Capítulo VI

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O espanto e o choque se estamparam em sua face, que se tornou ainda mais pálida à luz fraca das chamas distantes, que iluminavam o local. Seus grandes olhos negros se alargaram em reconhecimento e ela levou ambas as mãos até seu coração, que certamente batia acelerado com tamanho susto. Como consequência, deixou cair à seus pés o que segurava e em um instante a expressão em seu rosto se converteu para uma careta de dor.

Ric não precisava baixar seu olhar para saber que fora a pá que a atingira. Ela tentou se afastar, mas cambaleou e caiu com a tentativa.

- Oh meu Deus! Estás bem? - Ele largou sua pá e deu um passo em sua direção.

- Não se aproxime! - Ela ordenou, apesar de sua voz parecer bem mais chorosa e assustada, do que intimidadora.

Ela segurava uma parte de seu pé e tentava se levantar. Ric queria ajudá-la, porque ela claramente estava precisando e porque aquilo era sua culpa. Sabia que se não fizesse algo imediatamente, a situação se tornaria ainda mais desastrosa. Respirou fundo e correu para ela.

Ele a tomou em seus braços, impedindo-a de cair novamente, então seus olhos se encontraram. Aquele momento... Uma sensação de deja vu invadiu Ric: ele já não havia vivido aquilo antes?

- Solte-me! - Ele estava distraído demais para perceber o empurrão quando ele veio.

Ric perdeu seu equilíbrio, quando foi jogado para longe. Suas costas bateram contra a terra fofa do túmulo, levantando uma poeira fina à sua volta. Sentou-se indignado, pronto para dizer umas verdades à senhorita mal agradecida, mas não pôde deixar de sorrir, ao notá-la caída ao seu lado. Porém, seu sorriso foi morrendo aos poucos, ao reparar o olhar de pura cólera que ela lhe lançava.

Nunca antes uma moça o olhara assim, principalmente esta, que sempre o fitava assustada e temerosa. Essa novidade não parecia ser boa, nem tão pouco agradável. O que ele estava perdendo ali?

- Tu não sabes receber uma ajuda simples, sem retribuir com tapas e empurrões? - As palavras saíram sem que se desse conta.

- Mas não pedi-lhe ajuda alguma! - O controle que ela parecia tanto querer manter, estava abandonando-a. Seu tom agora era hostil, mesmo com sua postura hesitante.

- Não carecias de pedir, pude ver sozinho! Fui ensinado a ser um cavalheiro, que ajuda uma dama que esteja a precisar..

Ela fez uma tentativa de levantar-se, mas ao apoiar o peso no pé atingido, voltou a desabar com um semblante de dor.

- Deixe-me ver isto, por favor! - Pediu Ric, preocupado de repente, estendendo a mão.

Subitamente assustada, afastou-se, se esquivando do toque.

A expressão no rosto de Ric se fechou. Um olhar impassível tomou forma. Em sua mente chegavam os momentos semelhantes a este e em todos, ela se mostrava perturbada por sua culpa.

Ela o via como uma ameaça? Como se fosse machucá-la? Fazer-lhe algum mal? Em que momento teria deixado passar essa mensagem? Não recordava nenhum... ao contrário! Fora sempre disposto a ajudar-lhe. Como ela chegara a essas conclusões?

Sem nem mesmo olhá-lo, ela pegou a pá, no chão ali perto e a usou como apoio, içando-se para cima. Usando o instrumento como bengala, tentou dar alguns passos dificultosos.

- Ao amanhecer! - Ric anunciou em voz alta, como se ela já tivesse alcançado grande distância.

Provavelmente confusa com essa frase desconexa, ela olhou sobre o ombro, buscando entender o que ele quis dizer.

A Emissária da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora