Dezenove

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Tiago me prometeu o melhor dia da minha vida, mas é impossível me sentir bem. Eu sempre quis ser parecido com Laryssa: ter meus problemas, guardá-los em um canto desconhecido e apenas viver. Viver sem me importar. Apenas viver e seguir vivendo sem as preocupações do cotidiano, que cercam minha mente. Comigo não dá. Todos os problemas insistem em ir e voltar, ampliando ainda mais; me enlouquecendo, deixando-me com um enorme peso que também só amplia conforme vejo que as horas vão passando e nada é resolvido.

— Toma. — Tiago retira de dentro da sua mochila uma caixa embalada em papel de presente e me entrega, fazendo-me sorrir instantaneamente. — É para você. Espero que goste. Eu estava esperando um melhor momento para isso, mas depois de tudo que aconteceu hoje, acho que vai ajudar a te distrair um pouco.

— Um presente?

— Sim. Um presente. — Ele sorri e ergue-se sutilmente para me beijar.

— Obrigado. Eu não tenho nem palavras.

— Abre. Por favor.

O café está mais movimentado do que há duas semanas. O clima ainda continua o mesmo, com aquele mesmo cheiro de perfume pairando no ar. Teresa, já havia nos visto e acenado graciosamente. A mulher atendia outra mesa sorridente.

— Tiago, nós estamos namorando mesmo? — questiono, inseguro. — Ou era só um jogo? Um teatro? Uma dessas coisas que você faz?

— Eu não menti quando disse que estou apaixonado por você, Igor.

— Sério?

— Sério.

— Bom... então, eu preciso saber... preciso saber quem é você. O que realmente se passa dentro de você. Me sinto tão impotente ao seu lado. Você parece me conhecer mais do que eu mesmo. Isso é muito estranho.

— Você não acha isso interessante?

Ele me olha com um fascínio. Sinto meu rosto aquecer, fazendo-me ter uma sensação parecida de como se ainda não houvéssemos nos conhecido.

— Talvez — respondo. — Mas sei que você não bate muito bem da cabeça... Isso me preocupa. Muito. Eu não quero ter que descobrir algo sobre você de uma forma abrupta, entende? Sinto que não aguento.

— Confesso que fiquei um pouco ofendido, mas se é isso mesmo que você quer... legal. Então vamos. O que quer saber sobre mim?

— O que aconteceu naquele dia? O que aconteceu antes de você entrar no Albuquerque e decidir se jogar?

— De novo isso? Esse assunto? Já disse que tudo não passava de uma expectativa minha.

— Eu sei disso. Sei da sua irmã e do seu esgotamento mental, mas eu preciso saber do gatilho. Do que te fez tomar essa atitude. Da peça chave. Não sei se consegue me entender.

— Nada. Absolutamente nada. Eu acordei e olhei para todos os cantos do meu novo quarto. Praticamente vazio. Então me lembrei que tinha alguns pôsteres em algum canto da minha mala. Colei eles na parede na esperança de que aquele quarto, lembrasse de alguma forma o meu quarto de Curitiba. O quarto onde cresci. Mas não lembrou. Então eu desci para cozinha, e comi um resto de pizza que estava na geladeira e segui para o Albuquerque. Foi quando eu notei que eu não estava mais entre todas as pessoas que eu conhecia. Foi quando eu notei que ninguém com exceção da Luiza e do Léo, haviam me dado "tchau". E então, eu lembrei do que eu havia feito; dos rostos assustados me encarando e me vendo em cima de um cara aleatório da escola... Eu só me dei conta de que ele tinha desmaiado, quando eu senti o cheiro de sangue; quando o Léo me empurrou para longe. Por pouco... por quase nada, ele não morreu. Então eu percebi o que havia feito. Percebi que além de machucar as pessoas que eu nem ligo, machuco as que eu amo. Eu machuquei a minha irmã. Naquele instante percebi que não adiantava mais viver. Que eu sou um doente. Que sou apenas um, no meio de tantos uns.

Todas As Coisas Mais Simples (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora