Luanda, aos 14 de Fevereiro de 2016.
-É dia de São Valentim, uma data essencialmente dedicada aos namorados, como é fácil notar nos programas televisivos, nas rádios, em redes sociais, em todo lugar, mas não o é para mim, primeiro porque sou um sujeito do 'contra', daqueles que vive chocando com o senso comum, segundo, porque não existe no hoje em dia alguém que se tenha encantado com meus lindos olhos 'azuis', terceiro, porque a data simboliza o quarto aniversário do acontecimento que gerou a tua existência, meu amigo (diário).
-Hoje, acredites ou não, eu acordei com a disposição no topo, não houve em mim um único laivo de tristeza, muito pelo contrário, ao acordar, a saudação da praxe aos familiares foi mais audível, vi minha alma sorrir deliciada ao ouvir 'Cio' de André Mingas, e o coração, bom, esse manteve-se intacto e empoeirado, como é comum. Até aqui, tudo muito normal, mas como se sabe, normal em Angola, só mesmo as doenças, porque a verdade é que a minha frieza é meramente aparente e bem mais quente do que eu mesmo gostaria de admitir, não será por acaso que independentemente da forma que acorde, já saiba de antemão que num algures qualquer de cada dia 14, as perguntas serão as mesmas.
-Sei que vou perguntar o que tinha ele que eu não tive, se foi o toque mais atrevido que por respeito não experimentei, o beijo que não dei, o mistério que não criei em torno dos meus sentimentos, a indiferença que não simulei para prender o seu interesse em mim, sei que vou lembrar das piadas e sorrir delas, ao menos até ser repudiado pelo meu orgulho, sei que vou me perguntar por que razão não existe em meu coração partido uma único caco disposto a cortá-la da história da minha sensibilidade, sei que vou perguntar ao meu destino se por acaso a ideia de encontrá-la consistia simples e tão somente em perder um amigo e ganhar uma poesia embebida em mágoas, e sei que no final do dia me irei inevitavelmente perguntar se por acaso te tenho em minha vida há precisamente quatro anos (diário), pelo simples facto de adorar escrever, ou por acreditar lá bem no fundo, que apesar da mágoa e o rancor, a moça em questão acaba por simbolizar o grande amor...da minha vida!
-Eu, acredito que a vida é uma colectânea mais longa ou mais curta de momentos, de acordo à sorte de cada um, que inevitavelmente nos levam para a morte, aliás, se existe nessa vida alguma coisa de que estou inteiramente certo, é da morte, todos vamos nascer, e alguns não terão sequer a chance de crescer, reproduzir, como é normal acontecer, mas vão certamente morrer, enfim, esquecendo um pouco esse paleio de morte, falemos da vida, essa moça linda que todos criticam mas que os poucos que tentam deixar de livre e espontânea vontade são apelidados de loucos, sem mais delongas, o que eu pretendo saber é só:
-Como definir dentre os bilhões de seres com que cruzamos durante a existência nesse mundo aquele que é o nosso grande amor?
-Será pelo tempo de convivência, será pelas lembranças, será pelos horrores que a presença da pessoa em nossa vida nos faça experimentar, será, hoje num mundo cada vez mais capitalista, pelo número de presentes que restarem da relação quando nossos corpos já estiverem ausentes do calor um do outro, sinceramente, eu não sei nada acerca, não será por acaso que há algumas páginas tenha definido o amor como o sentimento mais falado e ainda assim mais incompreendido de sempre, porém, conheço alguém que talvez saiba o fazer melhor que eu.
-O nome dela é Joana Marisa Pereira De Almeida, uma indubitável cidadã do amor, juro pelos meus chifres que não conheço ninguém que tenha vivido esse sentimento mais intensamente que ela, logo, só ela para nos fazer compreender esse tal de amor de toda uma vida.
-A história amorosa de Marisa começa aos 17 anos, com Paulo Jorge, um tipo alto, moreno, praticante de basquetebol, aparentemente inteligente e com uma certa queda para arte (fazia uns raps que nunca tiveram sucesso). Como todo amor adolescente, ele foi muito mais expressado física do que sentimentalmente, razão pela qual passados poucos meses envolta no frenesim hormonal que lhe causava o seu primeiro amor, Marisa descobriu que estava grávida pela primeira vez.
-Marisa resolveu então assumir uma gravidez de gémeos, abdicar da sua linda barriga, por uma com cicatrizes que nunca mais à permitiriam desfrutar como deve ser duma ida à praia, quando à semelhança das raparigas do seu tempo bem podia ter optado por uma 'solução'que o executivo proibiu no hoje em dia (aborto), mas a linda barriga não era a única coisa que Marisa perderia, pois pouco tempo antes do nascimento dos gémeos, Marisa perdeu Paulo Jorge, por motivos que quem te escreve acha desnecessário realçar (talvez em fórum mais privado, amigo).
-Como se não bastasse,o destino resolveu tirar de Marisa um dos gémeos poucas semanas após o seu nascimento, mais uma facada na alma, e Marisa vivia assim a história do primeiro amor da sua vida.
-Sobrando apenas um dos gémeos, Marisa acabou descobrindo que por sinal tinha a melhor mãe do mundo, que à aconselhou a não privar-se de evoluir socialmente por conta daquela criança, pois a mesma tinha uma avó que estava disposta a ser mãe (Dona Antónia é uma Santa), e foi o que Marisa fez, deixou de lamber as feridas causadas pelo seu passado recente e existir então para o mundo!
-Passados três anos, Marisa conheceu Carlos, um português residente em Angola há uns bons anos. Carlos era um tipo de baixa estatura, amante de boa música e prazeres de gente culta, carregava já aos trinta e poucos anos um cabelo grisalho que Marisa achava um charme, não dispensava uma boa conversa e...sabia fingir muito bem que gostava do seu filho.
-Como era de esperar, não levou muito tempo até as coisas evoluírem e Marisa, a romântica incurável de sempre, desenhar em Carlos o novo grande amor da sua vida quando tinha já 21 anos de idade, o que ao menos numericamente à tornava mais madura em termos amorosos que aos 17.
-Mas a relação não evoluiu apenas à nível sentimental, Carlos era um empresário que atravessava algumas dificuldades, ao passo que Marisa era uma jovem com um Q.I que lhe fornecia boas e lucrativas ideias, razão pela qual entraram então numa parceria empresarial, que deu tantos frutos, que aos 25 anos de idade, Marisa já tinha em termos financeiros o bastante para viver confortavelmente por largos anos.
-O casal vivia em estado graça, tudo fluía da melhor maneira possível...até ao momento em que Marisa resolveu colocar os negócios sob a gestão do então seu marido e deixar temporariamente Angola no intuito de terminar a sua formação académica.
-Marisa teve uma bela ideia, mas irónico como era o seu destino, resolveu provar que não só males podem vir para bem, o inverso também pode acontecer, e sendo assim, substituiu o "é dessa vez" de Marisa pelo "era uma vez", mostrando assim, que o para sempre não passa de um hoje demasiado emotivo e tagarelas se julgando conhecedor das malambas do amanhã. Marisa descobriu após três anos, numa viagem de férias à Angola que já havia outra mulher a viver em sua casa com Carlos, usando o enxoval que juntou desde a mais tenra idade, e pior, que o seu príncipe encantado também tinha talento para ser Alibabá, o rei dos quarenta ladrões.
-Carlos ficou com tudo o que Marisa amealhou com o seu trabalho árduo, ao passo que Marisa, sem nada mais do que um "se eu soubesse" passando pela sua cabeça cerca de '25' horas por dia, optou por, na minha presença, tentar atirar-se dum prédio, afogar-se em garrafas de whisky, fumar três maços de cigarro diariamente, e perguntar com lágrimas nos olhos à Deus, que final tão feliz era o que lhe reservava para uma existência tão sofrida, e terminava então aos 28 anos de idade, a história do segundo grande amor da sua vida.
-Felizmente o pior nunca chegou a acontecer com Marisa, e sete anos mais tarde, a noutros tempos romântica incurável, conheceu Carlos, um tipo perto da casa dos dois metros( cá entre nós, parece que à semelhança do tipo que escrevia o enredo do seu destino amoroso, ela adorava deambular entre os altos e os baixos), com quem não teve uma história assim tão longa, mas certamente marcante.
-Aos 35 anos de idade, julgando-se já mais madura e vivida, Marisa optou por juntar lógica aos assuntos do coração, e casou-se com Carlos(sim, parece que ela tinha uma fixação com o nome).
-Carlos era um tipo que não percebia nada de arte, não possuía a altivez na forma de ser e de estar que Marisa esperava do seu homem, não despertava em si apetites carnais, na verdade Carlos só possuía em mãos o sonho de ser seu. Como era de esperar, o casamento acabou por não resultar, uma vez que Carlos não passava dum tipo bom para a sua interpretação e indiferente para o seu coração, mas ainda assim Marisa diz que sempre o verá como um dos grandes amores da sua vida, pois fez o que mais nenhum fez, partiu realizando um sonho seu(casar), quando outros só o fizeram destruindo.
-Hoje, aos 42 anos de idade, já uma senhora vivendo a segunda fase da sua 'mocidade', Marisa está em outras, diz que o tipo que te escreve é o grande amor da sua vida, que nem por sombras olharia para trás com saudades, primeiro por acreditar que não se irá perder no caminho que segue actualmente, segundo por me amar mais do que alguma vez amou qualquer dos tipos de que te falei, terceiro, porque o meu nome é Rui Jorge De ALMEIDA Pais De Oliveira, o seu filho unigénito e consequentemente o homem que mais à ama nesse mundo.
-Em suma, meu amigo, o que eu te quis dizer contando tudo isso é que podemos amar milhares de pessoas durante a nossa passagem pelo mundo, mas que de modo algum conseguiremos quantificar ou comparar dentre as demais quem amamos mais, porque o amor que eu acredito que um dia senti pela jovem que inspirou-me a visitar-te quase que diariamente, que sei que outras tantas pessoas nesse momento sentem umas pelas outras e sei que um dia ainda voltarei a sentir, é algo que não se interpreta nem tampouco se compara, simplesmente sente-se.
"Você pode ter partido meu coração contra a minha vontade, mas só vai continuar a viver nele se eu quiser"
-Abraços chifrudos.