Capítulo V

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  A primeira fase de minha gravidez pode ser resumida em enjôo e desejo por brócolis. Agradeci mentalmente por ser algo saudável perto dos desejos de Clara, que até detergente tomou, e quase pirou o Scott com isso.
Falando nos dois, eles foram meu porto seguro, fiz meu pré-natal com a mesma médica de Clara, mas me recusei a mudar pra Londres, minha vida estava em Brighton, então preferi me deslocar ás vezes, mas seguir no antigo apartamento. Embora fossem meus amigos, eles não tinham obrigação comigo ou meu filho, e tentei ao máximo não incomodá-los.
No segundo trimestre da gestação, meu corpo realmente mudou, a barriga começou a ser notada e descobri que esperava uma menininha. Como sempre fui apaixonada pelo clássico Alice no país das maravilhas, foi esse o nome que escolher para minha pequena princesa. Foi nessa época que pude pegar no colo o pequeno Petter, sim, ele herdou o nome do pai mais coruja do mundo. E não apenas o nome, mas sim todo o resto, Petter era uma cópia menos agitada de Scott, pra sorte de Clara que piraria com dois hiperativos em casa. Fiquei com eles durante o primeiro mês de meu afilhado, ele era lindo e foi fantástico acompanhar de perto tudo, também aprendi melhor a cuidar de bebês, afinal logo Alice estaria em meus braços.
Durante esse mês pude me dedicar a um universo que amo, o da música. Acabei compondo com Scott que se surpreendeu em saber dos meus dotes para o piano, e me convenceu a vender algumas composições minhas para o . Scott só conseguiu me convencer após jurar que Adam não saberia a verdadeira dona das canções.

Falando em Adam, por intermédio de Scott, ele me mandou dinheiro algumas vezes, fiz o mesmo devolver, não queria vê-lo, muito menos aceitar qualquer coisa dele.
A situação não estava muito fácil e precisava de dinheiro, então consegui um emprego extra tocando em um restaurante em Portslade durante as férias da pianista titular.

Minha rotina foi um pouco cansativa, mas com o trabalho extra e o estágio em uma escola de música, estava conseguindo guardar grana e me sustentar sem precisar da ajuda de ninguém. Mudei também de apartamento, aluguei um Kitnet perto de onde fazia estágio e assim economizei com passagem, além de conseguir alugar o meu por quase o dobro que pagava no Kitnet, não podia escolher muito, juntar grana e ter alguma reserva quando Alice nascesse era minha preocupação do momento.
Meus pais descobriram da gravidez quando estava no sétimo mês, vieram até minha casa e ofereceram ajuda, mas em troca queriam que eu voltasse para casa, escondesse Alice da sociedade e virasse um fantoche deles, levando minha filha para ter a vida que sempre odiei. Neguei a ajuda e segui sozinha. Foi nesse período que tranquei minha faculdade, havia terminado mais um semestre e não conseguiria me dedicar a outro com o parto se aproximando.
Clara marcaria o batizado de Petter , perto dos dias que eu completaria 8 meses de gestação, mas como Alice era um pouco ansiosa, tivemos que desmarcar tudo e passar aquelas últimas semanas no hospital tentando prolongar a gravidez. Nesse momento eu me permiti ter medo, éramos apenas nós duas, ela precisava de mim. Não queria que ela atrapalhasse ou fosse criada por alguém, mesmo esse alguém provavelmente sendo minha melhor amiga. E eu, precisava ainda mais da minha menina, mesmo sendo criada em uma família considerada tradicional, com Alice eu havia entendido o significado da palavra família e mais que tudo, o amor sem medidas.
O nono mês chegou e com ela e ansiedade para chegada da minha pequena. Scott e Clara acompanharam tudo de perto, ela entrou comigo e gravou o parto, notei em Scott uma esperança enquanto via o vídeo, tenho certeza que ele enviou para Adam, e que a resposta não foi boa, pois pude notar sua cara de decepção enquanto mexia no celular.
Tive sorte, minha pequena dava pouco trabalho, praticamente só mamava, dormia e enchia as fraldas, depois da primeira semana, onde passei na casa dos meus amigos, voltei para nossa e segui minha rotina com ela. Ter um bebê pequeno em casa não era algo fácil, mas treinei um pouco com Petter e acredito que me saia bem. Via Clara uma ou duas vezes na semana, nos falávamos todos os dias através da internet. Alice já tinha um mês quando finalmente marcaram o batizado dePetter , acabei marcando o da Alice junto, assim faríamos os dois. Eu madrinha de Petter, e Scott e Clara de Alice, contudo essa seria a primeira vez depois de tanto tempo, que veria Adam novamente. Mesmo sendo um completo idiota, ele era o melhor amigo do Scott , e mesmo a contragosto Clara teve que aceitar a escolha do marido, quando o colocou de padrinho.
A cerimônia de batismo estava marcada para ás 10 horas, então cheguei ás 9h 30min em frente á igreja, como havíamos combinado.
Clara, Scott Anthony e uma namorada que não conhecia, estavam lá. Logo chegou Henry e Adam. O último paralisou encarando a pequena criança dormindo em meus braços. Segurei forte Alice e cobri seu rosto, em seguida virei de costas conversando com Scott .

- Ele vai acabar vendo ela Bella. – Scott falava um pouco nervoso.
- Não faz diferença pra ele ver ou não, prefiro que não veja. – Falei engolindo a vontade de chorar.
- Bella, ele é turrão, mas ele gosta dela sim.
- Acho que você é o único que ainda se engana.
- Espero não estar enganado. – Respondeu triste.
- Eu espero estar enganada. – Falei por fim e entrei na igreja com minha filha.

Sentamos todos na mesma fileira. Adam sentou ao lado de Henry, que por sua vez sentou ao meu lado. Assim que a missa começou eles trocaram de lugar me deixando de braços atados, sem ter muito o que fazer.
O padre chamou todos nós até a frente, dando inicio a cerimônia de batismo. Depois se dirigiu até nós, pedindo para os padrinhos segurarem as crianças. Após a cerimônia de batismo, sentamos novamente, Alice chorava um pouco, pois havia acordado assustada ao sentir a água em sua cabeça e Adam me encarava nervoso.
- Eu posso, ér tentar acalmar ela? – Perguntou nervoso e gaguejando.
- Não precisa. – Respondi fria sem encará-lo. Algum tempo depois ela parou de chorar, e ficou olhando e sorrindo para o homem ao meu lado. Ele sorriu de volta levando a mão tremula até seu rostinho, fazendo um carinho e se aproximando mais, talvez com a finalidade de beijar seu rostinho, mas não deixei, troquei Alice de lugar e com o braço tentei fazê-lo ter a menor visão possível dela.
Novamente o padre nos chamou, pedindo que apenas os pais e as crianças fossem até a frente da igreja. Levantei indo em direção ao altar, ele levantou também, mas dessa vez Clara foi quem falou.
- Agora são só os pais Adam, você não precisa ir.
- Mas. – Scott tentou justificar.
- Ele é só o padrinho do Petter , não é pai de nenhuma criança que está sendo batizada. – Ouvi minha amiga falar, Scott tentou mais uma vez defende-lo, então ele resolveu falar, com a voz um pouco rouca.
- Ela tem razão, eu vim aqui para batizar o Petter, só isso.
Nesse momento deixei uma lágrima escorrer, não pelo fato dele ser daquele jeito, mas pelo medo de minha filha sentir na pele sua rejeição. Uma criança linda e alegre, que não merecia aquilo.


Por Adam

Sempre achei que não tivesse coração, mas a dor que sentir ao ver Isabella segurando sozinha aquela pequena e indefesa criança, ao lado de vários pais orgulhosos de seus filhos, me fizeram finalmente enxergar a burrada que eu fazia todos os dias. Olhar pra ela e ver que eu joguei tudo fora, me fez sentir um merda. Alice consegue ser ainda mais bonita do que nas fotos, ela tinha uma luz dentro de si que cativava as pessoas próximas, tão pequena, frágil, queria poder segurá-la, mas ao mesmo tempo sentia medo. Petter sempre foi grandão, forte, e eu convivia bastante com ele, mesmo a contragosto de Clara, que me odiava e nem ao menos tentava esconder isso. Ela me aturava porque eu era amigo de Scott . Já ele era o único que não desistia, e acreditava que eu poderia amar, mesmo com esse jeito torto. O que ele não sabia, é que eu amava aquela pequena a muito tempo, e por amá-la quis afastá-la de mim. Todas as pessoas que eu amei um dia estavam mortas, eu não queria e não suportaria perder aquela menininha tão frágil, então achei melhor seguir afastado e parecendo não ligar pra nada. Mas pensando assim, eu também afastei qualquer felicidade de mim. E vendo as duas sozinhas notei que talvez o que me atraiu em Isabella era o fato de termos histórias parecidas.
Minha família estava morta, eu aprendi a ser sozinho e nunca conseguia confiar 100% em alguém. Na banda tinha dois amigos, e um irmão, Scott foi o primeiro e único a ter minha total confiança. Já Isabella mesmo tendo família, era considerada morta por eles. Por um motivo tolo, mas quem era eu para julgar motivos tolos? O dono da atitude mais idiota de todas, o cara que abandonou e maltratou uma mulher grávida de um filho dele, o cara que abandonou uma criança linda que não lhe pedia nada, além de amor.
Quis voltar ao passado, quis fazer tudo diferente. E de todas as coisas não mudaria apenas uma: o ato que teve como semente algo tão puro como a pequena de olhos verdes , iguais aos meus.
A cerimônia acabou e Isabella saiu apressada em direção ao estacionamento. Ela havia vindo de ônibus, mas iria com Scott até sua casa. Me apressei a fim de alcançá-la, quando finalmente consegui, vi que Scott segurou Clara dando algum, mesmo que curto, tempo para conversarmos.

- Hey, espera. – Falei segurando em seu braço.
- O que você quer? – Ela virou me encarando, Alice dormia em seus braços.
- Conversar. – Na verdade eu nem sabia o que queria.
- Acho que não temos nada pra conversar. Cadê o Scott?
- Ele pediu pra te levar, por quê...
- Não mente Adam. O Scott não faria isso.
- Ok, é você ta certa. Mas, queria poder falar contigo em outro lugar, com mais calma. – Falei atrapalhado.
- Não temos assunto para conversar. – Disse me olhando com raiva.
- Eu sei que você me odeia, e tem todo direito de fazer isso, na verdade se te consola saber, eu mesmo me odeio, e não sei explicar o porque, mas queria poder te ajudar. Se você estiver precisando de alguma coisa, qualquer coisa, eu pago! – Falei atropelando as palavras, queria conseguir me manter mais tempo perto delas.
- Eu só preciso de uma coisa tua Adam. – Ela disse encarando Alice.
- O que? Me fala, eu posso comprar, você sabe, não vai faltar nada pra vocês. – Disse com esperança dela me deixar ajudar.
- Distância. – Ela respondeu e virou as costas indo até Scott.

E ela estava certa, para as duas ficarem bem precisavam de distância, quanto mais longe eu ficasse, mais feliz ela conseguiria ser. Então em silêncio prometi que não tentaria me aproximar, já havia ferido demais aquela menina e ela não merecia nada daquilo. Enviei uma mensagem para Scott explicando que era melhor não ir no almoço que eles haviam preparado e agradecendo a oportunidade de ser padrinho de Petter e acompanhar o batizado da minha filha. Me despedi dos moleques ainda na entrada da igreja e fui pra casa disposto a beber e fumar tudo que encontrasse dentro daquele apartamento.

PorIsabella

O Adam era o tipo de pessoa impossível de entender, ele com certeza tinha pelo menos algum distúrbio grave de bipolaridade. Scott sempre tentava defender falando que ficou traumatizado com o passado, mas nunca contava o porque desse trauma. Foi criado pelos avós, ok, mas pelo que eu sabia eles o amavam muito. Diferente de eu que cresci em um lar cheio de ganância e sem amor. E quando tudo parece estar se encaixando, ele vem e simplesmente acaba com meu mundo, minha vontade no exato momento em que virei ás costas, era de estar em casa atirada em minha cama chorando. Mas minha luz estava em meus braços e o fato de tê-la ali comigo me tornava mais forte.
Esperei Scott e Clara, depois fomos até o carro.
- Clara, preciso passar em uma farmácia, as fraldas da Alice estão acabando. – Disse assim que entramos.
- Usa as do Petter, não tem problema Bella. – Ela respondeu.
- Capaz, não precisa, acho que tem uma a caminho né? É rapidinho, se não for atrapalhar vocês.
- Claro que não atrapalha Bella! Vamos lá, tem uma aqui perto. – Foi Scott quem respondeu, dando partida no carro.
Fomos conversando coisas rotineiras e paramos algumas vezes porque Clara queria comprar o bolo de uma padaria e os doces de outra... Como sempre cheia de mania e Scott fazendo suas vontades. Depois paramos em frente uma farmácia e desci indo comprar o pacote de fraudas, achei o lugar um pouco conhecido, mas só notei estar em frente ao prédio que Adam tem uma cobertura, quando a atendente finalizava minha compra.
Nunca fui lá, mas algumas vezes passamos em frente e Clara sempre falava. Comprei as fraldas e fui em direção a porta, então vi Adam segurando Alice em seu colo, minha pequena chorava enquanto Clara tentava por o bico em sua boca, ele parecia desesperado ao ouvir o chorinho dela, e eu me desesperei em ver que ela estava em seus braços, não olhei para os lados ao atravessar a rua, apenas corri em direção minha filha, não obtendo sucesso em alcançá-la. Um barulho ensurdecedor fez minha cabeça latejar, tentei abrir os olhos, mas não demorou para a imensidão preta tomar conta de minha visão.   

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