a verdade intraduzível e intacta e permanente e ainda assim sincera e crucial e não obstante visceral: eu amava você. eu realmente amava dum jeito que não poderia quantificar nas provas de estatística da faculdade. mas eu também sabia que para além do amor, há outras verdades incontestáveis na vida como as guerras, aqueles que não se perdoam, a política fatídica e cotidiana dos que vão embora mesmo tendo amor. a verdade é que eu não poderia fazer mais nada pois já estava em risco, em tempo de quebrar as vértebras, ir à terapia, pedir que você parasse de tentar acabar com a minha fé nas relações interpessoais. então eu fui e a verdade que queima como aquela parte do vesúvio que nenhum estudante de grandes devastações saberia a dimensão é que a gente vai embora mesmo. a gente vai embora mesmo carregando todo o amor do mundo em nosso depósito destinado a grandes momentos em grandes pessoas.
o amor acontece em doses homeopáticas em momentos raros com pessoas raras. então você foi uma dessas pessoas e eu abandonei o barco. você já tinha abandonado, na verdade. eu só me levantei da proa, caí no mar e desde então sigo nadando nadando nadando nadando e tentando não morrer afogado no arrependimento de ter que deixar uma possível-provável pessoa permanecer no meu depósito.
a verdade incontestável é que precisa-se correr antes da chuva começar a machucar a pele e a vida começar a sufocar o pescoço e o amor - ou aquilo que você denomina amor, tanto faz - começa a te pedir para abrir o peito. você abre seu peito e você sente frio e sente o mundo pressionando suas forças e você quer desistir de si mesmo. por outra pessoa. e eu estava tentando não morrer e não me afugentar da concepção de ir embora. teve um momento que eu pensei que cê mudaria e eu poderia, enfim, voltar à tona. eu acreditei em tantas verdades que pra mim salvariam a nossa relação e que são meias-verdades que salvam tantos por aí. eu sempre quis verdades que me fizessem chorar porque dessa maneira eu poderia sobreviver a todos os outros ataques. porque a verdade dói como uma flor que a gente arranca do corpo e, ao arrancá-la, puxa também a essência e toda a construção.
a verdade abre uma ruptura. a verdade reacende a dúvida e a verdade, crua e insípida, me fez ir embora. eu percebi que era muito bom compartilhar minha vida na sua, mas que era ainda melhor viver a minha liberdade de poder me ser - em complitude, em permanência, em ir para outros países, sensações, dias sem a tortura das dúvidas saboreando da minha sanidade: será que ela me ama e é a pessoa certa para esse depósito raro e imaculado? será que ela é uma dessas pessoas raras com que eu posso compartilhar meu Índio poluído, caótico e energizado?
a verdade incontestável é que hoje eu sonhei com você e acordei querendo te mandar uma mensagem dizendo que o depósito não era para você e que está tudo bem não ser. que a vida nos junta porque ela pretende que aprendamos coisas e eu aprendi com você. que você me foi como uma luz em momentos importantes e que as ruínas do Coliseu hoje servem para atrair pessoas, não para afastá-las. que a gente já não se fala há quase um meses, mas que a vida é efêmera e que amanhã não estarei mais aqui e que só restarão as memórias acesas pelas sensações que, no fim de tudo, a gente compartilhou.
você foi aquela parte que resolveu queimar em mim uma espécie de perdão por eu ter permitido alguém como você invadir meu depósito. e acabou.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Textos para ela
RomanceApenas textos dedicado a uma pessoa que marcou minha vida, da mesma forma como alguém marcou a sua