Kallissa 4

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Kallissa 4

A deusa da verdade era magnífica.

Nua e de braços abertos, sorria para todos. Um sorriso de piedade e conforto.

Seu corpo era branco, feito de um mármore tão puro e polido que parecia vidro. De longe seu corpo aparentava ser coberto por delicadas linhas que, com a proximidade, sumiam e, em seu lugar, emergiam centenas de pequenas esculturas. Juntas essas pequenas esculturas formavam a escultura maior de “Myr”.

Individualmente pareciam contar uma estória. Sobre obediência, amor e união. Eram famílias de mãos dadas. Quase todas de joelhos. Cada pequena escultura era única, com seus distintos detalhes. Eram agrupados pai e filho, irmão e irmã, noivo e noiva, amigos, e todo tipo de união que se pudesse imaginar.

O nome desse tipo de arte era Dualin. Era umas das características de Caltos, pequenas imagens que juntas formavam uma maior. Todas as grandes Linhagens tinham suas armaduras e símbolos feitos em Dualin. A bandeira dos Hysku era sua grande espada com assas, formada por pequenos bordados da mesma espada com assas lado a lado dando forma a imagem maior.

Kallissa ainda admirava as pequenas formas dentro da estatua, uma em particular – mãe e filha abraçadas – fez Kalli trasbordar a culpa que carregava. Virou-se para sua mãe. Alysta estava junto a Mars, admirando as pinturas da grande guerra. Seu pai ainda se encontrava dentro de uma área do palácio que era proibida a eles. Salvo raras exceções, apenas senadores podiam ter a honra de falar com o Imperador Escravo. O salão onde aguardavam Warion retornar era conhecido como o Jardim das Flores de Tinta.

– Mãe... – Kalli falou com vergonha ao se aproximar deles.

– O que aconteceu não importa minha filha.

– Eu não te odeio.

– Eu sei.

– Me perdoa?

– Você seguiu seu coração, não tem nada a ser perdoado.

– Meu primo foi castigado no meu lugar, e meu pai...

– Seu pai estava errado. É fácil obedecer, deixar que os outros ditem para nós o que é certo e o que é errado. Pessoas boas são capazes de fazer coisas terríveis, em nome da obediência. Belos pássaros presos em gaiolas são apenas um exemplo dessa crueldade despercebida.

– Meu pai me odeia.

– Isso não é verdade.

–Não importa o que eu faça. E quanto mais eu tento, mais ele se afasta de mim.

– O que você lembra-se de seu avô?

– Nada. Ainda não sabia nem falar quando ele morreu.

– Seu avô foi um Paramor muito duro. Reconquistar Chatallary e reclamar a entrada de nossa Linhagem na República era mais que um propósito para ele. – suspirou. – Era uma obsessão que vinha antes de tudo, inclusive de seus filhos.

Continuou, com olhar entristecido:

– Ele falava muito sobre o valor da espada. Forjou seu pai, como um ferreiro forja o metal. Com martelo e fogo. Só que no lugar do martelo, ele tinha a disciplina. Em lugar do fogo, era o calor do combate. Mas crianças não são espadas. Seu pai nunca lutou por glória. Cada vez que ele entrava em um campo de batalha, cada vez que matava, o fazia em busca do amor que seu avô nunca lhe deu.

– Eu me conformo então? Aceito que meu pai nunca vai me amar?

– Ele a ama sim.

– Me diz então por que ele me deserdou? Por que ele deu minha mão em casamento sem ao menos falar comigo?

Rainha do GeloWhere stories live. Discover now