Amante Improvável (DEGUSTAÇÃO)

Capítulo 2

Solto um suspiro longo, sentindo o peso da solidão me consumir.

Estou em casa, jantando sozinho. O lugar dela está vazio, porque Lívia está no hospital, fazendo companhia ao meu irmão. Há uma semana ocorreu o terrível acidente de Alfredo, e, desde então, minha mulher vem se revezando com minha mãe, Karlita — nossa governanta — e Bernardo, o melhor amigo dele, para lhe fazer companhia. Alfredo continua em coma, com poucas melhoras, e, apesar do seu estado, segue roubando a atenção de Lívia; como sempre.

Há uma semana ela está distante, se desdobrando entre casa, hospital e trabalho. O cansaço é aparente em seus traços bonitos e nos olhos castanhos encantadores, mas Lívia se mantém obstinada e com forças, encontrando tempo e ânimo para cuidar de Enzo, da nossa casa e da sua vida profissional. Só a mim ela parece ter se esquecido.

Deixo o prato vazio sobre a mesa e me retiro da cozinha. Não estou cansado, mas tentarei dormir. Se Enzo ao menos estivesse aqui poderíamos assistir a alguns filmes ou jogar videogame, mas ele está na casa dos avós, os pais de Lívia. Apesar de eu ser plenamente capaz de cuidar do meu próprio filho em sua ausência, Lívia preferiu deixar Enzo com os pais, um pouco porque já tem um tempo desde a última vez em que estiveram com o neto, muito porque ela me disse que eu preciso de um tempo sozinho pra descansar.

Mas eu não quero estar sozinho. Eu quero estar com ela. Mas ela agora está com meu irmão.

Deito-me sem nem tirar a roupa do dia; encaro o teto acima de mim, ouvindo meus batimentos cardíacos, tentando não me sentir magoado e chateado com a ausência dela por causa de Alfredo. Mas é cada vez mais difícil me segurar para não me enfurecer com essa situação. Depois de tantas idas e vindas em nossa relação, finalmente no último ano estávamos nos entendendo. Não era nenhum relacionamento perfeito nem um mar de rosas. No entanto, Lívia estava se esforçando mais do que nas últimas vezes, e eu pensei estar conseguindo, por fim, entrar novamente no seu coração; reconquistá-la.

Mas então Alfredo invadiu nossas vidas mais uma vez, atrapalhando nossa relação a dois, embora não propositalmente, como da primeira vez. Proposital ou não, ele tem o poder de ficar entre nós, e Lívia sempre acaba lhe dando mais atenção. E isso me deixa em um estado de irritação impossível de ser explicado. Eu deveria agora estar preocupado com sua saúde, com seu estado delicado, torcendo por sua recuperação, mas só consigo sentir raiva e ódio, me perguntando como, mesmo à beira da morte, meu irmão consegue exercer sua influência em Lívia.

Dói-me de uma maneira insana ponderar que ela ainda o ama.

Encolerizado, levanto-me outra vez, pego as chaves do carro e vou até o hospital. Durante o percurso, tento ensaiar minhas palavras; quero dar um basta nessa situação sem parecer um maldito insensível sem coração. Isso não pode mais continuar assim. Lívia não pode mais continuar lhe dando total e completa atenção, chorando pelos cantos, temendo por sua vida, ligando o tempo todo para o hospital para saber dele, enquanto eu, o homem com quem ela vive e dorme sob o mesmo teto, na mesma cama, fico esquecido.

Consigo uma autorização para subir ao quarto de UTI de Alfredo apenas para falar com Lívia. Uma das enfermeiras me acompanha até lá, depois me deixa sozinho, dizendo-me antes que não posso ficar no andar nem no quarto dele por mais de cinco minutos. Respiro fundo frente à porta do quarto dele antes de qualquer decisão. Penso em virar nos calcanhares, engolir minhas palavras e esperar tudo isso passar. Mas, quando penso melhor, vejo que isso tudo vai demorar a passar. Mesmo se Alfredo despertar do coma, ainda teremos de lhe dar a notícia da morte de sua esposa e filha, e eu sei, isso o deixará num estado catatônico, em choque. E, se vir a precisar, Lívia continuará ao seu lado, dando todo seu apoio. A raiva e o ciúme sobem pelas minhas entranhas e se formam na minha garganta, dando-me um gosto amargo.