Meu domingo foi estranhamente calmo. Depois de sábado, imaginei que os meninos continuariam a aparecer, mas isso não aconteceu. Na verdade, absolutamente nada aconteceu domingo. Quer dizer, até aconteceu, vi montes de pessoas com câmeras profissionais no meu corredor. Repórteres, claramente alguém morreu em algum dos apartamentos. É, certamente foi isso. Exatamente. Já dá até pra ser detetive depois dessa análise.
Depois de observar a cena eu calmamente entrei em casa e passei o dia fazendo vários nadas. A noite comecei a me preocupar com o trabalho da faculdade e só fui dormir de madrugada.
Três horas de sono e agora essa aula maravilhosa sobre... que faculdade que eu faço mesmo? Isso, exatamente isso que você está pensando.
Eu gostava do curso, mas essa aula em especial me dava vontade de morrer... de prazer. Porque o professor é só lindo demais, nada menos.
A aula acabou, fui pro trabalho de meio período no restaurante e sete da noite eu já estava passando pelo corredor em direção ao meu apartamento. Paro em frente a porta deles. Suspiro. Aaaaaaah, que vontade de bater na porta.
Não, tô bem. Já passou.
Quando eu estava quase colocando a senha do teclado, Hoseok sai do apartamento.
- Aah, Jagiya, que bom te ver. - ele se aproxima - Ei, quer tomar alguma coisa comigo?
O sorriso enorme era tão convidativo que parecia que recusar era impensável.
- Topo, mas vou tomar um banho porque acabei de chegar. A gente pode deixar pra outro dia-
- Não - Ele continua com aquele sorriso nos lábios - Eu te espero.
Achei estranho, só que o que demônios eu ia dizer? Não?
Depois de me banhar e me agasalhar bem, saio do apê e vejo Jooheon ao lado de Hoseok.
- Jooheon vai também? - perguntei talvez feliz demais.
Os olhos dele brilham e vejo um resquício daquele homem de sábado.
Hoseok se apressa:
- Não, ele tem uma coisa pra resolver.
- Tenho não. Na verdade, acabei de desmarcar.
Aquela situação tinha ficado tensa de alguma forma, mesmo assim eu só conseguia ficar rindo dos dois. Era engraçado como eles brigavam.
- Então a gente vai aonde?
- Tem uma cafeteria ótima aqui perto. - Hoseok sugere.
Jooheon ainda tenta argumentar contra, e como não adiantou, nós três já estávamos andando na direção da cafeteria.
O bom é que tudo era bem perto, então parecia que eu nunca teria dificuldade em achar um bom lanche perto dali.
Sentamos numa mesa, os dois nas duas pontas da mesa e eu no meio.
- Então, Jagiya... - Hoseok começa - O que você faz quando quer se divertir?
Sexo? A quem eu quero enganar, né? Anos que não chego perto de ninguém sexualmente falando.
- Eu durmo ou como - "ou transo" queria acrescentar, mas a gente só finge que é inocente.
- E tocar instrumento, fazer esporte, ouvir música... Nada disso?
Antes que eu pudesse responder, Jooheon interrompe:
- Mais importante, por que alguém não vai fazer nosso pedido no balcão?
Eu me levanto, mas Jooheon pega no meu braço e me sento outra vez.
- Hoseok - Jooheon chama e os dois tiram no pedra-papel-tesoura. Hoseok ganha e Jooheon vai sozinho.
- Oh, tem uma coisa no seu cabelo - Hoseok diz e chega mais perto. - Não se mexa - Ele fala bem baixo e demora muito tempo pra tirar uma folha nos meus cabelos emaranhados.
- Obrigada.
Ele sorri e, não sei se propositalmente ou não, morde os lábios inferiores.
Jooheon volta com as coisas em mãos. Bebo meu latte bem devagar, sorrindo de vez em quando por causa da sensação deliciosa de tomar alguma coisa quente na Coreia.
- Ah, como foi o domingo? - Jooheon pergunta. - Sentiu falta?
Ele estava fazendo aquele joguinho de novo. Se eu senti falta daquele olhar dele? Se eu senti falta daquela conversa de duplo sentido?
- Do que? - Agora ele provavelmente ia desconversar. Mudar o sentido das coisas, fazer parecer algo inocente.
- Sentiu falta de mim?
Hoseok e eu engasgamos ao mesmo tempo.
- Do que você tá falando? - Hoseok pergunta a ele.
Jooheon dá de ombros.
- De nada, ainda. - O olhar dele parecia queimar minha pele por baixo de todas essas roupas. -Gostou do café?
- Uhum - Respondi ignorando o clima pesado que tinha se instalado. Parecia que Hoseok queria falar alguma coisa ou mesmo sair dali. Eu não entendia mais nada.
- E vocês? O que vocês gostam de fazer? - perguntei pra amenizar o clima.
- Eu canto - Hoseok fala e o sorriso volta a brincar em seus lábios.
- Eu sou rapper.
- *Massa* - falei em português querendo mesmo. Meus colegas coreanos já sabiam dessa minha mania - Dá pra vocês montarem um grupo de kpop. - Falei inocentemente e eles começaram a rir bem alto.
- Dá mesmo - Jooheon confirma.
- Você gosta de kpop?
- Sim, mas não acompanho. Sei os nomes dos grupos, algumas músicas...
- Aah, entendo. - era Hoseok - Não é fã de nenhum grupo.
- BigBang? Gosto muito, até conheço os membros por nome.
Jooheon começa a falar:
- Já ouviu falar de Mons- Ai! - Hoseok bate no braço dele e desconversa.
Depois de uma conversa divertida, voltamos ao corredor da despedida. Triste, porém era uma verdade incontestável. A gente sempre se despedia no corredor. Tá, "sempre" é uma palavra muito forte pra uma terceira vez.
- Até amanhã - Hoseok diz e isso me surpreende um pouco. É quase como marcar um encontro e ninguém tinha garantias de que a gente se veria amanhã.
- Tchau.
- Até - Dessa vez é Jooheon. Ele fica bem do meu lado enquanto eu coloco a senha no teclado.
- Até, Jooheon.
- Jagiya, - eu levanto a cabeça para olhá-lo e a gente está perigosamente perto pros padrões coreanos - Pode me chamar de Honey se quiser.
Hoseok se aproxima e puxa Jooheon pelo braço.
- Eu sei o que você quer fazer, mas não faça, a gente não pode. - É Hoseok advertindo Jooheon com um dialeto de alguma cidade interiorana. Era pra eu não entender, suponho.
- Tchau, Hoseok, Jooheon - me despeço outra vez e ouço um "É Honey, Jagiya!" antes de fechar a porta por completo.
Sorrio bobamente. "Honey" combina. Não, não, não. Era cedo demais pra tratar por apelido. As relações sociais coreanas não eram assim, não funcionavam assim, então... eu odiava pensar isso, mas eles podem estar brincando comigo, "a brasileira". Meu sorriso deu lugar a olhos marejados e eu quase choro. Engulo o choro às custas. Se for isso, não vou ser enganada.
Levo essa amizade até eles mostrarem se gostam de mim como pessoa ou se querem só... eu suspiro outra vez.
Como alguma coisa, durmo.
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All In
FanfictionSão cinco anos de intercâmbio e, acabado esse primeiro ano, decidi me mudar. Não aguentava mais a residência e, mesmo que meu novo apartamento ficasse um pouco longe da faculdade, ficava perto do meu emprego de meio período. Além de ser um lugar óti...