AAAAAAA
— Ei, Bela Adormecida — é a primeira coisa que ouço quando minhas pálpebras se abrem.
Confusa, olho em volta, atentando-me aos detalhes: paredes brancas, um bipe ininterrupto e um colchão macio sob meu corpo. E, claro, o principal: Rita. Ela segura minha mão direita, um sorrisinho sem dentes apertando seus lábios macios, que tão bem conheço. Seu cabelo castanho está preso em um coque alto, o que lhe atribui um ar altivo, deixando à mostra seu rosto plácido e o olhar intenso, que tantas outras vezes me devorou.
— Ei — digo fracamente, minha voz soando rouca.
— Como você está se sentindo? — pergunta-me, conferindo o monitor ao qual estou ligada por sensores.
— Bem, eu acho.
— Já é um começo. — Aperta um botão qualquer na tela e se volta para mim. — Do que você lembra?
Pisco, franzindo o cenho, e logo o episódio da "invasão" a São Paulo possui minha mente. Relato sobre o hackeamento, o resgate de Ranna e os outros, Natanael enlouquecendo e se entregando para salvar a própria prima... Oh, lord, oremos que ele esteja vivo! Rita me fita com atenção, num misto de surpresa e preocupação.
— As coisas estão mesmo uma loucura — comenta ela, soltando um suspiro.
— Você não faz ideia — concordo, e mudo de assunto: — Diz uma coisa, nós estamos na ilha, né?
— Sim.
— Não é perigoso demais?
— Ninguém sabe além do Iorran e de mim — afirma. — Você precisará ficar aqui, se os outros te verem, sabe-se lá o que tentarão fazer.
Um arrepio involuntário toma conta do meu corpo. Engulo em seco ao lembrar da casa da cultura de Pombal e sua história. Eu sei que na ilha estão pessoas como eu, contudo, se eles tentariam julgar Natanael, o mesmo poderia se fazer comigo. E ser negra é um aditivo para sofrer preconceito extra.
Infelizmente, como você já deve saber, isso ainda é bem comum. Eu ainda não consigo compreender qual o motivo que leva as pessoas a sentirem preconceito por cor de pele, religião, sexualidade ou pelo caralho a quatro. Ok, é uma questão "cultural", disseminada pela sociedade? É, mas ainda existem tantos meios e canais de informação, sem dizer que, no fim do dia, todos nós lutamos pelas mesmas coisas: nossas próprias vidas.
— Vocês são loucos — digo.
Seus lábios se curvam de leve num dos cantos.
— Eu sei, mas eu faria qualquer coisa para te manter segura. — Seus dedos apertam os meus, aquecendo-me. — Quando Lya pediu para Iorran dar um jeito de te trazer até mim, não hesitei em ajudar. Você sofreu um colapso do sistema nervoso de novo, e só eu poderia te ajudar. Além do mais, meus sentimentos por você nublaram o que restava da minha razão.
Mordo o lábio inferior, contaminada por suas últimas palavras. Não é fácil de se imaginar Rita quebrando as regras por causa de sentimentos, tamanha sua racionalidade. Há alguns anos, Carlo teve de ameaçá-la para ajudar Natanael, depois de ser torturado por Tavares. E olha que os dois já eram, de certa forma, amigos na Base do Sul.
— Não posso agradecer por estar se arriscando — replico —, mas tem todo o meu agradecimento por me ajudar e estar sempre tão presente.
— A culpa é sua — aponta um dedo entre meus seios —, você me faz enxergar algumas cores a mais no meu mundinho em preto e branco.
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Futuro Conquistado #2 (Ficção LGBT)
Science FictionDesfecho da duologia iniciada em "Futuro Renegado". "Sacrifícios são feitos de escolhas". Após os acontecimentos de Futuro Renegado, o que se esperava era paz, entretanto, dois ataques súbitos e uma doença degenerativa desmancham o sonho de liberdad...