Capítulo Oito - Parte 1

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Fico encarando a porta, sem ter certeza do que aconteceu. Bruxa. Como que uma coisa dessas pode ser possível? Como? Mas, da mesma forma... Como Paula conseguiu me segurar? E o que é esse brilho esverdeado que ainda consigo ver nas janelas? Não tem outra explicação.

Paula é uma bruxa.

Tá, alguém virar para mim e dizer que é uma bruxa não me surpreende tanto assim. Conheci umas tantas pessoas em BH que diziam que eram bruxos, o pessoal da Wicca e outras tradições pagãs. Mas isso é diferente daquilo. O que Paula fez... Isso não devia ser possível. Não tem como ser real.

Olho para as janelas de novo e engulo em seco. Eu ainda estou vendo o brilho verde, e sei que não tem nada ali. Não tem como ser um truque. Eu já mexi nas janelas de todas as formas para tentar sair para a sacada, não tem nada de diferente nelas. E mesmo que tivesse, isso não explicaria o que aconteceu lá embaixo.

Caio sentada na cadeira, ainda olhando para as janelas. Isso não pode estar acontecendo. Mas está. De alguma forma, está. Paula é uma bruxa. Ela me segurou com esse poderzinho verde que agora que está sumindo das janelas.

Balanço a cabeça de novo. Quero insistir e falar que isso não é possível, mas não posso. Meu Deus. Isso realmente aconteceu. Isso realmente está acontecendo.

Eu estou presa em uma casa com um bando de criminosos e uma bruxa. Se é que ela é a única aqui.

O que aconteceu ontem à noite na cozinha? Fecho os olhos, tentando me lembrar. Preciso me lembrar. Posso só ter impressões sobre o que aconteceu, mas tenho certeza de que isso tem alguma coisa a ver com Paula. Será que foi ela que apagou minha memória?

Viro a cadeira para a mesa, apoio os cotovelos nelas e escondo o rosto na mão. Preciso pensar, preciso me lembrar. Essa coisa toda é absurda e eu tenho a impressão de que tudo ao meu redor está girando, cada vez mais depressa, e que se eu não entender o que está acontecendo e me segurar, vou ser arremessada longe.

Isso não faz sentido. Mas nada faz sentido.

Noite passada. O que aconteceu? Não reparei em como é estranho que eu não me lembre de quase nada depois que saí do quarto com Lavínia, mas agora... Será que foi ela quem tentou apagar minha memória? Um arrepio me atravessa. Ela parecia tão normal, tão amigável apesar de tudo, não é possível...

Respiro fundo. Não. Eu não posso começar com isso, pensar que qualquer um aqui pode ser um bruxo também. Ou sabe-se lá o quê. Se fizer isso vou ficar louca.

Isso se eu já não estiver louca. Bruxa.

— Puta merda.

Não costumo falar palavrão, mas não tem outra coisa que eu possa falar agora.

Respiro fundo de novo e solto o ar lentamente, ainda sem levantar a cabeça. Foco. Foco. Preciso tentar me lembrar do que aconteceu. Alguém entrou na cozinha e eu fui empurrada. Nada de mais. Então por que eu estou tremendo?

Levanto a cabeça e me inclino para trás na cadeira, fechando os olhos. Eu estava na cozinha. Estava conversando com alguém... Acho que Rodrigo, o motorista, estava lá. Lavínia e mais alguém. Puxo o ar e o solto pela boca, lentamente. A cozinheira? Acho que alguém mencionou que ela era casada com outra pessoa que eu já tinha visto...

Não. Não é isso. Não preciso saber o que conversamos ou me lembrar nomes. Preciso saber o que aconteceu para eu voltar para o quarto. A pessoa entrando na cozinha...

Garras. Eu vi garras. Mas eu estava na cozinha...

Respiro fundo mais uma vez e conto até três, segurando o ar, antes de soltá-lo. O que aconteceu? Consigo ver claramente na minha mente: a porta da cozinha, que dá para o quintal, se abrindo e alguém entrando. Um homem. Eu ouvi ele falar alguma coisa, mas estava de costas, conversando com Lavínia. Me virei para ver quem era e ela me puxou. Garras avançando para mim, e então Rodrigo me empurrou. Eu tropecei em um tamborete e caí, mas Lavínia já estava na minha frente e...

Refém da Noite - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora