Dez

2.5K 294 414
                                    

Nossos lábios desgrudaram-se. Abri os olhos e pude vê-lo sorrindo enquanto os aplausos ecoavam ao fundo. Tiago apenas me fitou por alguns instantes sem demonstrar qualquer sentimento. Logo se virou e foi agradecendo como se estivesse em algum tipo de espetáculo. Em contrapartida, eu só conseguia observar suas ações e pensar no que acabara de acontecer. Em nós dois. Nele.

Era um dia comum de domingo quando tomei a decisão de contar para Anita que estava apaixonado. Estávamos assistindo um filme na casa de Danilo e resolvi aproveitar os minutos que ele nos deixara a sós para pronunciar minha paixão. Ainda lembro da sua reação estupefata e do modo como suas bochechas foram corando ao mesmo tempo em que meu coração pulsava inquieto. Ela não sabia o que dizer, então toquei em seu rosto e a obriguei a olhar nos meus olhos, mesmo que com aquela expressão tímida. Estávamos nervosos.

— Queria ter coragem para ter contado antes — disse trêmulo. — Sempre fui apaixonado por você, Anita. Desde que a vi pela primeira vez.

Contei a história sobre vê-la vestida de bailarina quando éramos crianças e ter me sentido fisgado. Enquanto eu falava, Anita sorria e deixava claro que estava gostando.

— Você não imagina como é bom ouvir isso. Eu... eu tenho gostado de você por tanto tempo, Igor. Desde quando ainda éramos pequenos. Sempre acreditei que esse momento chegaria, até perder um pouco a esperança. Você sempre pareceu gostar de mim apenas como uma amiga.

— É que eu sempre achei que não tinha nenhum tipo de chance com você. Sempre te vi como uma garota inalcançável. Só que não dá mais para guardar tudo isso.

Inesperadamente ela me beijou, um beijo curto, leve. Antes que cerrasse os olhos ela se afastou, e um sentimento de frustração me dominou. Anita parecia sorridente e ofegante e esbanjava satisfação, mas eu não sentia nada além de um desconforto pela traição a Caio.

Passei todo aquele longo tempo sem saber o que era gostar de um beijo, sem sentir o êxtase percorrendo todas as partes do corpo, vivenciando o sentimento metafórico de estar em um outro universo; como se o tempo resolvesse parar junto à força do infinito apenas para observar e presenciar Tiago e eu nos beijando.

Não tenho certeza de quanto tempo aquele beijo durou, mas enquanto estava acontecendo, só conseguia sentir coisas boas. Eu estava leve como nunca havia sentido. Também não tenho certeza de quanto tempo ficamos no café, já que todas as minhas preocupações haviam cessado. Eu só conseguia sorrir, como um tolo anestesiado, enquanto o encarava, constatando o quanto ele era encantador.

Permanecemos algum tempo trocando olhares na frente da sua casa. Queria poder contá-lo o que havia sentido, detalhar todas as sensações e os arrepios que eu sentia a cada movimento; poder contar como meu coração pulsava de um modo eufórico, como se clamasse para que aquele momento não tivesse um fim, mesmo sabendo que tudo não passava de um teatro.

— Obrigado — ele diz — Hoje foi um dia bastante especial.

Retribuo com um sorriso.

— Vamos entrar? Minha mãe já deve ter chegado do trabalho e... — titubeia — gostaria muito que ficasse para o jantar.

— Antes disso, queria dizer... — hesito, sentindo medo. — Obrigado.

— É divertido olhar o mundo sem receios ou preocupações, não é? — ele questiona e assinto com a cabeça. — Podemos fazer isso sempre que estivermos juntos. Vamos lidar com o mundo como se tudo fosse fácil, legal?

— Certo.

Tiago desgrenha meu cabelo, replicando com um fragilizado sorriso espontâneo que eu ainda não conhecia — é sincero e genuíno. Pergunto-me se ele está sentindo o mesmo que eu.

Todas As Coisas Mais Simples (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora