Capítulo 8 - Vegas Skies

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"so say goodnight, our first goodbye, I've only got forever and forever is fine..."

Steve bateu na porta duas vezes e esperou até ser convidado a entrar para poder girar a maçaneta. O escritório tinha um ar de seriedade que espelhava bem o seu dono, tudo em seu devido lugar, nem um cisco de poeira a vista e o ar nem muito quente e nem muito frio. A mesa de madeira na cor preta não possuía nada mais do que um notebook e alguns papéis, mas foi a cadeira giratória que chamou a atenção de Steve. Estava vazia. Desviou os olhos para a enorme janela com vista para o exterior e viu T'Challa em pé, de frente para a paisagem, as mãos nos bolsos da calça social e a postura ereta.
- Sr. Rogers - ele cumprimentou ainda sem se virar, um resquício de sorriso transparecia em sua voz.
- Ah, desculpa interromper... - Steve se pronunciou, entrando totalmente no escritório e fechando a porta atrás de si. Ficou em pé, sem saber ao certo o que deveria fazer a seguir.
Desde que chegara naquele lugar, não havia aprendido a lidar com o jeito centrado do Rei T'Challa. As vezes achava que estava atrapalhando sua vida ou sendo intrometido nas conversas, até chegava a pensar de vez em quando que o outro lhe dava advertências apenas com o olhar e se sentia uma criança. Outras vezes, percebia T'Challa um pouco feliz de ver a casa tão cheia e com um quê de alegria.
Óbvio que não iria comentar sobre o que achava, então ficou esperando o homem se virar e encará-lo.
- Em que posso ajudá-lo? - puxando a cadeira para que pudesse se sentar, indicou a outra a sua frente para que Steve a tomasse.
- Bom... Tem a ver com o Bucky - falou após estar acomodado, cruzando as mãos no colo e soltando um suspiro cansado.
Havia pensado muito no que iria dizer, não queria soar interesseiro ou oportunista, mas também não podia mais esperar, aquela ideia já plantada em seu cérebro há um tempo precisava ser posta em prática.
- Imaginei - T'Challa tinha um olhar sagaz, um sorriso satisfeito dando lugar ao amigável - Pode falar, Steve.
- É que... Bem, nós todos estamos muito gratos por tudo que você tem feito e eu não pediria por mais. É só que... - parou um instante para procurar as palavras certas, seus olhos se desviando da Alteza para o material impecável do carpete - Acho que ele merece se sentir assim também. Sabe, ter um quarto só pra ele e conviver normalmente no resto da casa, não só naquele naquela ala hospitalar, que mais parece um necrotério... Sem ofensas.
Ao levantar seus olhos novamente, viu que T'Challa observava-o atentamente, as sobrancelhas quase unidas e as mãos juntas no gesto de oração. Sua mente aparentava estar em um trabalho frenético, como se milhares de opções estivessem convergindo.
Steve sentiu sua garganta secar. E se ele dissesse "não"? E se a bondade que mostrou em relação à Bucky tivesse se extinguido?, pensou. De repente, sentiu um medo inimaginável de que seu amigo não fosse ser mais bem vindo ali e precisasse ir embora. O que iria fazer se isso acontecesse? Iria com ele ou ficaria exatamente onde estava?
- Capitão... - ao ouvir a voz de T'Challa, saiu de seu devaneio para prestar atenção - Não quero ser rude, mas achei que isso estava implícito.
- Eu entendo qu... Como? - Steve se atrapalhou ao assimilar aos poucos o que ouvira.
- O Sr. Barnes é parte da equipe, não é? Creio que seja óbvio o fato de que ele tem um espaço na mansão, assim como todos vocês - não havia sarcasmo ou espaço para discussões em seu tom.
Steve ficou ali, sem palavras e sem reação. Não contava que for ser tão fácil assim, apesar da hospitalidade imediata que o Rei havia mostrado para todos eles. Parecendo compreender a expressão do outro, T'Challa deu um suspiro cansado, como se estivesse tentando explicar a uma criança o motivo do céu ser azul e se pronunciou novamente.
- Sr. Rogers, achei que tínhamos passado da fase de sentir receio uns com os outros. Todos os presentes nessa mansão sabem e entendem o que o Sr. Barnes significa na sua vida, não precisamos de explicações. Ele é parte da equipe e pronto. Não tenho mais nenhum interesse em fazê-lo sofrer sob meus comandos... - deixou a frase no ar, dando um sorriso amistoso que não era típico dele.
Assentindo devagar, Steve deixou a tensão que estava sentindo ao entrar ali se esvair, recostou-se na cadeira e imitou o outro ao suspirar pesadamente.
- Às vezes acho que o peso que carrego nos ombros e só fruto da minha imaginação, sabe? Que eu crio todos os cenários horríveis possíveis e sofro sem motivo nenhum - confessou olhando para os pápeis distribuídos organizadamente em cima da mesa, não sabendo o porquê de estar falando sobre seus sentimentos com o homem mais sério do planeta.
- Suas preocupações não são ifundadas, isso eu posso dizer com toda certeza - T'Challa falou de um jeito ao mesmo tempo compreensivo e explicativo - Passar pelo que você passou não é algo fácil e que não deixa marcas. Você viveu mais do que todos nós, os males do mundo e o que quer que ele tenha de ruim para jogar em nossa direção. Ficar aflito, se preocupar, querer abraçar a todos e criar um escudo para que ninguém se machuque, não é crime.
- Mas... Estou sentindo que tem um "mas" vindo por aí.
- Mas... Talvez você devesse procurar dentro de si mesmo o Steve Rogers de alguns meses atrás.
- Qual deles?
Se lembrava vagamente de quando parara para observer as escolhas e decisões que haviam tomado ao longe de sua vida, tão acostumado a ser sempre o mesmo homem íntegro e pacificador que nascera sendo. Não era difícil, tudo que devia fazer consistia num emaranhado de coisas boas e claras, nunca pisando no lugar errado ou deixando que alguém influenciasse suas decisões. Sua memória podia buscar datas específicas, como quando fizera 19 anos e Bucky vivia lhe dizendo para "parar de ser tão certinho" e logo depois sorria de lado e corrigia "quer saber, não pare não, as garotas gostam de caras certinhos e só Deus sabe o que eu faria se você fosse diferente disso". Mas mesmo que quisesse, não poderia deixar de ser ele mesmo, pois por mais que houvessem aqueles como Tony Stark que diziam coisas do tipo "eu não acredito em quem não tem um lado sombrio", Steve jamais fingia. Estava sempre contente, satisfeito em poder olhar no espelho e saber que aquele o encarando de volta era o mesmo homem de 70 anos atrás, antes do soro do super soldado.
No entanto, sabia ao que T'Challa se referia. Aos dias anteriores a sua vinda para Wakanda... Não, dias não. Aos meses anteriores. Mesmo assim, esperou pelas palavras que sabia que viriam do outro lado da mesa.
- Aquele Steve que largou tudo e todos, princípios e morais para salvar praticamente a única coisa que lhe restava no mundo.
- Queria que ele voltasse.
- Ele está parado bem a minha frente - T'Challa falou com convicção, encontrando o olhar distante e duvidoso de Steve, que parecia boiar no que lhe era dito, tentando buscar algo para se agarrar na correnteza - Não se engane, Steve. Antes de Bucky aparecer em sua vida, você era o homem que havia sido descongelado após setenta anos, alguém que reaprendera a viver e conviver, aposto que não tinha nada nesse novo mundo que se comparasse ao que o senhor encontrou em Washington há dois anos atrás. Posso ter lido sua história e não presenciado todas as coisas, mas sei que reencontrar algo que achou ter perdido há muito tempo, fez com o seu verdadeiro eu voltasse a tona. Sei como é isso, sei como é se sentir afogado no meio de responsabilidades e dúvidas crescentes. Sei também reconhecer um homem renascido, quando vejo um. Abrace essa oportunidade que a vida está lhe dando, gostaria de ter a mesma chance. Abrace-a com todas as forças e se lembre que não existem duas personalidades dentro de você e sim dois lados que se conectaram depois de muito tempo separados e que precisam aprender a viver juntos novamente. Entenda como quiser, mas me refiro principalmente a você e ao senhor Barnes.
Não soube como responder, pois havia sido tomado por uma vontade repentina de ficar sozinho com seus pensamentos. Então só assentiu devagar, percebendo que segurava os braços da cadeira com muita força, quase esmagando-os.
- Agora, vá embora daqui e diga para as senhoritas Romanoff e Maximoff não acabarem com o limite do cartão de crédito. Já vou avisando que não são caprichos, são necessidades - seu tom era autoritário, por mais que um sorriso escapasse de seus lábios dizendo que ele não estava dando-lhe uma bronca.
Steve, sabendo o que ele queria dizer, não esperou por mais nada. Tinha o aval final para colocar seu plano em prática e não iria desperdiçar mais nenhum segundo.
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