Quem Precisa de Palavras?

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  Era demais para absorver. Quer dizer, era claro que o fato de ela não falar não era por simples "capricho", era óbvio que havia um motivo. Mas nunca, que eu imaginava que era tão sério.
  Quem em sã consciência pensaria em fazer mal para alguém tão inocente? Quem teria coragem de causar tamanha dor em uma menina tão doce? Como alguém pode ser capaz de trair a confiança da própria família que se formou?
  Agora era claro pra mim o porquê de às vezes ela acordar no meio da noite aos gritos. Agora fazia sentido o porquê de ela se sentir tão desconfortável toda vez que eu ou o Noah chegávamos perto dela.

  Annie estava calada com o fone de ouvido já a cerca de duas horas quando o ônibus parou.

  Aparentemente a estrada havia sido fechada pelas próximas sete horas, e não haveria como chegarmos ao acampamento tão cedo.
  Poderíamos ter voltado e desistido dessa viagem sem sentido? Poderíamos. Voltamos? Claro que não. O diretor mandou que o motorista parasse no hotel mais próximo (e mais barato) para que passássemos a noite e pudéssemos retomar à viagem assim que amanhecesse.
  Assim que eu e Mia (e digo isso com o máximo de inocência possível) encontratos nosso quarto, fui tomar um banho e ela "sinalizou" que ia dar uma volta do lado de fora.
 
  Eu estava morrendo de medo de começar a agir diferente com ela e acabar entregando Annie por causa disso, mas também não queria ser o tipo de ser humano desprezível que descobre uma coisa dessas e fica estagnado no mesmo lugar sem ao menos tentar fazer algo.
  Saí do banheiro decidido a tentar ajudá-la de alguma forma, mas Mia ainda não havia voltado do seu "passeio" pelo o hotel. Então fui para a espécie de varanda que havia anexada ao quarto para esperar Mia voltar.

  Foi quando vi Annie e Mia conversando no gramado do pátio.

  Na verdade, por uns cinco minutos, apenas quem falou foi Annie. Ela possuía uma postura de quem pede desculpas e uma expressão quase de choro. No instante em que ela se calou, e Mia teve uma espécie de ataque de raiva, soube do que se tratava a conversa. Annie havia revelado que me contara sobre o "assunto proibido".
  Qualquer um poderia dizer que Mia estava a ponto de surtar de vez até que ela olhou pra trás e me viu. De alguma forma, sua expressão se suavizou e eu pude notar, antes que ela se virasse novamente para falar com Annie, que ela se deu conta de que eu não era o tipo de cara que a julgaria ou a olharia diferente por seu passado. Fosse ele qual fosse.
  Pude ver quando elas "fizeram as pazes" e ambas se despediram.
 
  Alguns minutos depois, Mia entrou no quarto. Ela estava hesitante e mal olhava nos meus olhos até que eu abri a boca.
  - Olha, - comecei - saber... O que eu sei, não muda em nada.
  Parei diante dela apenas a uma distância que não pudesse a deixar desconfortável e continuei:
  - Quer dizer, sabemos que eu vou continuar sendo seu manequim para desenhos, e você vai continuar sem falar comigo. Então... Não precisa se preocupar. Mesmo.
  Vi um sorriso nascer em seu rosto e senti uma enorme vontade de a abraçar crescer em meu peito.
  Mas agora eu já não sabia mais se devia. Tinha medo de que isso pudesse afugentá-la e ela se afastasse de mim.

  Então o mais inesperado aconteceu.

  Mia rompeu o espaço entre nós e me abraçou enterrando seu rosto em meu peito. Um abraço apertado como quem pede consolo e conforto.
  Assim que a enlacei com meus braços pude sentir suas lágrimas molharem minha camisa e, aos poucos, pude sentir a tensão em seus ombros se dissolver em meio àquele abraço.

Sem Palavras Me ConquistouOnde histórias criam vida. Descubra agora