CLARKE
Peguei Aden no colo e o dei um beijo demorado sobre a bochecha rósea e farta. Ele riu, aquele riso inocente, capaz de aquecer o coração mais frio existente. O tipo de som que me fazia ter a certeza que meu dia seria ótimo, independente do que acontecesse.
- Sabe por que eu fiz isso? – indaguei para a criança risonha em meus braços e ele apenas negou com a cabeça. Seus cabelos louros caindo sobre seus olhos sonolentos. – Porque uma pessoa que te ama muito pediu para que eu te desse um beijo – revelei baixinho, como se fosse um segredo nosso.
Aden me encarou, intrigado com o fato. Era um menino extremamente esperto para sua idade.
- Você gostou? – perguntei, levando-o para o andar inferior, onde nossos pais preparavam o café da manhã.
- Sim – ele riu mais uma vez – Eu gosto – e com isso dito me deu um beijo.
Naquele exato momento eu sabia que minha mãe estava enganada, nós não salvamos Aden, Aden nós salvou.
– Um beijo pra ela também – falou inocentemente e aquele gesto me fez crer novamente na humanidade. Algo tão puro quanto aquele garotinho não corromperia o mundo.
Eu seria a intermediaria dos beijos?!
- Bom dia, pai – desejei e passei Aden para os braços do homem, enquanto Bear, nosso cachorro, tentava pegar algumas fatias de bacon.
- E para mim? – Abigail indagou.
Rolei os olhos antes de lançá-la um sorriso – Bom dia, Dra. Griffin.
Todos os dias eram parecidos com aquele. Meu pai sentado numa das extremidades da mesa, lendo o jornal, usando seu terno feito sob medida, seus cabelos parcialmente grisalhos bem arrumados. Ele sempre tinha um sorriso e um olhar bondoso para dar, nunca se estressou com nada, independente do que fizéssemos. Ele era nosso mestre budista. Minha mãe, por outro lado, era a preocupação, os horários, tinha uma agenda apertadíssima e, por conta disso, nós também tínhamos, é o tipo de mulher multitarefada; mãe, esposa e médica. Não faço ideia como ela faz tudo, mas ela faz.
- Tenho que ir, ou vou chegar atrasada – enfiei uma última fatia de pão na boca antes de correr porta afora onde Octavia estacionou dois minutos depois.
- Bom dia, bitch – ela arrancou antes que eu tivesse sequer afivelado o cinto. Nunca bateu muito bem da cabeça.
Sorri dos trejeitos da garota – Bom dia, O. – olhei ao redor, vendo que ela realmente tinha feito melhorias no carro – Mal posso esperar para ter meu carro – divaguei e encostei minhas costas contra o banco.
- Não se preocupe, daqui a duas semanas essa cidade se deparará com a maior festa de dezesseis anos e seu pai nunca economizou no seu presente – ela me cutucou, a fim de me animar, e teve sucesso nessa missão. Eu não poderia discordar daquilo, papai e tio Harold nunca me desapontaram.
Chegamos faltando cinco minutos para o início da aula. Os corredores estavam parcialmente vazios, mas meu olhar logo foi capturado pela figura que andava vagarosamente. A mão apoiada na barriga e o rosto encarando o chão, pedi licença para Octavia que divagava sobre as músicas que eu deveria tocar e me aproximei de Alexandra, com um quê de preocupação. Ela não parecia muito bem.
- Você está bem? – perguntei quando estava próximo o suficiente. O que antes eram suspeitas, agora era certeza. Um dos lados do rosto de Lexa estava completamente inchado e ela exibia um corte sobre o lábio, não parecia bem. E então a preocupação se transformou em culpa, talvez meus pais fossem os responsáveis por aquilo, por terem dado às costas para ela dois anos atrás.
- Ótima – respondeu friamente e, se eu não estivesse vendo seu estado, eu compraria aquela história. Alexandra não parecia abalada ou nada do tipo. Sua cara imparcial denunciava que aquele era apenas mais um dia na sua vida, mas eu podia ver o esforço que ela fazia para carregar a mochila.
- Deixe-me ajudá-la – me ofereci e antes que ela tivesse tempo para recusar peguei sua mochila. Dividiríamos aquele turno de qualquer forma, então, por que não?
A garota me olhou pelo canto dos olhos, não me avaliava como das demais vezes que a peguei me encarando, parecia mais um agradecimento.
- Aden mandou um beijo para você – lembrei-me de supetão e sorri com a lembrança, ela também sorriu. Era um lindo sorriso, como imaginei que seria, embora sincero, demorou apenas alguns segundos, logo se esvanecendo. – Você deveria ir a minha casa qualquer dia, dessa forma poderá vê-lo...
Lexa estreitou os olhos, como se esperasse eu dizer que aquilo era uma pegadinha. Era estranho, mas compreensível, o porquê dela sempre estar na defensiva, mas se ela me conhecesse bem mesmo, saberia que eu nunca faria uma brincadeira de tamanho mau gosto.
- O que os seus pais acham disso?
Engoli um seco. Eu realmente não havia pensado bem sobre aquela proposta, apenas queria vê-la sorrir de novo.
Encolhi os ombros – Você é minha amiga da escola, eles não precisam saber – a lancei um sorriso fraco antes de entrarmos na sala, onde a devolvi sua mochila.
- Eu iria gostar disso – sussurrou antes de se dirigi até o fundo da sala.
**
- Vocês viram a cara da estranha, hoje? – Finn falava durante nosso intervalo. Ninguém se atrevia a sentar na nossa mesa, o que era de certa forma conveniente, mas também um pouco errado, se bem que eu nunca reclamei... Era bom ter sempre um lugar guardado.
- Sobre o que falam? – perguntei após me juntar ao grupo.
- A estranha – Murphy respondeu do outro lado da mesa, roubando minha maçã.
Octavia me lançou um olhar estranho, mas nada falou, o que eu agradeci mentalmente.
- O que tem ela? – me fiz de desentendida.
- Já viu a cara dela? Parece a Rihanna depois do Chris Brown – Fox fez a analogia e todos riram, menos eu.
- Não sei como ela conseguiu parar aqui, sério – Finn estava sendo particularmente preconceituoso agora. Estudávamos numa das melhores escolas públicas do país, pois morávamos num dos melhores distritos, mas isso não impedia outros alunos, de outros bairros, de estudarem ali.
- Por que você implica tanto com ela? – perguntei diretamente para o meu namorado.
Alguns comentários irônicos foram ouvidos na mesa, enquanto Finn apenas ria naquele ar infantil dele. – Porque eu não gosto dela e você mesmo disse que ela te encara de uma forma estranha.
- É, mas eu falei com ela, ela é ok – não queria entrar em atrito com nenhum deles, no final das contas, eram meus amigos, as pessoas que conheço desde o jardim de infância. Não iria entrar em guerra com eles por uma garota que me stalkeou por meses e eu mal conhecia.
- Vamos falar sobre a festa de aniversário da Srta. Griffin-Reese – Octavia gritou, mudando completamente de assunto e todos se entusiasmaram, pois qualquer coisa na qual bebidas estivessem envolvidas era motivo para comemoração. Agradeci internamente pela mudança de foco.
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NYCTOPHILIA
General Fiction"Nunca deveríamos tentar decifrar nossos sentimentos, sentir não é o suficiente? Por que temos que racionalizar tanto? Eu costumava tentar encontrar sentido em absolutamente tudo... Até ela entrar no meu caminho e, sem pedir licença, retirar a venda...