35

45 6 2
                                    



Abri lentamente os meus olhos quando persenti que a luz começou a entrar no meu quarto, passando entre as cortinas que tapavam a vista para a minha varanda minúscula. Sentei-me lentamente passando as mãos pelo meu cabelo loiro enquanto observei que tinha adormecido com a roupa de ontem, e o Harry já não estava aqui, ele provavelmente não dormiu aqui porque preguiçoso como ele é, se tivesse dormido ainda estava aqui deitado. Tirei aquelas calças justas para estar mais confortável, e permaneci com aquela camisola larga que tinha. Fui para baixo, apercebendo-me logo que a minha mãe não estava em casa, porque já eram 10:00 e se ele aqui estivesse estava por perto. Vejo um bilhete em cima da banca da cozinha, era seu, avisando-me que teve que ir para o trabalho hoje porque tinha que substituir uma amiga dela que tinha ficado doente.

Peguei numa das taças que estavam arrumadas na prateleira e coloquei café, com leite e um pouco de açúcar. Quando terminei lavei a taça e fui para o meu quarto novamente, pronta para passar o resto da manhã a rever a matéria de filosofia, quando ouvi o meu telemóvel a vibrar sobre a minha mesinha de cabeceira.

Ia ignorar mas ele simplesmente não parava! Enrugo a testa pegando, nele vendo imensas mensagens nas redes socias e várias pessoas que me identificavam. Quando abri aquilo senti o mundo cair-me literalmente aos pés. Toda a gente nas redes sociais falava de mim e partilhava as fotos que tinha recebido com o meu bilhete à dias atrás. Eram muitas mais fotos do que aquelas que eu tinha recebido. Não eram apenas fotos, eu não sei como mas devem ter conseguido hackear o meu computador e aceder à câmara para observarem tudo o que fazia! Eu passava a vida a estudar e era lógico que tinha sempre o meu computador comigo aqui em casa, ele permanecia sempre pousado na minha secretária e conseguiram gravar imensos vídeo meus, e até vídeos onde estava com o Zayn neste mesmo quarto! Coisas realmente pessoais, coisas que apenas nós devíamos saber e agora toda a gente podia ver! Com o passar dos minutos via o número de partilhas destas fotos aumentarem cada vez mais rápido.

Sentei-me no chão do meu quarto completamente paralisada vendo todo o cyberbullying que estava a receber, todos aqueles comentários odiosos e repugnantes. Pessoas que eu nunca tinha visto na minha vida, a comentarem aqueles vídeos, a criticarem como se não existisse um humano por detrás daqueles vídeos e fotos. A minha vida estava exposta por toda a internet, eu diversas redes sociais, e parecia que ninguém chegou sequer a pensar que a rapariga que estava naquelas publicações se sentia humilhada. Eles simplesmente violaram o meu espaço pessoal sem eu sequer poder fazer algo para os impedir.

Sentia-me desorientada com isto tudo, não parecia real. Eu acho que nunca irei perceber porque que recebo tanto odio, eu nunca fiz nada a ninguém, eu tento sempre ser simpática com todos e ajudar quando posso, eles prometeram que não iria publicar nada se eu me afastasse dele. Agora perdi o Zayn e a pouco dignidade que ainda me restava também se foi. Não bastava eu odiar-me a mim própria, tinha que vir todo o mundo criticar-me e colocar-me ainda mais no fundo?!

Senti a minha visão tornar-se turva, seguido de pequenas lágrimas que escorriam pelas minhas bochechas rosadas, tornando-se a cada minuto que passava mais intensas enquanto larguei o meu telemóvel no chão, abraçando as minhas pernas contra o meu corpo magro e frágil. Parar de chorar tornou-se impossível naquele momento. A única coisa a que conseguia pensar era na reação de Zayn quando descobrisse estas fotos, porque não era apenas a minha vida pessoal que estava exposta, a dele também estava agora. E a minha mãe?! O quê que ela irá pensar quando vir isto?! Todos estes pensamentos só tonavam o meu choro ainda mais intenso e difícil de controlar.

Estava farta de tudo! Farta de não puder ter um momento de felicidade na minha vida. Cada dia da minha vida se tornava pior que o anterior, e iludida como sou, ainda pensei que iria ser feliz agora que tinha o Zayn na minha vida, mas como era de prever, a felicidade que sentia quando estava perto dele teria que acabar algum dia, e esse dia chegou.

Passava os meus dedos lentamente pelas cicatrizes que tinha nos meus braços, engolindo em seco antes de me levantar e me dirigir até à casa de banho. Sentei-me no chão em azulejo da minha casa de banho e agarrei nos pedacinhos de metal que guardava preciosamente numa das gavetas do móvel da casa de banho. As minhas cicatrizes ainda eram muito recentes, tinham dois dias apenas, mas eu não queria saber. Levantei as mangas da minha camisola e comecei a passar o pequeno pedaço de metal sobre a minha pele, já estava tão habituada a esta dor que se tinha tornado em algo habitual. Era uma forma para mim de me anestesiar dos problemas que aconteciam á minha volta, era algo que não conseguia controlar. Observava pequenas gotas daquele líquido vermelho e vívido a cair nas minhas pernas e sobre o azulejo branco. Apertava a minha mão esquerda com força, a cada corte, ao sentir aquela dor rápida a passageira, seguida de uma sensação de ardência em cada ferida que era reaberta novamente. Não conseguia parar, sentia a raiva dentro de mim misturado com a dor e tristeza que estava farta de sentir. Eu já não possuía qualquer razão para continuar em vida, não queria sofrer mais, estava farta do sofrimento! O melhor era acabar com isto de uma vez por todas. Sentia-me tão inútil, a única coisa que eu sabia fazer era desiludir e prejudicar as pessoas que amo, e com isso sentia a necessidade de me punir pelo sofrimento que causava nos outros. Esta era a única forma que tinha de transformar a dor sentimental de raiva, de tristeza, de culpa e de odio que sentia para uma dor física. Mas quando isto acabava, esta dor no meu interior permanecia. Era algo frustrante mas mutilar-me já se tinha tornado num vício incontrolável. Estes cortes faziam-me sentir viva pelo menos uns segundos na minha vida, era como um ato de sobrevivência pessoal. Mas neste momento não queria sobreviver mais...

As lágrimas voltavam novamente enquanto me lembrava o quanto estava feliz com Zayn ao meu lado e agora toda essa alegria tinha partido, já não tinha quem me agarra-se e me motivasse a continuar na minha luta. Agarrei rapidamente no meu telemóvel sentindo a força dos meus braços a falhar devido ao sangue que escorria rapidamente, os cortes desta vez foram mais profundos. Procurei "Zayn" na minha lista de contactos e liguei-lhe. Esperava que ele atendesse, encostando-me ao móvel da casa de banho, chorando compulsivamente, enquanto sentia os meus braços fracassarem, sem força.

- Sim?- Ouço a sua voz rouca do outro lado da linha e fechei os olhos com força apreciando aquele tom de voz que tanto me agradava, perdendo-me nos meus pensamentos. – Carol...Eu disse que não queria que falasses comigo- Estava a tentar suster a respiração para ele não perceber que chorava mas não consegui mais. Sentia os meus lábios tremer enquanto soluços saiam entre os meus, não conseguia parar.

- Zayn, Eu amo-te...Por favor, não me deixes ir...- Digo num sussurro tímido e desesperado, nunca lhe tinha dito, mas sentia a necessidade disso. Precisava de lhe mostrar o quando ele era importante para mim uma última vez, precisava que ele soubesse que se o meu coração ainda batia naquele momento o motivo era ele e apenas ele.

- Care?! O quê? O que se passou?! Não chores...estás be...-Desliguei a chamada antes de puder ouvir o fim da sua frase, largando o telemóvel no chão, sem forças para o segurar mais.

Agarrei a minha lâmina caída no chão, com alguma dificuldade e num último esforço, encostei o pedaço de metal no meu antebraço, pressionando-o com força contra a minha pele coberta de cicatrizes, e de forma profunda e lenta, fiz um corte na vertical. Era a forma mais rápida que tinha para deixar escapar o sangue que tinha nas minhas veias. Comecei a sentir-me tonta, e fechei os meus olhos, ainda podendo sentir, por breves instantes, o sangue escorrer pelo meu braço, caminhando entre os meus dedos até ao chão, enchendo-o com uma poça do meu próprio sangue. Era o fim. 

Care || Z.MOnde histórias criam vida. Descubra agora