Sacrifícios

874 40 14
                                    

O pequeno Travis mal havia nascido e já estava no meio de uma briga. Quem diria que a morte de seu pai causaria tanto.

Katie havia voltado com Will logo depois do término do seu luto, quem diria, ela não era tão fiel assim ao Stoll, já que superou tão rápido sua morte. Logo ela e Solace casaram-se e o filho de Travis nasceu, dando assim início a maior discussão que aquele acampamento veria em séculos.

Connor não aceitava que o sobrinho vivesse com o homem que o irmão sempre odiou, Miranda tinha escolhido o lado do... O que eles eram mesmo? Mas Katie não suportava a ideia de ver-se longe do primeiro filho e do único pedaço que restou do homem que amava. Mas teria que suportar. Teria que fazer o mesmo que a mãe de Travis havia feito com eles.

Agora ela entendia porque a mulher tinha sido tão desprezível com eles. Porque ela amava-os, mas não podia protegê-los. Ela sabia que o melhor lugar para os filhos era o Acampamento, mas a única maneira que conseguiu de deixá-los partir fora fingindo para si que não os amava.

Foi refletindo sobre a mãe de Travis que notou que seu pai também estava certo. Ele queria protegê-la, mas ao contrário da outra, a maneira que fez isso foi protegendo-a dos monstros e por consequencia, do mundo. Katie percebeu, tarde demais, que as pessoas tem formas diferentes de demonstrar o amor, e que você não se apaixona pelo sentimento em si, e sim pela maneira com que ele é demonstrado. Ela amava Travis por isso, pois ele mostrava esse amor colocando a vida dela acima da própria. O pai colocava a vida dela acima da liberdade, a mãe dos Stoll colocou a segurança dos dois acima de sua felicidade. 

O amor era um sentimento que para ser demonstrado deveria ter um sacrifício, e era isso que ela faria agora. Sacrificaria a sua felicidade para não causar problemas mais tarde para o filho. Essa seria a coisa mais difícil que faria, mas tinha que ser feita. 

E como a garota há apenas alguns meses tinha previsto, ela estava sentada com seu filho nos braços e lágrimas rolando silenciosamente pelas suas bochechas. Acariciou a testa do pequeno com o seu rosto e beijou-lhe a testa, sussurrando-lhe as palavras que pensou serem as certas.

- Você parece com seu pai, Travis, e espero que seja tão incrível quanto ele foi. - Deu um último beijo e entrou, entregando o filho nos braços da irmã.

- Vai ser o melhor, Katie, você sabe. - Apenas assentiu em resposta olhando para baixo. - Ele continuará aqui, só vai te chamar de tia. - A irmã sorriu triste e Katie suspirou sorrindo de volta.

- Eu queria que ele não tivesse partido. - Miranda ouviu, mesmo que a mais velha tivesse falado baixo.

- E eu queria que você não tivesse se casado de novo. - Retrucou. - Isso não faz sentido algum, você sabe. - Aquele era um questionamento que todos tinham, mas existia uma regra silenciosa de que era um assunto proíbido. - Travis odiava esse homem, qual é o sentido em você voltar com ele?

- Eu prometi a Travis. - Miranda não esperava que Katie fosse responder, mas agora que ela estava falando, ouviu. - Um dia conversamos sobre isso, e ele me disse que se eu quisesse vê-lo feliz no Elísios, eu deveria ser feliz aqui e não ficar eternamente de luto. - A mais velha olhou para cima com lágrimas nos olhos. - Ele queria me ver feliz, foi a única coisa que pediu, eu não podia... Miranda, eu nunca vou deixar de amá-lo, mas ele falou que se um dia morresse eu deveria continuar a viver, assim como eu falei que se um dia eu morresse ele não podia ficar de luto.

- E você acha que ele obedeceria? Travis nunca te traíria da maneira que você está fazendo. Ele disse isso para te tranquilizar, você não está feliz! - Katie riu fraco.

- Eu estou. Eu gosto de Will, não o amo como a Travis, mas ele me faz bem. - Miranda olhou para a irmã horrorizada.

- Eu não conheço você. Nem quero. - Cuspiu. - A melhor coisa que faço é tirar essa criança de você, nunca mereceu Travis, nunca mereceu esse filho, não merece nem mesmo o sangue de nossa mãe. - E saiu.

Esse foi o segundo sacrifício que Katie havia feito em um dia.

Esse foi por Travis, não o filho, mas o pai.

Se ele, em algum lugar, estivesse vendo isso, não se prenderia à ela. E mesmo que fazer com que ele sofresse doesse nela, era a única forma de fazê-lo esquecê-la, deixando-o pensar que ela também esquecera-o.

Talvez um dia os deuses a perdoassem por tudo que estava fazendo, mas por enquanto ela sofreria em silêncio, não deixaria que os outros soubessem o que sentia. Faria as pessoas que amava sofrerem por ódio ao invés de por arrependimento.

Era o certo. Mesmo que doesse.

TratieOnde histórias criam vida. Descubra agora