Capítulo 14

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Os sorrisos que recebia a cada passo que dava, faziam-me querer recuar no tempo e castigar-me por a grande mentira que dei ao inventar ser uma freira que tinha boas mãos para os doces. Os acenos de cabeça, como se fosse um santo no altar a passar, já faziam parte mas eu achava aquilo tão chato que mordia a língua só para não ter de revirar os olhos.

Acompanhava a bainha do meu hábito a balançar enquanto subia as escadas, atrás do Sr. Bieber. Tinha uma ótima visão privilegiada para uma zona dele que eu adorava, mas para não correr o risco de cair na tentação, literalmente, preferi manter os olhos no chão.

Quando cheguei ao andar de cima da Fábrica, encontrei Xayane atrás da sua secretária e podia jurar que o Ryan se estava a fazer a ela.

— Bom dia, Irmã!

— Olá Xayane. — Cumprimentei com um sorriso. Com o pouco que falei com ela quando nos cruzamos, podia dizer que ela era muito simpática e bastante bonita. As suas feições faziam lembrar a genética das zonas orientais.

— Está muito bonita hoje, Irmã Teresa. — Por todos os revirar de olhos que evitei naquela manhã, aquela sua frase fez-me finalmente soltar e rolar os olhos. Ryan estava com a sua expressão de felicidade diária, a vida parecia correr-lhe às mil maravilhas.

— Estou igual todos os dias, Ryan. — Eu não trazia um hábito curto, nem cor-de-rosa com brilhantes. Era sempre o mesmo, comprido e preto. Porque raio havia de estar bonita só hoje?

— Mas hoje a sua aparência parece estar melhor, teve uma boa noite, foi?

— Ryan! — Repreendeu Sr. Bieber. — E que tal ires para o meu escritório adiantando trabalho enquanto eu levo a Irmã à sua sala? O dia hoje vai ser preenchido.

— Sou sempre eu que faço tudo nesta Fábrica! — Queria rir ao ver o Sr. Bieber a revirar os olhos quando Ryan foi para o escritório. Era engraçado ver aquele homem durão e homem de família por vezes divertido e descontraído. Ele tinha expressões tão simples e básicas que o enalteciam tanto que ele não fazia a menor ideia.

— Se isso fosse verdade a Bieberliciou's era tua, e não minha. — Não encontraria melhor resposta para dar. — Vamos? — Acompanhei-o até à minha sala e os nervos só aumentaram ao ver toda aquela louça à minha disposição. Nem me dignei a olhar para os botões do forno, era o que mais me espavoria. — Pedi a Xayane que se certificasse que não faltavam ingredientes, nem materiais, mas caso precise de alguma coisa, não hesite em ir até ao meu escritório. — Assenti, fazendo o meu maior sorriso falso sem mostrar a cor dos meus dentes. — Boa Sorte, Irmã. Estou ansioso para provar esses doces.

Larguei o ar preso nos meus pulmões assim que a porta foi fechada. Carreguei a mala da Irmã Teresa até à larga mesa que estava no centro da sala e olhei à minha volta, tentando ter uma pista por onde havia de começar naquela que eu intitulei de cozinha de palácio. Baixei os olhos para o couro gasto da grande mala e soube que não havia maneira de começar sem ler a receita antes.

Tirei os únicos três livros que encontrei na gaveta da Irmã Teresa, talvez sejam apenas os únicos que a Irmã guardara. O aspecto de todos eles era velho e as folhas já continham um cheiro a guardado, estando elas já completamente amareladas. Eram todos iguais. Tamanho A5 e com capa de cor verde bastante escura e com algumas pontas rasgadas.

Abri o primeiro e na primeira folha estava apenas escrito o número 1426. Lembro-me da Irmã Grace dizer que as receitas eram antigas e era isso que as fazia valiosas, mas porra, era muito ano! Tinha de ter cuidado ao folhear cada pedaço daquelas folhas porque elas já ameaçavam em descolar-se. Folheei lentamente uma, duas, três, quatro e só encontrei folhas em branco. Continuei a procurar por algo escrito naquele livro e nada! Absolutamente nada. Tirei o segundo livro e para meu desespero aconteceu o mesmo. Estava tudo em branco a única escrita que tinha era na primeira folha com o ano 1870. O desespero começou a tomar conta de mim, quando tirei o terceiro livro que indicava ser de 1960, era o mais recente mas o estado de conservação estava deplorável. Abri-o ao meio, folheando-o com rapidez e não via um único pingo de tinta naquelas folhas amarelas.

Irmã TeresaOnde histórias criam vida. Descubra agora