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Meu despertador toca. A dor no meu corpo me faz querer não ir pra escola, mas me lembro que eu necessito disso para sobreviver. É o meu futuro.

Coloco os pés no chão e me calço, enquanto coloco a água de café no fogo arrumo minha cama de solteiro e abro a janela. É cedinho, o céu está lindo e os primeiros raios surgem dando vista a uma linda paisagem.

Tomo um banho rápido e me visto para ir pra escola. Tomo meu café com biscoito e escovo os dentes.

Vou sem maquiagem mesmo e toda bagunçada, estava sem paciência de me produzir e não valia a pena me maquiar e suar naquela merda de sala sem ventilador e toda fechada.

Onde eu moro é uma kitnet alugada por Carlos, é confortável, tem um quarto, uma cozinha, uma sala pequena e um banheiro. Eu não pago nada, na verdade eu pago, com meu corpo.

Quando completei quatorze anos ele me disse que para viver ali teria um preço, no começo não entendi, pensei que iria trabalhar pra ele, fazer faxina ou lavar suas roupas, mas não, ele me obrigou em vender meu corpo para seus amigos traficantes. E eu tive que aceitar, eu não tinha nada e não era ninguém.

Carlos mesmo já chegou a abusar de mim. Era nojento e eu me sentia suja. Mas era o preço por uma vida melhor onde eu tinha um teto, comida na mesa e dinheiro para comprar minhas coisas. Eles pagavam por mim, mas quase não via o dinheiro.

Era difícil? Era. Mas tentava levar... várias outras meninas viviam nessa situação e eu tinha certeza que logo iria sair dessa situação e encontraria minha paz. Próximo ano iria fazer dezoito anos e iria me ver livre disso. Assim eu esperava.

Me olho mais uma vez no espelho antes de sair de casa. Prendo meus cabelos ondulados cor de mel em um coque frouxo. Meus olhos castanhos estavam fundos, resultado de noites onde tive que madrugar e estudar. Era assim minha vida.

Deixo minha casa e caminho até o ponto de ônibus de cabeça baixa, algumas pessoas me cumprimentam mas trato de não dá muita intimidade. A maioria sabia o que Carlos fazia comigo, mas ninguém não se importava, só queriam uma boa fofoca.

Caminho até o ponto de ônibus e espero meu ônibus que não demora muito. Pago minha passagem e me sento lá atrás. Agradeço mentalmente por ele estar vazio.

Recebo uma mensagem de Nicole, era era a única amiga que ele tinha, havíamos crescido juntas, a conheço desde que cheguei naquele inferno. Seu pai também era traficante, ela não sabe, mas seu pai já pagou pra me ter e naquele dia eu chorei até não aguentar mais e me senti uma pessoa horrível. Mas caso recusasse, sofria agressão psicológica e física de Carlos. Era sempre assim.

Nick - Wesley nos convidou para uma festa amanhã na casa dele, nós vamos né?

Wesley era um amigo nosso. Já estudei numa escola particular até Carlos me tirar de lá e decidir que não queria mais pagar uma escola para mim, que eu não merecia. Conheci Wesley lá, ele era muito gente boa, mas fazia um tempo que não o via. Wesley era rico, estudava ali porque estava de castigo por reprovar duas vezes no primeiro ano. Nós éramos praticamente um trio. Eu, Nicole e ele.

Fernanda - Hoje vou me encontrar com Francisco, é bem capaz que amanhã esteja acabada e me sentindo um lixo.

Francisco era comandante da boca de fumo, um traficante maldoso e impiedoso. Ele tinha muitas mulheres, e inclusive estas já tentaram brigar comigo, mas fui sincera quando disse que não tinha interesse nele e que o odiava. Elas entenderam e desde então me deixam foram da briga por ele. Eu não queria nada com um traficante, ainda mais com ele.

Francisco devia ter uns vinte e sete anos, era magro dos cabelos encaracolados, era agressivo e gostava de me oferecer drogas e de me agredir. Odiava minhas noites com ele, sempre chorava, mas pra ele, aquilo não adiantava muito. Ele não parava.

Um plano da vida #1Onde histórias criam vida. Descubra agora