"Eu estou com medo de viver, mas eu estou com medo de morrer
E se a vida é dor, então eu enterrei a minha há muito tempo atrás."
Os dias foram se tornando mais cumpridos. O tempo foi perdendo sua cor, sua magia, sua alegria, e esperança. Não havia um dia sequer que o céu não se despedaçou, junto comigo em lágrimas. Ele permanecia negro, nublado, perigoso, assim como eu. O primeiro momento em que li aquela carta de despedida, senti o chão sumir. Minhas forças escapando. Depois, eu corri com todas as minhas forças tentando vê-la pela última vez. Ainda pude ver seu rosto colado no vidro, onde podia ver as lágrimas banhando sua pele branca, seu peito subir e descer fortemente. Eu podia sentir a sua dor, porque ela também era minha.
Eu corri até não conseguir mais permanecer em pé. Quando a primeira lágrima desceu pelo meu rosto, eu senti a primeira lágrima sendo derramada pelo céu. A partir daí, pelos próximos sessenta dias, todos os dias, o mundo estava alagado em dor.
O que antes era dor se transformou em magoa, e depois em ódio. Eu a odiei com cada fibra do meu corpo. Voltar à cabana era reviver nitidamente nossa noite. Lembrar-me do teu rosto tímido. Lembrar-me da sua pele nua, refletida pelas chamas da lareira. Lembrar-me dos teus sussurros e gemidos. Lembrar-me do nosso encaixe perfeito, da nossa sincronia, dos nossos corpos ecoando sua própria melodia. Lembrar, agora não era mais uma coisa doce, e sim algo amargo, que fere, machuca, que mata aos poucos.
Deus! O teu cheiro ficou vivo em cada cantinho daquele lugar. A tua marca manchada nos lençóis, em minha pele, em meu coração, na minha alma. Analisei por horas aquele lugar, guardei em minha memória tudo, toda a nossa entrega, toda a nossa história de amor. Mesmo que ela tenha sido vivida em apenas algumas horas.
E eu a esperei, por semanas, meses, anos. A esperei por cada nova estação, a cada feriado ou ligação. Até que um dia eu me levantei da sacada e entrei, sem nunca mais olhar para trás. O teu cheiro ainda estava em cada corpo que passava por mim, tua risada ainda era minha melodia preferida, ela ainda era minha única mulher. Não havia corpos que saciassem a falta do seu amor. Não havia paixões que vencessem esse amor.
Então um dia, eu resolvi sentar-me naquela mesma sacada que a esperava por todos os dias. A chuva caía forte lá fora. Naquela noite meu peito estava apertado, angustiado. E não importava o frio que estava, nada me fazia levantar e parar de olhar para a estrada. Era como se eu esperasse algo, alguém.
O sono foi me tomando aos poucos, mas antes que meus olhos se fechassem completamente, eu vi uma mulher cambaleando pela estrada. Corri em sua direção e ela caiu em meus braços. Ela estava completamente machucada e muito gelada. Peguei-a em meu colo, e a levei para dentro.
- O que aconteceu? Quem é ela, Declan?- ouço a voz do mestre Quon, assim que a coloco deitada no sofá.
- Pegue alguns cobertores, ela está muito fria.- falo.
Ele sai e volta em segundos com os cobertores.
- Então? – ele pergunta.
- Estava sentado na sacada, quando a vi cambaleando pela estrada. Não a reconheço de lugar nenhum. - respondo olhando para o rosto da mulher.
Ela começa a se agitar, e gemer de dor.
- Car...
Ela balbucia alguma coisa, mas não compreendemos.
- Carlee. – ela chama.
Ao ouvir esse nome meu corpo congela, e meu coração que antes adormecido reacorda.
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Marcada pelas Chamas
Roman d'amourFoi através da dor que ela cresceu. Foi após as cinzas que ela nasceu. Suas noites eram atormentadas por pesadelos e lembranças que ela desejava apagar da memória. Para Carlee, o impossível torna-se possível a cada amanhecer. Tudo em que ela acredi...