Capítulo 4: Que tentação! - Ana Flor

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Capítulo 4: Que tentação!

Abro a porta, enfeito a casa

Deixo a luz entrar

Eu ainda te espero chegar

Escrevo versos

Rosas e incenso para perfumar

Eu ainda te espero chegar

Estar só é a própria escravidão

Ver você é ver na escuridão

E quando o sol sair

Tudo vai brilhar pra mim

­ANA FLOR

Eu não queria voltar para casa naquela sábado e fiquei com Paola. Sabia que minha mãe estaria lá pronta para brigar comigo, insistir mais uma vez que eu era uma tola e devia voltar para Vítor. Não me deixaria em paz até me convencer. O que ela não sabia era que nada me faria voltar para ele. Ainda mais agora.

Nossos amigos iam se reunir na praia naquele dia, para comemorar informalmente o aniversário de uma colega nossa em uma barraquinha, com direito à peixe e camarão, bebida à vontade e música ao vivo, pois dois amigos levariam violão e tocariam. Era um local onde gostávamos de ficar, em um espaço da praia em frente ao quiosque, sob a sombra de uma árvore gigantesca.

Eu até tinha esquecido daquela reunião, quando Sandra, a nossa amiga aniversariante, ligou para meu celular cobrando:

- Aninha, cadê você e a Paola? O povo todo já está aqui! Você vem, não é?

- Ah, claro! – Falei rápido. – Parabéns, Sandra! Fique tranquila, já estamos chegando.

- Só quero ver!

Me despedi dela e saí correndo para contar a Paola. Como não quis voltar em casa, peguei com ela um biquíni de fundo branco com estampas florais e uma saída de praia emprestada. Ao me vestir, disse a ela:

- Paola, eu to quase nua! Esse biquíni não cobre nada!

- Melhor do que aquelas coisas horríveis de velha que você usa, que mais parece uma sunga. – Ela sorriu, me vendo tentar cobrir os seios com a parte de cima cortininha minúscula. – Você é linda, Ana. Tem que mostrar mesmo!

Vesti a saída de praia branca por cima e saímos às pressas no carro dela. No meio do caminho compramos presentes para Sandra e chegamos à praia pouco depois das onze horas. A farra já tinha começado e várias mesas e cadeiras do quiosque tinham sido ocupadas por nossos amigos, em frente ao posto 9 na praia da Barra. Abraçamos e beijamos Sandra, que estava feliz da vida. Armando e Luís já ensaiavam as primeiras notas no violão. Falamos com todo mundo, rimos, logo estávamos no meio da bagunça.

Eu adorava o mar e fui correndo dar um mergulho. Depois sentei à uma mesa com Paola e mais três colegas, pedi uma cerveja e belisquei uns camarões. Sandra insistiu em pagar sozinha os petiscos, mas as bebidas nós racharíamos.

A praia estava bem cheia, mas aquele espaço ali era só nosso. Nem me preocupei em passar protetor, pois estava o tempo todo na sombra. Paola se levantou quando começaram a tocar rock nacional e foi dançar na areia com alguns de nossos amigos.

Usava um biquíni fio dental preto, seu corpo escultural atraindo todos os olhares. Além disso, era professora de dança e arrasou. Vi vários de nossos amigos babando por ela e sorri, imaginando-a com Vítor. Quem diria. A bela e independente Paola, que deixava um bando de apaixonados para trás, tendo sucumbido a meu ex noivo. Haveria alguma chance para os dois? Depois daquela manhã, me sentia culpada por ter ficado com ele tanto tempo e não ter percebido que minha amiga sentia-se tão atraída, pois ficara claro que era mais do que dissera.

Bem que Vítor podia se tocar da mulher maravilhosa que ela era e me deixar em paz. Todo mundo ficaria feliz.

Foi só pensar nele, que o vi. Primeiro o notei pulando da calçada na areia e a primeira sensação que tive foi de dúvida. Esperava sinceramente que não estivesse ali por minha causa, mas por Paola. Ele seria um grandessíssimo babaca se fizesse isso na frente dela, depois do que havia acontecido entre eles.

Depois meu olhar seguiu para trás dele e meu coração deu um salto fenomenal no peito, até falhar uma atida e acelerar como um louco. João tinha acabado de surgir no meu campo de visão e, parado na beira do calçadão, tirava a blusa azul pela cabeça, segurando-a em uma das mãos e olhando em volta.

Senti a boca se encher de água; admiração, desejo e amor me engolfando como uma onda. Meus olhos beberam sofregamente sua imagem máscula apenas naquela bermuda cinzenta baixa em seu quadril, deslizando pela barriga sarada, o peito musculoso encoberto de pelos escuros, os ombros largos e braços fortes, até o queixo firme com covinha, o maxilar anguloso com sombra de barba e seus traços lindos, parando nos intensos olhos azuis. Fiquei nocauteada. Era a primeira vez que o via sem camisa e não estava preparada para tanta beleza e masculinidade.

Tudo se tornou uma sombra para mim. Ricardo, meu colega que conversava comigo sentado ao meu lado, deixou de existir. Sua voz sumiu. Na praia eu só via João, pulando na areia, vindo até nós com o cenho franzido e o olhar atento. Quando aquele olhar encontrou o meu, senti um baque, como se levasse um soco. Todo meu corpo reagiu, meus sentidos se eriçaram, a adrenalina disparou. Fiquei imobilizada por seu olhar e por tudo que me fazia sentir.

João parou e vi a surpresa em seu rosto. Ficou claro que ele não esperava me ver ali. Franziu o cenho e aquela química que havia entre nós, que nos ligava como uma energia viva, foi tão intensa que tive certeza que, como eu, ele sentiu.

- Hei, Ana! – Ricardo sacudiu meu ombro, movendo-me de meu deslumbramento. – Que foi? Pensei que você e Vítor tivessem terminado.

Naquele momento, Vítor entrou em meu campo de visão, na frente do primo, vindo em minha direção com olhos ansiosos fixos em mim. Respirei fundo, tentei me recuperar, antes que mais alguém percebesse o que acontecia entre mim e João.

- Oi, Ana.

- Oi, Vítor. – Forcei um sorriso, sem saber ao certo como agir. Olhei rapidamente na direção em que Paola estivera dançando. Ela tinha parado e nos fitava, séria. Encontrou meu olhar, deu-me as costas como se não se importasse e continuou a dançar. Tive vontade de falar um palavrão.

- Posso me sentar? – Olhou para Ricardo, como se o convidasse a sair e lhe ceder o lugar ao meu lado. Nunca tinha gostado do meu amigo, dizendo que tinha certeza que ele me paquerava. Naquele momento seu olhar arrogante não adiantou muito. Ricardo acomodou-se melhor e o encarou de volta. – Preciso conversar com a Ana. Pode me dar licença, Ricardo?

- Ana? – O rapaz me fitou, esperando.

Meus olhos passaram dele para Paola, ainda de costas, fingindo mais animação do que eu sabia que era real. Eu podia jurar que estava chateada demais, vendo o cara que transou com ela na noite anterior vir direto a mim sem lhe dedicar um único olhar. Fiquei revoltada com a falta de discernimento de Vítor.

Rapidamente meus olhos foram na direção de João, que tinha sido cercado por três colegas minhas que adoravam paquerar e que faziam de tudo para agradá-lo. Uma delas lhe entregava uma cerveja, a outra se apresentava e a terceira ria como uma hiena, parecendo querer engoli-lo inteiro. João sorriu e disse algo, educado. Minha raiva se completou com o ciúme. Encarei Vítor e disse, séria:

- Não temos o que conversar. Se veio para a festa de Sandra, bem vindo. Mas não podemos falar agora.

- Por que não? – Me olhou, suplicante. Então passou as mãos pelo cabelo e correu os olhos em volta, até parar em Paola. Quando me encarou de novo, disse baixinho: - Não sei o que aconteceu. Eu estava bêbado ontem. Mas nada disso tem a ver com o que sinto por você, Florzinha.

Ricardo acompanhava a conversa, tomando um gole da sua cerveja. Me remexi, incomodada. Mas não desviei o olhar.

- Vítor, nada disso importa para mim. Por favor, podemos conversar em outra hora? Estou aqui para me divertir.

- Como posso me divertir agoniado desse jeito, sem saber se você me perdoa?

- Perdoar de que? Não há o que perdoar. Somos amigos agora. Por que não vai falar com o pessoal, relaxa um pouco?

- Ana, vim falar com você e não saio daqui até fazer isso. – Afirmou, decidido, quase com raiva. Eu suspirei, me sentindo em uma sinuca.

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