Mars 1

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Mars 1

Pensa. Ou você pensa ou você morre.

Mars acordou com os gritos alucinantes de dor que vinham de sua irmã. As mãos de sua irmã ardiam em púrpura, tão quais as paredes, o chão e o teto, o purpura devorava tudo à sua volta, inclusive os corpos de seus Pais. 

 Ele não tinha muito tempo, apenas poucos segundos até que o fogo o alcançasse. Mars sabia que ele tinha que pensar numa saída, mas o trovejar dos gritos de sua irmã,  ainda ecoavam em sua mente.

O medo aumentava com a intensidade do calor, ele sentia a histeria se apoderando, sufocando sua mente com os impulsos de seu corpo. O desespero lhe dizia, corra, chore, implore.

Existe uma resposta, se eu me concentrar, se eu pensar, eu encontro uma saída.

Mars sabia que escolher para onde ir era sua única decisão. Era como um teste de múltipla escolha, quatro paredes, quatro opções. Não três. Uma delas estava bloqueada pelo teto que desabou sobre o seu pai.

Olhando a sua volta, ele tentou recriar em sua memória onde ele estava, o fogo já havia engolido tudo, o que podia ser queimado juntamente com o que não podia, distorcendo, destruindo e desfigurando.

Uma estátua, no entanto, ainda possuía seu contorno. No chão Mars viu o que restava da outra. E o salão, o salão com os ridículos relógios de parede.

Das três escolhas, duas o levariam morte, indo ainda mais adentro da mansão. A escolha certa, no entanto, o levaria para a sala de jantar que ficava logo abaixo do quarto de seu pai, uma parede depois dessa e Mars encontraria o lado de fora.

 Eu acho.

Tudo que ele tinha que fazer era pensar, recriar o maldito salão que ele apenas passou uma vez. Relembrar por onde ele entrou, e de que lado estaria a sala de jantar.

Eu não sei, em nome dos sete profetas eu não tenho a menor ideia.

Estava ficando difícil de respirar, e com cada respiro ele tossia, e com cada respiro ele sentia o cheiro de morte.

O cheiro guiou seus olhos novamente para os corpos de seu Pai e sua Mãe. Seu pai queimava em paz, como quem estivesse apenas dormindo, um sono tão pesado que nem as chamas ou a viga de madeira que perfurava seu peito tinham o poder de perturbar.

Já o corpo de sua Mãe contavam outra estória; Com seus membros encolhidos e seu torso contorcido, ela trazia no que sobrava de seu rosto um inquietante e perpétuo sorriso, um que apenas aquele que não tem mais pele podem dar. Ela morreu em agonia, debatendo seu corpo, procurando um alívio que não encontrou.

Mas, por pior que fosse a visão, e por mais assustador que foram os gritos, nada era mais terrível que o cheiro que impregnava suas narinas. Eu posso fechar meus olhos e ouvidos, mas como posso  fechar meu nariz? Se eu respirar pela boca vou comer as cinzas dos meus pais.

Se existiam livros com descrições do cheiro de pais queimados ele nunca os tinha encontrado. E se tivesse que imaginar, ele teria errado. Não tinha nada de parecido com o cheiro de uma caça espetada ao fogo. Claro que não, o sangue é escorrido, não tem pelos, nem órgãos.

Não, o cheiro de morte por fogo era algo que ele nunca havia sentido. Era algo tão profundamente profano que ao mesmo tempo em que o enojava lhe desafiava a decifrá-lo. Pense em outra coisa, pelo sono do Sonhador pense em outra coisa.

Mas sua mente não lhe obedecia, e num ato de insanidade ela tentava desconstruir o cheiro da morte de seus pais. O cheiro amargo e sulfúrico ele imaginou, vinha dos pelos queimados. Os aminoácidos dos pelos continham enxofre. O cheiro de cobre enferrujado vinha do sangue que ele a muito sabia que era rico em ferro. O cheiro do queimado era o mais fácil deles, vinha da pele. O elemento final, e o mais difícil de decifrar. Era o perfume da podridão, o cheiro que reinava sobre todos os outros, pesado e decomposto, este ele tinha quase certeza vinham dos órgãos por serem ricos em líquidos.

Rainha do GeloWhere stories live. Discover now