"Capítulo VIII"Eleonor

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O sufocante calor deu lugar a uma agradável fresquidão e das alturas circundantes uma brisa ligeira soprava perfumes balsâmicos e vivificantes. Está calma e serena beleza da natureza formava um lúgubre contraste como interior de uma grande sala, sombria e abobadada, cujas paredes de pedra transitavam umidade: era a prisão da cidade. Pelas estreitas seteiras gradeadas que lhe serviam de janela, nenhum raio de sol conseguia penetrar e somente uma penumbra descolorida iluminava fracamente os seres desventurados que ali estavam encarcerados. Sobre um dos montes de palha atirados a esmo nos ladrilhos de pedra, estendia-se uma Jovem mulher, visivelmente desfalecida, agonizante; mechas de cabelos loiros emolduravam-lhe o rosto desfigurado pelo sofrimento e inundado de suor gelado; tiras de linho ensanguentadas enrolavam-lhe as pernas, evidentemente quebradas pela tortura, porque o menor movimento arrancava da desafortunada, um gemido que nada tinha de humano. Ajoelhada a seus pés e recitando com voz entrecortada de soluços a prece dos moribundos, postava-se uma moça de beleza deslumbrante, ainda que alterada agora por uma expressão de intolerável sofrimento e de profundo desespero. Alta e esbelta ela podia ter dezessete ou dezoito anos; sua blusa de cambraia e saia curta de um tecido cinzento deixavam adivinhar suas formas admiráveis; os traços do semblante eram de grande delicadeza, da regularidade clássica; e os cabelos de um louro dourado, que pendiam em desordem, envolviam-na como um véu, esparramando até pelos ladrilhos suas madeixas sedosas duma incrível opulência. Ela também certamente fora submetida à tortura, porque suas pernas e seus braços nus estavam cobertos de manchas sanguinolentas e de queimaduras; apertando convulsivamente contra o peito suas pequenas mãos juntas, ela orava à meia-voz, inclinando-se ansiosamente sobre a moribunda, cada vez que esta fazia um movimento. Subitamente a moça desmaiada reabriu os olhos e seu olhar apagado se voltou para a rapariga com uma indefinível expressão de amor e de sofrimento.

— Oh! Eleanor, Eleanor, se você pudesse morrer antes do amanhecer! Murmurou ela. A estas palavras a moça estremeceu e com um surdo gemido enlaçou a pobre menina; mas sob a dor atroz que lhe causou este brusco abraço, um grito lancinante escapou dos lábios da moribunda, um arrepio espasmódico sacudiu -lhe todo o corpo; depois, de repente, a cabeça pendeu inerte, os olhos desmesuradamente abertos tornaram-se vítreos, os membros se enrijeceram. A morte, mais misericordiosa do que os homens, viera e com sua doce mão puseram fim aos sofrimentos da infortunada. Eleonor se arrojaram bruscamente para trás, ao grito desferido pela jovem; mas, vendo que não tinha diante de si mais do que um cadáver, tomou-se dum acesso de louco desespero. Com gritos, imprecações, torrentes de lágrimas, ela entrava em desespero, batia no peito, abraçava a morta, cobrindo-a de beijos, dando-lhe os nomes mais ternos; porém esta super-excitação extinguiu-se tão pronto como veio. Vencida pela dor moral e pelo insuportável sofrimento físico que seus movimentos desordenados ocasionaram a seu corpo torturado, prostrou-se na palha e ficou agachada, encostando-se à parede numa triste apatia. Nesta imobilidade, com o rosto lívido e decomposto, os olhos fechados, acreditar-se-ia que a moça estava morta, ou pelo menos desmaiada. Não era nada disso, todavia; um torpor mudo e gélido imobilizou unicamente seus membros; o cérebro dolorido continuava a trabalhar e era a sua própria vida que a pobre Eleonor revivia. Ela se revia menina, descuidada e feliz, na casa tão limpa e tão confortável de seu pai, que ocupava na jurisdição dos mercadores o cargo modesto de escrevente. Ela jamais conhecera sua mãe; mas a tia Tricci, irmã de seu pai, educara-a com os desvelos de mãe, estragando-a com mimos e cumulando-a de ternura. E entre essa doce criatura e o pai que a adorava, Eleonora crescera bela e inocente, como uma flor que quase abre ao sol. Estávamos quietas num dos cantos dos corredores fétidos da prisão, aguardávamos a saída dos guardas, logo sairiam para se embebedar durante a noite, sabíamos onde ela estava, era só esperar... Quando vimos o último sair, entramos pelos fundos, num buraco que fora feito por nossos ajudantes, pessoas que compartilhavam com os nossos resgates. Fui direto a cela de Eleonor, a encontramos em choque, demos água para ela e a ajudamos a caminhar até a saída daquele inferno sub-humano que os detentores do poder esvaziava mentes e corações de homens e mulheres, se eram ou não bruxas, não havia investigação, apenas a sentença de morte. No outro dia, quando Tengia entrou no quarto de Eleonor, a encontrou dormindo, não fez barulho, apenas foi se certificar estar tudo bem. Estava saindo quando uma voz fina e fraca...

— Por favor, não se vá; Tengia se virou e viu aquele olhar, aquela pena flor tentando dar vida ao corpo, sentou-se na cama.

— Onde estou, quem é você? Tengia viu de tudo, estava acostumada com os quadros das atrocidades das moças que resgatam, muitas ficam deformadas, aleijadas, e teve algumas que nunca mais viram o sol, ou alguma luz, mutiladas no corpo e na alma. Ela foi devagarinho até onde ela estava e sentou-se na beira da cama dizendo:

— Somos um grupo de mulheres que lutamos para salvar vidas como a sua, tentamos tirar daquela cadeia e de outras dos arredores, mulheres que passam o inferno nas masmorras da Santa Inquisição, você pode ficar tranquila aqui todo inferno acabou. A moça com um lugar assustado pegou a mão de Tengia para beijar, esta retirou rapidamente|:

— Não faça isso, fazemos por amor por respeito a vida, não tem o que agradecer, qual é o seu nome?

— Me chamo Eleonor, fui sentenciada a morte, minha companheira de cela não aguentou os ferimentos e morreu era só uma menina de 14 anos, mas preferiu morrer pedia aos céus pela morte foi brutalmente ferida.

— Aqui encontrará trabalho, e poderá se dedicar a algo para ficar bem, vamos precisar de você.

— Um dia quero contar para vocês como fui para naquele lugar, por hora quero descansar. Deitou-se novamente e adormeceu, Tengia puxou a coberta e fez um carinho no rosto da jovem e saiu em direção ao grande salão. Zenit, estava com Sarah, escolhendo algumas roupas, quando Tengia entrou, às duas olharam ao mesmo tempo, para a porta. Zenit sentou-se e com o olhar baixo quis saber da moça que dera entrada na noite anterior e a amiga contou apenas o pouco que conversou com a novata, permaneceram conversando por algum tempo, até que Sarah falou:

— Zenit, não quero ser intrometida, mas ela sera uma monitora, pois estamos com falta, chegaram algumas meninas que estão com monitoras com trabalho dobrado. O trabalho vai ajudá-la a esquecer tudo...

— Sim, Sarah, você tem razão, mas vamos dar um tempo para ela até que ela sinta que está pronta.

— Tengia, queria que você se encarregasse dela se quiser levá-la para a floresta esteja à vontade.

— Zenit, Vou levá-la sim, e volto até o fim de semana com ela hoje pôde sair, deixei Zorá com Haras, mas não posso me ausentar sempre. Haras estava com cinco anos e ainda necessitava da presença dela, mas ela por vezes saía, não saiu da sociedade. Logo mais Haras entraria para a sociedade, e Tengia poderia voltar a ativar definitivamente.

Dama da NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora