O quarto

1.2K 89 7
                                    




Jillian entrou no quarto e viu três camas de solteiro, uma do lado da outra, com cobertores de retalhos bem grossos por cima. Camas usadas e bagunçadas, menos uma delas. O banheiro - a suíte - não tinha porta. E nem o quarto em si. Ela ficou um pouco curiosa demais, até que um outro rapaz, esse muito loiro e mais gordinho, entrou no quarto. Ele vestia-se quase como ela, de blusa xadrez e botas e sorriu quando a viu parada com a mala no meio do quarto.

- Você deve ser Jillian, eu sou Logan. - Se apresentou oferecendo a mão pra ela.

- Olá. - Ela apertou a mão dele. - Prazer, Logan.

- Desculpe a bagunça do quarto, Sam é um imprestável. - Anunciou.

- O quarto é... de vocês? - Quis saber. - Eu achei que... há outros quartos onde...

- Não se preocupe... nós sabemos como é ser novo aqui. - Brincou. - Pode ficar com aquela cama. - Apontou para a cama arrumada. - E se precisar de um tempo para se arrumar, eu cuido da porta pra você.

Jillian quase engoliu a língua.

- Não tem um banheiro com porta aqui?

- O do meu pai. - Anunciou. - Mas ele não vai te deixar usar ele.

- Ótimo... - Suspirou. - Ótimo, mesmo! - Ficou chateada. - Você... - Ela percebeu o que ele tinha falado antes e cruzou os braços. - Novo aqui... como... você não cresceu aqui?

- Nem eu e nem Sam. - Sorriu. - Somos adotivos.

- Oh... - Jillian sentiu-se metida por perguntar. - Desculpe, eu não quis...

- Não se meteu, não se preocupe. - Sorriu saltando para uma das camas.

- Eu realmente preciso ir ao banheiro. - Disse Jillian. - Será que...

- Eu posso vigiar a porta do quarto pra você. - Disse Logan. - Como um escudo.

- Seria ótimo. - Concordou. - 10 minutos, no máximo. Eu preciso só me arrumar depois dessa viagem.

- Claro.

O rapaz foi até a porta, como um soldado e plantou-se ali, de costas para ela. Jillian mordeu a boca, um pouco desconfiada, mas também tentou se lembrar que rapazes naquela região eram cavalheiros. Ela teria que confiar nele e sempre uma boa coisa, em um local novo, confiar nas pessoas. Ou pelo menos fazer de conta que confiava.

Jillian começou a tirar a blusa, e andou até o banheiro, abrindo o chuveiro em cima da banheira. Ela realmente precisava de um banho. Colocou sua camisa de lado, com cuidado e olhou-se no espelho da pia, notando que estava ficando com olheiras de novo. Ótimo... ela ia precisar de uma boa noite de sono antes de começar a investigação.

Abriu as calças, as despiu depressa e entrou na água, sem olhar pra trás.

- Se estiver fria demais é só virar a torneira pra esquerda. - A voz alta de Logan, gritando da porta avisou.

- Não se preocupe! - Ela riu. - Eu tomei banho frio por um ano na última expedição.

- O que você faz, afinal? - Ele puxou assunto.

- Eu investigo locais, especialmente civilizações perdidas como índios e nômades... tento aprender o máximo sobre ele, documento tudo e depois descrevo.

- E veio parar aqui... - Ele riu, ainda de costas, respeitando o espaço dela.

- Pra você ver. - Ela riu também, se lavando depressa.

- Eu sei que você veio por causa de Kathlyn e as... circunstâncias da morte dela. Pelo menos é o que todo mundo está falando por aí... como se houvesse um assassino em série solto em Hell's Creek.

- Acha que tem? - Perguntou ouvindo com atenção.

- Eu acho que tem bastante gente esquisita pra uma cidade tão pequena, mas acho que cidades de interior são assim mesmo, não acha?

- Nisso você tem razão. - Concordou passando a mão cheia de sabão no rosto. - Você conhecia Kathlyn?

- Não tanto quanto gostaria. - Ele disse a verdade. - Ela era bem bonita. Eu bem que queria ser namorado dela, se ela me desse bola.

Ele parecia mais sincero do que toda aquela gente, falando assim com o tom leve. E Jillian apreciava isso. Ela apreciava a leveza dele.

- Seu pai disse alguma coisa sobre ritos... de iniciação. - Perguntou finalmente, tentando obter respostas.

- Vai ser uma festa sem graça na verdade. Vai ter um monte de gente velha e comida. Agora... a comida é boa, e eles fazem uma festa pra todo mundo novo na cidade. Acho que é um jeito de todo mundo colocar os olhos na novidade.

- Não vou ficar muito tempo. - Jillian disse fechando o chuveiro, já se sentindo refrescada o suficiente. - Talvez algumas semanas. Um mês, no máximo.

- Não vai conseguir cortar o barato deles... - Brincou. - Você é motivo para festa.

- Kathlyn teve uma festa, então.

- Teve. - Concordou ouvindo a menina se mover no banheiro. - E foi das boas.

- Ela não chegou a trabalhar aqui... como sobrevivia? Sabe onde ela morava?

- Não sei muito bem. - Admitiu. - Eu acho que são perguntas pro Xerife, na verdade. Sobre a casa... ela morava na principal... na última casa... a abandonada. - Mentiu. - Talvez porque fosse barato. Agora, sobre o dinheiro, não sei.. .talvez os pais dela mandassem dinheiro pra ela.

- Talvez. - Jillian puxou uma roupa limpa da mala, andando até o quarto enrolada em uma toalha. - Vocês tem religião ou...

- Não. - Ele riu, agora bem alto. - Quer dizer, eu não. Sam eu acho que... sei lá, já o vi rezando, especialmente quando ele se encrenca com nosso pai. - Brincou.

Jillian sorriu ao ouvir isso.

- Se você me disser que é religiosa...

- Eu não sou. - Interrompeu. - Já fui, quando era criança. Do tipo que usava vestidos e ia pra igreja... patético. - Lembrou-se da imagem da menina de cabelos quase dourados de vestido e sapato de boneca rezando para não apanhar em casa. - Respeito pessoas religiosas, mas não sou uma... não há muito tempo.

- Acho que quando se vê coisa demais... não se consegue ver Deus da mesma forma.. não é mesmo?

- Acho que tem razão. - Começou a se vestir. - Escute... Sam não vai... ficar andando nu por aí, vai?

Logan riu de novo alto.

- Infelizmente ele é bem sem noção. Eu acho que você o pegou de surpresa e...

- Não me entenda mal... - Jillian falou depressa. - Eu já fui até tribos onde todos andavam sem roupa.... Deus, eu fiquei sem roupa quase seis meses na Amazônia logo que comecei a trabalhar. - Lembrou-se. - Mas era o esperado lá. Eu não esperava, em uma fazenda, no meio dos Estados Unidos...

- Eu vou falar com ele. - Sorriu. - Já está vestida? - Quis saber.

- O suficiente. - Disse enfiando a blusa sem alças no corpo, e já com as calças nas pernas.

- Vamos ver papai e vamos te apresentar à fazenda... temos bastante pra fazer antes da festa de hoje.

Hell's CreekOnde histórias criam vida. Descubra agora