Inconfesso desejo

Vinte e sete

- Gustavo, me deixa levantar. - Késia protestou. Já amanhecera, provavelmente já passava do meio dia. Não consegui dormir um só minuto. Observei-a dormir, com o braço envolto em sua cintura.
- Fica aí, porra. - Pedi, com a voz rouca.
- Tô com fome. - Késia forçou meu braço pra cima e virou-se ficando de frente pra mim. - Você estava chorando?
- Tá tão na cara assim? - Perguntei, dando de ombros.
- Seu rosto está inchado, suas olheiras estão mais nítidas do que as de um panda.
- Não consegui dormir. - Admiti. Késia não respondeu, ela abraçou meu corpo, deitando minha cabeça em seus peitos.
- Vai ficar tudo bem.
- Ela estragou tudo.
- Shhh. Esquece ela. - Pediu, fazendo-me cafuné. Minhas lágrimas simplesmente rolavam. Ficamos em silêncio por um bom tempo, mas Késia estava mesmo com fome, seu estômago não parava de roncar.
- Vou preparar uma vitamina pra você.
- Você é a visita, fica aqui que eu preparo. - Disse, limpando as lágrimas em meu rosto.
- Késia, minha vitamina é dos deuses. Vem, escova essa boca e vem me ajudar.
- Abusado! - Reclamou exasperada.
- Querida, só não te beijei ainda porque o bafo tá demais. - Brinquei, recebendo um tapa ardido no braço. - Ai! - Passei a mão onde ela havia batido.
- Você é ridículo. - Revirou os olhos; fomos para o banheiro juntos. Escovamos os dentes e lavamos o rosto.
- Você fica linda com essa cara amassada. - Comentei sincero.
- Mas tenho bafo. - Respondeu irônica, indo na direção da cozinha. Quando fui guardar minhas coisas de volta na mochila, meu celular caiu no chão. Ao pegar, passei o dedo na tela, vendo as notificações. Várias chamadas perdidas e milhares de mensagem no whatsapp. Desliguei o aparelho e fui para cozinha.

MARIA EDUARDA NARRANDO:

- Você bateu nela! - Discutíamos há quase uma hora. Caleu estava inconformado com a briga que tive com Maya. Estávamos em sua casa, fora lá que Maya lhe contou toda a história. Após Gustavo ir embora e a casa cair para Maya, não havia mais clima para continuarmos acampando.
- Se você continuar defendendo sua irmã eu vou embora e não volto mais! - Disse, ríspida. - Estou exausta, Caleu. Maya errou. Fim.
- Mas não era motivo pra sair no tapa com ela!
- TCHAU! - Dei-lhe as costas, pegando minhas chaves. Quando eu já alcançava a porta, Caleu segurou meu braço.
- Tá! Desculpa. - Pediu, um pouco mais calmo. - É só que... Porra, amor. É minha irmã.
- Eu basicamente limpei as fraldas do Gustavo! Ele é como se fosse meu irmão também. - Menti, afinal meu extinto protetor com o Gustavo é por amá-lo. - Maya errou feio, Caleu.
- Eu sei. - Admitiu, me soltando. - Fica comigo hoje. Depois eu converso com ela.
- Eu bem que queria, amor. Mas ela precisa de você. Minha presença aqui só vai deixar o clima tenso. - Caleu sorriu cúmplice, pegando em minha mão para poder beijá-la.
- Você é um anjo em minha vida. - Puxei minha mão de volta e o abracei. Caleu aproveitou para selar meus lábios brevemente. - Amo você. - Sussurrou com a testa colada na minha.
- Também amo você. - Nos despedimos com um beijo e ele me levou até meu carro, onde dei partida em direção à casa do Gustavo.
- Vocês não foram acampar? - Perguntou-me a mãe do Gustavo.
- Sim. - Respondi hesitante. Ele não fora pra casa? - Mas voltamos antes do previsto. Obrigada, tia. - Beijei sua bochecha e rapidamente dei-lhe as costas, dando o assunto por encerrado. Entrei em meu carro, mas não dei partida. Tentei ligar para Gustavo, mas seu celular encontrava-se desligado. Manuella e Ricardo eram os únicos que provavelmente teriam seu paradeiro, mas eu não tinha o número de telefone deles. Derrotada, bati a cabeça no volante, em seguida dirigi pra casa.

Talvez fora melhor assim. Provavelmente Gustavo se recusaria a falar comigo, e mesmo depois de ter conversado com Manuella, eu não teria coragem de abrir meu coração pra ele.

Uma vez me disseram que no plano espiritual, quando estamos desencarnados, nós planejamos o nosso encarne na terra. Quando morremos, fazemos um tratamento para nossa evolução espiritual, sendo assim, antes da reencarnação já temos uma missão à ser cumprida. No plano espiritual as almas se encontram e podem planejar uma vida na terra juntas. Isso explica quando vemos alguém pela primeira vez e temos a sensação de já conhecer a pessoa.