Mentiras & Negócios

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O mais novo dos irmãos parecia um pouco mais velho do que realmente era. Com apenas dezesseis, aparentando vinte e poucos, se perdeu nos becos de uma cidade qual o nome ninguém sabia.

     Essa foi a quarta vez que ele deixou seu irmão numa estação de trem, mas foi a primeira em que não soube o que fazer.

    Ele era um forasteiro num mundo de ladrões e negociadores de sequestros, onde qualquer um faz um escarcéu quando gente nova, aparentando não parecer tão nova assim, se perde por aquelas bandas.

    As ruas pareciam todas iguais, as casas estão sujas nos mesmos lugares e sob a tinta ainda há a mesma cor. Os únicos caminhos diferentes eram os túneis velhos onde deveriam passar grandes tubos de concreto que levaria o esgoto da cidade até o esgoto da cidade vizinha. Esses permanecem vazios mas já são tão mal cheirosos que ninguém negaria caso o prefeito dissesse, numa das entrevistas à imprensa, que foram usados um dia.

    O garoto, vestido em seus vinte e poucos anos, fingia estar esperando alguém quando percebia alguma pessoa o bisbilhotando. Com o relógio de bolso encontrado na calça de Jack virado para a lua, produzindo uma luz tênue e prateada, ele parecia um homem de negócios que desceu na estação errada.

    O mais jovem dos irmãos nunca havia entrando num trem, ele preferia pegar uma carona com mercadores ou qualquer um que tivesse um carro que fosse menor que os trens. Coisas grandes levam à lugares grandes: e é isso que acontece quando se pega um trem.

    Sua única arma é um pequeno canivete — também é uma tesoura, um abridor de latas e lixa de unhas. Não que ele precise de uma, até então nada de mais havia lhe acontecido. Quando se trata do mais jovem, é mais fácil temer à atacar. Não que ele vá revidar caso você o ataque, mas, como parece um homem de negócios, não seria estranho se homens correrem atrás de você à qualquer momento. Então todos fingiam não querer atacá-lo e, simplesmente, seguiam seu caminho para lugar algum.

    Um dia, quando se escondia de uma amontoado de homens esquisitos na pensão Jordana, lhe perguntaram qual seu nome. Baixinho, mal acostumado a dizer qualquer coisa, ele mastigou e cuspiu: Evan. Todos acreditaram, ninguém pediu um documento que pudesse lhes dizer o contrário e se pedissem talvez passassem a acreditar um pouco mais.

    O mais novo Evan é a máquina de detectar mentiras mais confiável que alguém poderia ter, e a mais mentirosa já fabricada. Toda a sua verdade sai. No entanto, sequer a respiração que você ouve de volta é verdadeira. Esse é o dom do novo Evan, ele talvez nem saiba.

     A pensão Jordana só foi seu lar por sete horas. Quando seu corpo descansou por completo, o garoto pulou uma janela, deixando para trás somente um bilhete: eu não sou Evan.

    A polícia fora acionada, a vizinhança passou a saber do ocorrido e o confundiram com um dos traficantes de órgãos que vagavam a cidade. Descreveram seu rosto, seus gestos e disseram toda a mentira que ouviram. Evan estava tão longe quando o sol está da Terra, enlatado num carro marrom-areia, ao lado de um senhor, falsamente cabeludo, chamado: Evan.

    O Evan mais velho não parecia em nada com o Evan mais novo, exceto quando uma verdade era dita sem querer e ambos precisavam se entreolhar para saber o que o outro fará com essa informação.

    O Evan mais velho sempre desistia primeiro. "O que um garoto como ele pode fazer?" dizia a si mesmo.

    O Evan mais velho era burro, o Evan mais jovem, não: essa é a maior diferença entre os dois.

Enquanto Formos Jack (Raison D'être)Onde histórias criam vida. Descubra agora