St. Jude

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Another conversation with no destination
Another battle never won
Each side is a loser
So who cares who fired the gun.

        Me encontro em frente à uma porta de madeira gasta com algarismos metálicos que formavam o número 116.  William está procurando a chave do apartamento enquanto eu sofro um dejá vu desconfortável.
-Você mora aqui? - perguntei, reconhecendo o lugar onde estava.
- Sim, me mudei faz uns dois anos. - ele puxa um chaveiro com vários pingentes de figuras musicais famosas. - Achei essa merda.
        Saio da frente do caminho e ouço as engrenagens da fechadura se moverem enquanto William gira uma chave dourada dentro da mesma. Ouve-se um estalo e a porta se abre, dando acesso a uma sala com um estilo alternativo e paredes branco-sujas. Entro no apartamento olhando ao redor, avisto o sofá-amigo que eu passei muitos momentos chorando por causa de um homem, ou até mesmo dormido ao lado dele enquanto assistíamos a um filme cult. Ando até ele e sento no mesmo, passando a mão pelas almofadas de couro branco com algumas marcas envelhecidas com o tempo.
- Mora sozinho?
-Com mais dois amigos. - ele responde abrindo uma cristaleira e retirando dois copos para uísque. - Gabriel e Ed.
- Eduardo? - indago por impulso. Merda, Alice, merda.
- Sim, como você sabe? - Will ri pelo nariz me olhando incrédulo.
- Ah, foi no chute. - minto dando de ombros. - Eles moravam aqui antes?
- Aham, - ele descansa os copos na mesa de centro na minha frente e volta para a cristaleira. - eles moram aqui desde que terminaram o Ensino Médio.
- Ah... - começo a procurar por uma moldura com uma foto familiar que vi desde a última vez que vim, dou um suspiro por não encontrá-la. - E onde eles estão?
- Gabriel foi viajar com a namorada, só volta amanhã. Ed tá em Búzios com o resto da banda. - a porta da cristaleira é aberta e de lá sai uma garrafa de Absolut vodka. - Eai vamos beber ou não?
         Pelo menos o Eduardo não está aqui pra ter outro ataque ao me ver por perto. Só de lembrar da última vez que o vi, a lateral esquerda do meu rosto começa a latejar. Passo minha mão pela bochecha para parar de sentir o desconforto e aceno com a cabeça, aceitando o convite.
- Vamos pra cozinha então.
        Ele sai andando e entra no corredor. Saio do sofá, pego minha bolsa e sigo-o, entro na cozinha com uma luz branca predominando as paredes e o chão, uma porta de vidro no fundo exibia uma varanda com um conjunto de mesa e duas cadeiras que haviam lá fora.
        A cozinha americana estava completamente limpa, só o fogão que não estava em bom estado e a pia possuía um pouco de louça para lavar, nada pior do que a minha. Vou até a outra extremidade do cômodo e arrasto a porta de vidro, dando acesso à varanda. Saio da cozinha e me largo na cadeira desleixadamente. A brisa da noite bate no meu rosto e fecho os meus olhos sentindo o vento acariciar minha pele.
        O som do metal arrastando na madeira me tira do transe, abro os olhos e vejo um William parado na minha frente com dois copos cheios até a boca com vodka e suco de laranja. Pego um das mãos dele e tomo um gole grande. Torço a boca pois está muito forte a vodka, mas depois do segundo gole me acostumei.
        Pego um maço de cigarros dentro da minha bolsa e procuro pelo isqueiro. Sem sucesso, me lembro de onde o deixei, ou melhor, com quem.
- Você ficou com meu isqueiro? - perguntei, levantando uma sobrancelha.
- Acho que... - ele apalpa os bolsos a procura do mesmo. - não.
- E onde você deixou?
- Merda, em cima do balcão do bar. - ele bufa.
- Ótimo. - rolo os olhos. - Você me deve um isqueiro, William.
- Eu sei. - Will dá de ombros. - Só me dar seu número de celular que daí na próxima vez que nos vermos, eu te dou um.
- Próxima vez? - encarei-o. - Quem disse que vai ter próxima vez?
- Eu tenho certeza. - ele passa o dedo indicador pela boca circular de vidro do copo.
        Solto um riso pelo nariz, bom William você é muito confiante. Bebo o resto da bebida e coloco o copo de volta na mesa, talvez com um pouco de força demais. Pego um cigarro e ponho-o entre os dentes, volto para a cozinha e acendo o fogão. Suas chamas azuis chamam a atenção dos meus olhos enquanto acendo o cilindro de nicotina, encosto a ponta dele no fogo e depois levo-o de volta para minha boca e dou um trago.
        Retorno para a varanda e encontro os pés do William apoiados em cima da mesa, ele usava coturnos mais escuros que petróleo, e meias verde neons com caras tristes da cor roxa. Deixo uma risada escapar pela minha boca e sento na cadeira, ainda encarando suas meias.
- E então, o que vamos fazer agora? - perguntei reprimindo um sorriso.
- Não sei... Estou aberto a ideias. - ele sorriu olhando pra baixo mostrando suas covinhas.
        Coloquei o dedo indicador no meu queixo e mordi o lábio inferior, essa minha mania que tenho quando tento pensar em algo. Me lembro da garrafa vazia que deixei dentro da bolsa e pego a mesma, retirando o recipiente de vidro de dentro dela.
- Vamos jogar verdade ou consequência. - deposito a garrafa em pé na mesa e dou mais um trago no cigarro.
- Como? Só temos nós dois de jogadores. - ele me encara tentando ler meus pensamentos.
- Bom, - coloco o cigarro na mesa e solto a fumaça presa nos meus pulmões. - a boca vai ser de quem pergunta, e a bunda vai ser de quem responde. - expliquei indicando cada extremidade com a mão. - Eu começo.
        Peguei a garrafa no meio e deitei-a na mesa metálica, girei a mesma que deu oito voltas seguidas até indicar quem iria perguntar e quem iria responder. Coloquei o cigarro entre meus dentes novamente e dei mais uma tragada, esperando pelo interrogatório.
- Eu pergunto. - Will sorri maliciosamente. - Verdade ou consequência?
- Verdade. - meu coração dispara esperando pela pergunta.
- Com quantos anos você perdeu a sua virgindade? - típico, William, típico.
- Treze. - me fiz de indiferente. - Gire a garrafa.
        Ele estava com a boca aberta em um pequeno O, e quando dei uma ordem William saiu do seu estado de choque. Ele virou o recipiente e agora quem pergunta sou eu. Apoio meus braços sobre a mesa e me inclino para perto do rosto dele, com um sorriso estampado no rosto indago:
- Verdade ou consequência, monamour?
- Verdade. - ele se inclina também.
- Justo. - me ajeito na cadeira e afasto meu rosto do dele. - Com quantas garotas você já transou?
- Uma. - ele engole seco e bebe o resto do seu drink.
- Sério? Por quê?
- Uma pergunta por vez. - seu dedo indicador aponta para o recipiente no meio da mesa e eu continuo o jogo.
- Verdade ou consequência? - pergunto novamente, pois a boca virou para mim de novo.
- Consequência. - droga. Ele sorri triunfante, pois sabe que eu iria perguntar o porque de uma só garota.
- Eu te desafio a responder a minha pergunta anterior. - sorrio, eu também sei jogar o seu jogo.
- Inteligente, Senhorita Alice. - Will acena com a cabeça e ri com escárnio. - Eu e Jessica, namorávamos desde a sexta série, terminamos no ano passado.
- Hm, que pena. - faço um biquinho. - Só teve experiência com uma mulher só.
- E você?
- Não, não, não. Gire a garrafa. - indico com a cabeça.
        A mesma dá dez voltas e a bunda está virada para mim desta vez. Merda.
- Verdade ou consequência, signorina?
- Consequência.
- Eu te desafio a passar a noite aqui em casa. - ele diz sério, estreitando os olhos enquanto espera uma reação minha.
        Mantenho a minha postura e sinto os pêlos da minha nuca se eriçarem, não me sinto assim faz tempo, me inclino novamente em direção ao rosto do William e sussurro:
- Desafio aceito.

Diário de AliceOnde histórias criam vida. Descubra agora