Sam Evans

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Verão de 1936

— Você está linda, querida — Russell disse orgulhosamente ao entrar no quarto da filha.

Quinn agradeceu com um aceno de cabeça, ainda se olhando no espelho. Sua mãe estava a alguns metros de distância, admirando pai e filha com um olhar perdido porém afável. Frannie, sua irmã, estava na sala de estar ao lado de seu marido, provavelmente, ambos prontos para saírem.

Quinn iria completar vinte anos em quatro dias. O evento daquela noite era precisamente para arranjar-lhe um marido inteligente, muito comportado e que estivesse no exército alemão, a única exigência de seu pai. Por mais que Quinn não concordasse com a regra — ou com o fato de casar em si, já que sequer tinha começado direito a faculdade —, ela tinha que ceder. Viver embaixo do teto de uma das pessoas mais ativas no sistema nazista não era algo que ela prezava muito.

Ela tinha somente dezenove anos, mas sabia que Hitler declararia guerra em poucos anos e que as medidas tomadas contra o povo judeu eram completamente sem nexo e injustas. Mas ela não poderia sequer sonhar em falar isso em voz alta. Se não fossem as tropas de Hitler invadindo sua casa no momento em que fechasse a boca, seria seu pai dando-lhe uma bofetada na bochecha. Quinn sabia o que acontecia com as pessoas que discordavam de Hitler, e sua vida depois disso não era nenhum mar de rosas.

Quinn virou-se e sorriu para os pais. Eles retribuíram, acenando para que ela não se demorasse muito. Suspirou, lançando um último olhar ao seu reflexo e murmurou antes de sair:

— Me deseje sorte.

O pior de estar em uma confraternização do governo não era a comida ou o gramofone tocando jazz, e sim a conversa. Por todos os cantos, generais e empresários, soldados e cozinheiros, todos eles falavam sobre uma única coisa: nazismo. Quinn se afastara dos pais e da irmã à procura de um lugar calmo sem elogios à Hitler e ao governo, mas era simplesmente impossível.

Tentar argumentar com algum deles era tão terrível quanto ouvir sua adoração pelo Führer, por isso Quinn se mantinha distante, apenas acenando com a cabeça quando seu nome era chamado. Após o jantar ter sido servido, Quinn sentou-se na varanda da casa, admirando a bela Berlim lá embaixo.

A casa onde estava era de um general consideravelmente famoso que ela não decorara o nome. Ele morava na alta parte da cidade, nos subúrbios de Berlim, e possuía uma influência invejável — pelo menos para Russell — no governo. O pai de Quinn estava ali para estabelecer alguns negócios e cobrar de oficiais que se achavam espertos demais; ele trabalhava no ramo de consultoria financeira. Ah, e, claro, arranjar um marido para a filha.

Ela tinha visto alguns soldados bonitos e até conversara com eles, mas nenhum tinha lhe chamado à atenção. Quinn nunca gostava muito da companhia de garotos — eles eram convencidos demais e geralmente muito bobos. Ela tinha amigas na faculdade, naturalmente, que sempre reclamavam sobre querer um namorado e essas coisas, mas nessa parte da discussão ela somente ouvia e não opinava muito.

Obviamente, Quinn já beijara um ou outro garoto durante a adolescência, por brincadeira, mas nunca sentira a "chama" que suas amigas falavam tanto. Quinn se perguntava constantemente o que havia de errado com ela.

Estendeu a taça de champanhe para uma garçonete que vinha da cozinha, bem atrás da varanda. Olhou fundo em seus olhos castanhos, e, ao contrário das outras garçonetes, esta não abaixou o olhar. A garota parecia desafiá-la a fazer alguma brincadeira, como provavelmente acontecera durante toda a noite.

Quinn sabia que a menina era judia. Um simples olhar bastava para que ela soubesse disso; Hitler se encarregara de marcar as características dos judeus para que todos os conhecessem e os desprezassem. Quinn não era assim, mas a garçonete não sabia disso. Antes que pudesse dizer alguma coisa, a garota judia empinou o nariz e saiu do local, deixando uma Quinn surpresa para trás.

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