Capítulo Doze - Parte 2

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É um tanto quanto estranho pensar em todos os filmes, livros e jogos por aí que falam sobre ou têm seres mágicos, agora que sei que são reais. E é mais estranho ainda pensar que eles assistem esses filmes.

Aparentemente, eu não ter pirado depois de ver André se transformar foi um sinal de que podiam me chamar para o que quer que ficam fazendo no casarão. Assim que terminamos de comer, Lavínia me avisou que tinham combinado de assistir um filme e perguntou se eu não queria ir. Entre ficar trancada no quarto e fazer qualquer outra coisa... É, acho que essa coisa de estar presa dentro do casarão já está me incomodando. E mesmo que não estivesse, não me esqueci do meu plano. Preciso fazer todos acreditarem que me conformei em estar aqui, e isso quer dizer sair do quarto. Viver entre eles, de verdade. Não que esteja sendo muito difícil fazer isso.

Lavínia chamou isso aqui de "sala de entretenimento". Eu não tenho certeza se usaria o mesmo nome. É uma sala grande, com uma televisão gigantesca em uma parede e vários sofás marrons encostados nas outras paredes. Várias almofadas estão espalhadas no centro da sala e eu puxei uma delas para perto de mim.

Paula chegou pouco antes de subirmos para cá, e agora está do outro lado da sala, deitada no chão com a cabeça no colo de Rodrigo, que está encostado no sofá. Aline está ao lado deles, em forma de gavião, empoleirada no sofá. Lavínia está deitada em um dos sofás. Alguém no casarão obviamente se transforma em algum felino, apesar de eu me lembrar de alguém dizendo que não havia nenhum deles aqui, e está estirado na frente da TV. Gatos, não importa o tamanho, algumas coisas são iguais. Caio fez uma pilha de almofadas no meio da sala e se deitou, cutucando o felino com o pé. Daiane, um dos caras que estava na cozinha mais cedo e outra mulher, que chegou com Paula, estão sentados perto do outro sofá. E todos eles estão com potes cheios de pipoca por perto. Juro que não sei como ainda conseguem comer. Se eu colocar uma pipoca na boca, capaz que explodo.

Dou uma olhada rápida para onde Paula está. Ela está concentrada no filme e só se mexe para pegar mais pipoca. O que será que passa pela cabeça de uma bruxa assistindo Harry Potter? Olho para a TV de novo. Não consigo deixar de achar isso estranho.

Abraço a almofada que peguei e apoio a cabeça no sofá. Não estou prestando atenção nos comentários que eles estão fazendo, mas é óbvio que sessões de filme assim são comuns. Na verdade, não estou prestando atenção nem no filme. Estamos assistindo o filme cinco, A Ordem da Fênix, que saiu ano passado mas até hoje eu não vi. E, aparentemente, ninguém aqui viu também. Não que eu precise – li o livro, que é muito melhor, aliás. Só consigo pensar que eu me sinto mais em casa aqui do que na casa da minha família. E queria muito ter descoberto sobre eles e ter vindo parar aqui de alguma outra forma, que não fosse como uma refém. Acho que é por isso que estou com tanta raiva de Paula e Alexandre. Não precisava ser assim. Não precisava mesmo.

Melhor voltar a prestar atenção no filme. Mas se fizer isso vou começar a xingar os personagens mentalmente, porque argh, se tivessem pensado só mais um pouco antes de agir não iam ter tantos problemas. E se o Harry não fosse um inútil. Sério, se deixassem as coisas na mão da Hermione ela ia ter resolvido tudo rapidinho e com bem menos contratempos.

— Não gosta do filme?

Quase pulo quando escuto a voz de Alexandre do meu lado. Como foi que ele chegou aqui sem eu ouvir? Ele ri em voz baixa e se senta no chão, ao meu lado. Me lembro da conversa na cozinha e engulo em seco. Mas não vou me afastar. Eu estava aqui antes e estou confortável.

— Gosto dos livros. Dos filmes, nem tanto — respondo.

Rodrigo se vira na minha direção e levanta uma sobrancelha antes de cutucar Paula, que olha de relance e volta a encarar a TV. Estreito os olhos. Rodrigo dá de ombros e olha de volta para o filme. Ele não precisa me lembrar do que falaram, sobre Alexandre estar interessado em mim. Não esqueci. E realmente espero que estejam errados.

Mas Alexandre continua onde está. Respiro fundo. Mesmo sem falar nada, não tem como ignorar a presença dele. Não é só aquela sensação de violência contida ao redor de Alexandre, e eu não quero nem tentar entender o que é. Quero mandar ele dar o fora, mas não esqueci do que falaram. Isso vai ser um desafio, e um desafio faz ele se interessar. Não quero isso. Só quero distância. Bastante distância. Especialmente da pessoa que me fez abandonar minha vida.

Se ele é algum tipo de metamorfo – e eu ainda acho que isso é o mais provável, mesmo depois do que Alexandre falou sobre não estar na hierarquia dos metamorfos – ele deveria ser capaz de farejar que não quero ele aqui. Aperto a almofada com mais força. Mesmo assim, Alexandre continua sentado ao meu lado.

Acabo relaxando quando ele não fala mais nada. Quando dou por mim, Paula e eu estamos ameaçando os outros com spoilers. Só nós duas lemos os livros, então temos munição. E então o filme está acabando. Entre resmungos, comentários e promessas de lerem os livros para não ficarem morrendo de curiosidade, alguém acende a luz.

— Vai ter filme amanhã de novo? — Rodrigo pergunta.

— Não — Alexandre responde.

Faço um esforço para não me encolher quando todos se viram na nossa direção. Chego um pouco para o lado, colocando um pouco mais de espaço entre Alexandre e eu quando ele se levanta e olha ao redor, sério.

— A partir de amanhã, estamos em negociações com os felinos — ele continua. — E existe a possibilidade de membros do Conselho virem nos visitar, para verificar nossa solução alternativa.

Em negociações com os felinos... Com Gustavo. Engulo em seco. E essa "solução alternativa"... Não preciso que todos me encarem para saber que ele está falando de mim. Nem para saber que uma visita do Conselho, seja lá o que for, não é um bom sinal.

***

Ok... eu sei q foi pequeno, mas... não me matem? Please? :v Juro que to tentando correr aqui pra conseguir postar mais depressa.

Refém da Noite - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora