Chapter VI - The Immutable Truth

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- Então, basicamente, tudo que sabemos sobre Charles Clifford é mentira? - disse Rose, impávida.
Fazia apenas poucos minutos que contara a eles toda a verdade, e que conseguira não surtar. Chris não dissera nada, apenas me encarava como se eu fosse uma bomba prestes a explodir. E talvez ele estivesse certo. Amanhã após o meio-dia, haveria o funeral dos meus pais, o qual eu iria acompanhada de Candice. Mas ela era uma mentirosa, eu nem sequer sabia se podia confiar nela. Mas, afinal, não somos todos mentirosos?
- Quem você acha estar na sepultura dele? - declamou Chris, tirando-me do devaneio.
- Não faço ideia - disse - Roman citou que foi uma criança, não definiu sexo ou nada que se pudesse interligar. Entretanto, algo me diz que todas as respostas que anseio em ter... Só ele pode me dar.
- Mas ele é um tira, Addie - hesitou Rose - Pior, ele é um investigador de polícia. Eles são muito agressivos quando querem, mesmo tendo ligações familiares.
- Rosalie tem razão - disse Christopher - Acho que mesmo tendo omitido grande parte da verdade, sua fonte mais segura no momento é a Candice.
Mordi meu lábio inferior com firmeza até sentir o gosto metálico, porém conhecido do meu sangue. Iria confrontar minha tia atrás da história real, estava cansada de mentiras.
                            +++
A noite estava gélida e silenciosa. Rosalie dormia tão calmamente na cama ao lado; o mundo dela era simplesmente desigual ao meu. Era como se...
Addison.
A voz ressoou fraca e inconsistente na minha cabeça, um breve sussurro, que me fez tremer.
Addison, não temos muito tempo. Venha.
Seria possível que essa voz estivesse me convidando a sair do quarto?
Levantei-me, pondo minhas pantufas de maneira rápida e silenciosa, esgueirei-me por entre os móveis do quarto e segui até a porta. Ao abri-la, senti o cheiro forte e intolerável de algo apodrecido.
A voz não se pronunciara novamente, mas meu instinto dizia para que eu seguisse o caminho mais tortuoso possível. Logo, o depósito era a melhor opção. Com passos largos e taciturnos, dirigi-me para a escada, subindo degrau por degrau na mais tranquila velocidade. Sem pestanejar, girei a maçaneta e deparei-me com Chris em pé. Em pé e suando frio.
- Você está ouvindo isso? – indagou ele, sussurrando.
- A voz ? – disse, no mesmo tom.
Ele assentiu. Poderia ser ilusão da minha cabeça, mas ele parecia estar aterrorizado e isso me fez ficar aterrorizada também. Um silêncio ainda maior do que o anterior se manteve, nem mesmo o som do vento era audível.
Por detrás de Chris, uma figura se materializou. Era uma garotinha, provavelmente na faixa dos sete anos, e ela estava mais branca que a neve.
- A ascensão das Trevas se aproxima... – disse a garota, e sua voz se fez notável como a mesma que estava em minha cabeça – Como um espelho que possui duas faces, como um nascimento precoce vindouro de uma promessa satânica. Como a sepultura falaz que predomina o solo profanado...
A figura da garota tremeluziu até então sumir.
- Quem diabos era ela? – disse ele – Um fantasma?
- Sinceramente, eu não sei – afirmei – Mas uma sensação terrível me diz que não vamos demorar em descobrir.
                              +++        
O sol nascera em poucos minutos após eu verdadeiramente conseguir dormir. Contudo, não podia me dar ao luxo de dormir mais. Aquela garota da noite passada... Algo nela realmente me incomodara. Algo nela realmente me perturbara. Rose já estava de pé, conversava com alguém do lado de fora do quarto, provavelmente Rachel. A coitada ainda não se recuperara totalmente de ver o cadáver de Sidney, e ninguém a poderia culpar Rosalie entrou e sentou-se na cama, encarando-me de braços cruzados.
- Onde foi na noite passada ?
- Fui ver o Chris – disse – Ouvimos uma voz, e...
- Aquele lance médium, entendi – disse ela – Vocês são almas gêmeas, parentes ? É estranho que ambos tenham as mesmas visões e escutem as mesmas vozes.
- Muita coisa não faz sentido aqui, Rose – disse, parando após ouvir as badaladas do sino anunciado a chegada da tarde.
- Preciso me arrumar – disse.
- Tudo bem – balbuciou ela – Vou para a aula. Depois te passo o conteúdo.
Assenti, agradecida. Arrumei-me rapidamente, vesti uma calça jeans escura e um suéter preto, com botas cinzentas quase brancas. À medida que ia descendo as escadas, esperava encontrar freiras ou outras garotas, mas estava tudo vazio. Provavelmente, a essa hora, todas estavam em salas de aula.
- Addison – disse uma voz sedutora.
Era Roman Clifford.
- Detetive – disse, baixando a cabeça.
- Sem formalidades, pode me chamar de Roman – protestou ele – Afinal, você era prima do Charles.
Dei um sorriso tímido, tentando não me apavorar mediante ao homem.
- Tudo bem, Roman – proferi, pondo as mãos no bolso da calça – Pode me chamar de bisbilhoteira, mas ontem... Escutei você e a Irmã Candice discutindo.
- Ah, aquilo. Não se preocupe. Candice sempre teve a habilidade inumana de me fazer perder o controle.
- Quem é a criança no túmulo de Charles, Sr.Clifford ? – inquiri, sem ressalvas.
Roman passou a mão pelo cabelo, silencioso.
- Aravis Collingwood – interrompeu-nos a voz de Candice.
Virei-me para ela. Ela estava sem seu Hábito, trajava um terninho preto liso. Seus cabelos ruivos estavam presos num coque muito bem feito, deixando seu rosto sem quaisquer resquícios de vermelho, além de suas sardas quase invisíveis.
- Era uma garota ? – questionei.
- Sim, era uma garota – confirmou ela – Agora podemos ir, Roman ?
- Sim, Candice, podemos – disse ele – Addison, se importaria se déssemos um leve atraso ? Preciso falar com sua tia.
- Claro – assenti, vendo-os parti.
Por meio a ruídos, pude ouvir Rachel descendo as escadas rapidamente.
- Addison – disse ela, tremendo ao chegar ao meu encontro.
- O que aconteceu, Rach ? – disse, confusa – Por que está tremendo ?
- A Irmã Sarah – grunhiu ela – Eu acho que... Eu acho que a Irmã Sarah matou o Sidney.
- Addison – disse a voz de Candice, fazendo-me virar – Vamos.
Virei para despedir-me de Rachel, mas ela já havia sumido. Isso era impossível. De maneira alguma a mulher que conheci teria sido capaz de ter matado Sidney. Isso é, se eu realmente a conhecia de verdade.
                              +++
O funeral fora rápido, fácil. Até mais do que eu esperava. Tanto a viagem de ida quanto a de volta fora silenciosa e pacífica. Roman e Candice não mencionaram Aravis ou Charles nenhuma vez sequer. Talvez fosse doloroso demais para Roman e vergonhoso demais para Candice. Ao enfim chegarmos em Chateau Miranda, Candice permitiu-se falar algo:
- O Dr. Further a aguarda na sala dele, Addison.
- Dr. Further ? - indaguei.
- É o psiquiatra do orfanato – assegurou ela – Normalmente o chamamos quando um novo órfão chega aqui, e como não chamamos na sua chegada e hoje foi o enterro do seus pais... Acho que seria bom você conversar com alguém além da Srta. Summers.
Assenti, deixando-os a sós. Caminhei até o portão principal, onde a Irmã Jane fumava um cachimbo.
- Boa tarde, Srta. Derringer – exclamou a mulher, rindo – Meus pêsames mais uma vez.
Revirei os olhos, entrando no castelo sem ao menos respondê-la. Rosalie estava descendo as escadas quando a interceptei.
- Onde fica a sala do Dr. Further ? – perguntei, sem ânimo.
- Subsolo, por quê ? – questionou ela.
- Aparentemente tenho que vê-lo – disse, seguindo com ela para um ramo de escadas ao qual não conhecia.
- É só descer aí, e aguardar no banco – disse ela – Ele é um bom homem, apesar de estar velho.
Assenti, descendo as escadas. O lugar não era entregue a teia de aranhas e mofo como achei que seria. Sentei-me em um banco, e aguardei por alguns minutos.
- Você parece deprimida – disse uma voz rouca e gentil.
Virei-me para ele, e lá ele se encontrava. Terno perfeitamente limpo, olhos castanhos gentis estudando-me Sua barba branca me fez sorrir, ao lembrar do Papai Noel.
- Sou Clementine Further – disse ele – Pode me chamar de Dr. Further ou C.F.
Levantei-me, acompanhando-o até sua sala. Não tinha nada de especial, na verdade, os únicos móveis do recinto eram uma mesa, uma cadeira acolchoada e um sofá idêntico a cadeira.
Sentei-me no sofá e ele quase que imediatamente sentou-se na cadeira.
- Roman me pediu para lhe contar tudo sobre Charles – disse ele – E é isso que eu farei.
Engoli em seco.
- Em primeiro lugar, quero que saiba que ele nem sempre foi assim – disse ele, com veemência – Então vamos do começo. No dia 21 de Agosto de 1944, nascia Charles Clifford. Charles teve seus cinco primeiros anos de vida saudáveis, entretanto, no seu aniversário de seis anos, o primeiro evento estranho aconteceu. Charles havia matado todos os pássaros da floresta próxima a sua casa, e banhava-se no sangue deles. A princípio, Candice ficou horrizada, mas tentou acreditar que isso fora apenas uma travessura de um garoto inconsciente de seis anos. Mas aquilo voltou a se repetir várias vezes, com outros animais.
- Ele não teve acompanhamento médico ? – inquiri, estupefata.
- Sim, ele teve. Eu mesmo o acompanhei – disse ele – Entretanto, o que acontecia com Charles era algo muito mais sombrio do que eu jamais pude supor. No início, acreditei que ele possuía bloqueios psíquicos ou até mesmo que fosse histriónico.
- Você descobriu o que ele tinha ?
- Charles Clifford era um psicopata tirânico – disse ele, com pesar - Eles são particularmente vingativos e hostis. Seus impulsos são descarregados num desafio maligno e destrutivo da vida social convencional. Eles têm algo de paranóico na medida em que desconfiam exageradamente dos outros e, antecipando traições e castigos, exercem uma crueldade fria e um intenso desejo de vingança. Contudo, ele era adorável. O que caracteriza outro ponto de sua doença: Ele pleiteia um estilo de vida socialmente teatral, com persistente busca de atenção e excitação, permeada por um comportamento muito sedutor.
- Isso se aplica ao caso de Aravis Collingwood ? – questionei.
- O caso de Aravis foi uma fatalidade, e quando Candice estava prestes a se tornar uma freira, Charles e ela se tornaram bastantes amigos. Todavia, quando a estátua do Anjo Malévolo caiu sobre ela, Charles exerceu algum tipo de auto-punição. Depois, ele a mutilou.
- Ah, meu Deus – disse, pondo as mãos no meu rosto.
Dr. Further pôs um arquivo na mesa, abrindo-o logo em seguida. Na contracapa, a foto da garota estava em destaque.
Era a mesma garota que eu e Chris havíamos encontrado na noite passada.
- Srta. Derringer, você está bem ? – questionou o homem.
- Sim, eu estou – sequei algumas lágrimas involuntárias do meu rosto – Por favor, prossiga.
- Após esse acontecimento, concordamos que ele precisava de acompanhamento especializado no caso dele – disse – Por isso o enviamos para Londres. Ele permaneceu alguns anos por lá, recebeu tratamento, contudo, adquiriu pneumonia e morreu. A morte é a verdade imutável mais complexa da vida, sempre foi.
Passos pesados aproximaram-se da porta, até finalmente alguém abri-la; Esse alguém era Rose.
- Desculpe a interrupção, C.F. – disse ela – Addie, precisamos ir.
- O que aconteceu ? – indaguei.
- A Rachel. Ela desapareceu – disse Rosalie, pálida – Acho que ouvi ela gritando.

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