Capítulo VIII - Playtime

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A mão gélida de Rose pressionava meu pulso, podia sentir meu sangue paralisando-se naquela região. Aravis havia parado de sorrir, e agora, ela me estudava com seus olhos etéreos. As crianças detrás a ela tremeluziam e sussurravam lamúrias, alguns praguejos e uns gritos abafados. Aravis caminhou na minha direção, seus olhos fixados nos meus.
- O Anjo determinou a ceifa, olhos de pedra - disse ela – É hora de brincar!
E com isso, ela e seus companheiros tremeluziram até desaparecer.
- Eu não tenho certeza do que acabou de acontecer aqui - balbuciou Rosalie - É ela? Aravis?
- Sim, a própria – afirmei, pegando a pá do chão e empunhando-a para o ar – Mas assim como Helen Duncan... - Olhei de relance para o corpo inconsciente da outrora órfã e amiga e prossegui – Ela mencionou algo sobre uma devida hora de brincar, e isso não me agradou.
- Eu não entendo como isso é possível - proferiu Sarah - Essa garota estava morta, assim como todos os outros. 
- Nem eu entendo como isso tudo é possível, Irmã - afirmei - Mas preciso que a senhora nos ajude agora.
Ela assentiu, seguindo para o corredor. Um silêncio mortal percorria todo o orfanato, não se ouvia nem sequer uma risada.
- O que estão fazendo aqui ? - ecoou a voz de Jane, vindo em nossa direção - Sarah, como pode trazer duas órfãs até o bunker ?
- Essas duas órfãs, Jane... - disse ela, nos olhando de relance - Descobriram a identidade do assassino de Sidney.
- E quem era, afinal ? - indagou a mulher, seus olhos frívolos nos queimando vivas.
- Rachel. Ou melhor, dizendo, Helen Duncan - disse Sarah.
- Por Deus, mulher! - vociferou a Irmã Jane - Suas paranoias e teorias deixaram-na conturbada.
- Onde você prendeu o Chris ? - bradei, atraindo sua atenção.
- Aquele marginalzinho vai apodrecer na Torre do Precipício, e não há nada...
- Se acha um deus, não é ? - minha voz se sobrepôs a dela - Tendo todas as Irmãs ao seu dispor, aterrorizando órfãos... A verdade é que você é uma mulher incapacitada, com uma arrogância indomável e um ego extremamente elevado. Apenas um mártir de suas próprias ações cruéis.
- Tenha cuidado Srta. Derringer - a mulher falou tão perto de mim, que pude sentir o cheiro da fumaça dos charutos invadindo minhas narinas - Ainda está no meu orfanato, e já que mencionou o Sr. Scarver, pode juntar-se a ele agora mesmo.
Sua mão pesou em meu braço, arrastando-me pelas escadas. Rose e Sarah gritaram para que ela me soltasse, mas nada parecia capaz de interceptá-la; do bolso, Jane tirou uma penca de chaves procurando rapidamente a correta para abrir uma porta de aço.
- A Srta. Derringer passará algum tempo aqui, senhoras. Garanto-lhes que nada de mal acontecerá com ela... Na verdade, não posso garantir isso.
Com uma risada diabólica, Jane me puxou para o local que a porta de aço e a última coisa que pude ouvir foram as lamentações de Rose.
                             +++
Eu estava num corredor, ouviam-se choros por todos os lados e minha garganta parecia estar se fechando. A Torre do Precipício que Rose descrevera para mim no meu primeiro dia em Chateau Miranda não era nada comparada a esta ao vivo e a cores. O lugar cheirava a morte e a água salgada, as paredes adquiriram um tom amarelado e variante do preto em alguns lugares devido a umidade do ar. Algumas pessoas apareciam na janela da cela, seus olhos insanos encaravam-me e abaixavam-se mediante Jane os encarava de volta. Quando finalmente chegamos no fim do corredor, visualizei a abertura rochosa que dava numa floresta desértica e o precipício mais adiante. Estávamos na torre mais alta daquele castelo, e minha vertigem me fez rodopiar por alguns segundos. Na cela AA8754 se encontrava o garoto loiro que conhecera quase que uma semana atrás. Chris.
- Estou me sentindo benevolente hoje, vou permitir que permaneçam juntos - afirmou Jane - Isto é, por toda sua estadia aqui. Jane abriu a cela e me empurrou para dentro, trancando-a logo em seguida.
- Addie... - disse, levantando-se para abraçar-me - O que aconteceu ?
- Rachel matou o Sidney e após uma discussão, Jane me trouxe para cá - suspirei - Mas eu a vi novamente, Chris. Aravis.
- O que ela quer de nós, afinal ? - indagou ele - E por que apenas nós podemos vê-la ?
Uma risada nos interrompeu. A risada era marcada pela falta de graça e pelo completo desespero que nela aparentava. Quem quer que estivesse rindo, ria de medo. Levantamos, seguindo lentamente até a janela da cela.
- Quem está aí ? - bradou Chris, olhando atentamente para o semblante do corredor.
- Vocês também podem vê-la - disse a voz, o sotaque britânico perceptível - Eu não sou o único.
- Quem diabos é você ? - indaguei.
- Austin McGregor, ao seu dispor - afirmou o rapaz - E quem são vocês ?
- Christopher Scarver e Addison Derringer - disse Chris, segurando minha mão - Então também pode vê-la ?
- Fantasmas são implícitos aos condenados, Christopher - disse Austin - Eles podem ser vistos aos seus semelhantes e por aqueles que já presenciaram a morte.
Fez-se silêncio por um momento perturbador, seguido pela lembrança vívida dos meus pais sob uma poça de sangue. Meu estômago embrulhou-se mais uma vez, e isso me fez pensar em como Chris estava se sentindo. O que ele já presenciara?
- Aqui, na Torre, eu vi muitos perecerem - disse ele, quebrando o vácuo - Precocemente ou subitamente. Tudo mediante á vontade da Irmã Jane.
- Jane ? - indagou Chris.
- Quando a igreja católica decidiu apropriar-se de Chateau Miranda e fazer do mesmo um orfanato, Jane veio do Texas diretamente para dirigi-lo - disse ele - Pouco sabe-se sobre sua vida anteriormente, entretanto, sabe-se que ela é uma tirana psicótica e causadora da morte de muitas crianças; isto é, ela criou a Torre do Precipício e matou diversas crianças. Aqui e em outros lugares.
- Está dizendo o que eu acho que está querendo dizer ? - premeditou Chris, levantando.
- Acho que sim, Christopher - e como Chris não disse nada, ele prosseguiu - Todos os fantasmas que seguem Aravis, buscam vingança. E matarão e destruirão tudo aquilo que se puser em seu caminho.
- Ou seja... Nós. - disse, com pesar.
- Precisamos tirar todos daqui e fechar este maldito lugar de uma vez por todas - afirmou Chris - Jane precisa ser presa por seus atos!
- Aqueles órfãos irão matá-la, Christopher - disse Austin - Você é apenas uma incógnita que está prestes a ser eliminada. Todavia, concordo com você. Precisamos sair daqui.
O som da porta de aço sendo aberta fez-se audível, assim como os passos rápidos vindouros em nossa direção. A porta da cela em frente se abriu e em seguida, a nossa. Sarah debruçou-se pelas beiradas, seguida por Rose. A visão me fez sorrir por um breve momento. 
- Não temos tempo - disse Rose - Os órfãos estão atacando o orfanato, seguimos um rastro de sangue e... Jane desapareceu. 
- É hora de respostas concretas - disse, virando-me para Sarah - A sala onde Jane mantém os registros dos residentes, onde fica ?
- Próxima a sala do Dr. Further - afirmou Sarah - Que inclusive, também desapareceu. 
- Precisamos ir agora...
Um vulto passou por nós, lançando-me contra a abertura para a floresta. Gritei alto quando senti a ausência do chão abaixo, entretanto, algo me manteve flutuando. A noite repousava pela floresta, o matagal negro deixou-me perdida e por fim, atingi o chão. Aninhei-me, tentando manter o silêncio assustador. Não consegui ouvir nada além dos meus soluços abafados e a respiração ofegante incontrolável. Era o Anjo Malévolo; Ele estava ali.

American Horror Story: OrphanageOnde histórias criam vida. Descubra agora