimento. Eu teria atravessado aquele lago à sua procura há muito tempo.
Penso comigo que ela pode ter se arrependido da ideia de querer me conhecer pessoalmente, e ora, eu não sou tão feia assim. Será que o medo de Lolo também é maior que sua coragem?
Mas ela me parece tão destemida e cheia de adrenalina correndo em suas veias.
Eu só espero em meu âmago, que ela retorne mais rápido do que quando apareceu para mim, ou eu apareci para ela.Meu relacionamento com Sinu, não está dos melhores. E eu travo uma batalha para que continue assim.
Fazem uns anos que descobri que ela tem um arsenal de bebidas alcoólicas, e em algumas noites de lá para cá, passei a observá-la, quando ela ia para a sala de música e deixava que Billie Holiday repetisse na vitrola, virando copos e mais copos de pura vodca enquanto apreciava tristemente a música.
O que quero dizer com isso é que: (1°) Sinu nunca foi de ferro, ela também sofre, não sei exatamente o porquê. (2°) Eu descobri que álcool pode mascarar suas angústias, ou expô-las. (3°) O absentismo de Lauren em apenas três dias, me fez recorrer à válvula de escape que eu secretamente copiei de mamãe.Hoje é quarta-feira. Mais um dia da rotina chata que retomei após o sumiço de Lauren.
Optei por levantar, fazer minha higiene pessoal, pegar algumas frutas e descer para a dispensa.
Preencho o silêncio que toma conta desse local com minha própria voz, em baixo tom, pois tenho medo que alguém que não seja Lauren, me perceba ali.Uma longa e eterna hora e meia após devorar toda a comida que tinha trago, escuto ruídos do outro lado do duto, ficando cada vez mais próximos.
A abertura da porta e sua batida violenta em seguida, fizeram meu coração disparar, e eu torço para que seja uma Lauren naquele cômodo.
"Lauren, não me ignore! Você fica quase duas semanas longe e não quer que eu me revolte?! Seu pai estava preocupado, eu estava!", reconheço a voz de Clara, com batidas incessantes na porta.
Uma respiração pesada se faz presente depois do silêncio. É a Lauren, é a Lauren.
"Eu espero que você se acalme, tenha civilização e saia para que possamos conversar!", as batidas cessaram e aparantemente Clara havia deixado Lauren em paz.
"Droga, droga, droga, droga...", Lauren repete enquanto seus passos pesados se aproximam. O baque de suas costas na parede fora tão violento quanto a batida da porta, me assustando novamente.
"Droga, eu quero sumir daqui. Devia ter ficado com a Mani, droga, droga...", ela continuava repetindo enquanto sua voz mesclava com um choro baixo e fungadas repetidas.Meu coração está tão apertado que chega a ser sufocante. Não há nada que posso fazer para me deixar mais próxima da garota do outro lado, que não seja o falho conforto de conselhos que não saberei dar; mas vou me arriscar.
"Lauren?", falo num fio de voz.
Ela funga algumas vezes, tentando engolir o choro, "Camz...", ela ri sem humor, "Você sempre está aí?"
"De repente, só quando você vem."
"Mas eu não vim nos últimos dias.", ela funga outra vez.
"E veja, mesmo assim eu vim.", sorrio triste.
Solto um longo suspiro, "Você é como café, Lauren.""Hã, por quê?", pergunta confusa.
"Porque quando se é acostumado a tomá-lo, todos os dias, o indivíduo fica dependente, viciado. E se por algum acaso o café acaba, ou não há como o indivíduo tomar a dose diária, ele fica doente, por assim dizer. Digo, meio que enlouquece, tem dores de cabeça ou até mesmo crises. E a sua breve ausência, me causou sintomas até piores que esses, Lolo.", concluí, surpreendendo à mim mesma.
Ela funga algumas vezes mais, "As suas metáforas sempre irão me fascinar.", posso jurar que ela falou sorrindo.
"Ah sim, você é uma dose de café bem forte.", sorrio.
"Ainda sou?"
"Ora, se eu só não tiver te tomado por não haver possibilidades, é como se eu estivesse aguardando cerca de duas semanas para poder repor. Mas, se o pó de você tiver acabado, então imediatamente terei de comprar mais. Coisa que, para mim, como você bem sabe, não é possível; ou seja, não haveria mais pó."
"Ah.", ela solta baixinho, "Mas, como você toma café?".
"Como assim?", pergunto rindo.
"Você não disse que se o pó acabar, não tem como comprar mais?"
"Lauren, eu quis dizer que não tem como eu comprar ou se quer, cogitar conhecer outro alguém como você."
"Oh!", exclama, "Mas... você toma café, hã?"
Dou uma gargalhada alta, "Sim...", continuo rindo, "Temos uma pequena plantação de café."
"Pare de rir.", Lauren pede, rindo também. "Eu não sabia que você plantava café."
"Planto!", o ar já me faltava.
"Puxa, Camz, eu não sabia.", fala recuperando a seriedade.
"Pois é."
"Me des...", sua voz sai num sussurro.
"Hã?"
"Me desculpa. Eu sou uma completa babaca, eu não deveria ter sumido assim, e muito menos sem ter te avisado. Sou um completo café fraco."
Rio de sua última frase, "Não se desculpe, Lolo. Você não é nada disso, inclusive, tem até um pouco açucar para deixar tudo mais doce."
Ela ri sem humor, "Qual é Camz, eu deixei sem nem dar explicações."
"Você não dá explicações sobre muitas coisas, e mesmo assim eu não reclamo."
Ela ia se pronunciar, mas calou-se, então continuei, "Eu sei que sua relação com Clara não é a das melhores, e eu entendo.""Como você sabe o nome dela?"
"Eu já escutei a Dinah falando."
"Ah! Pois é. Não chega nem a ser boa.", ela lamenta.
"Não sei se ela te deu o recado, mas estou aqui, Lolo. Você pode me contar as coisas, sabe disso."
"Talvez ela tenha dado, provavelmente eu estava bêbada."
"É, provavelmente.", gabo.
"Eu não tinha muita certeza, antes."
"Do quê?"
"De você.", ela diz como se fosse óbvio.
"E...?", gesticulo com as mãos como se fosse possível ela ver.
"Eu não tinha certeza do que sinto por você. Ainda não tenho. Na verdade, eu tinha insegurança, porque não sei bem o que é isso, e não sei se você sente o mesmo...", ela pondera, " As incertezas continuam, mas você acabou de me deixar segura de que sente algo por mim."
"Ah, Lolo...", sorrio, "eu sinto muito por você. E se você sente muito por mim, então creio que há uma reciprocidade."
VOCÊ ESTÁ LENDO
Mundo Sucinto (Camren)
FanfictionCamila e Lauren se conhecem de uma maneira cômica e inusitada. Essa amizade nova e inocente logo se transformará em algo profundo, onde ambas farão de tudo para ficarem juntas; não importa o tamanho dos obstáculos.