Hora do mergulho

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Passei horas observando-os. As vezes pensava na visão de todos eles, mortos pela colina, mas logo tentava descartar a imagem. Ethan dormindo parecia mais novo, calmo, mesmo que, vez ou outra, sua cara se contorcia com alguma coisa ruim, ou ele resmungava. Mas na maior parte do tempo, ficava tranquilo e dormia pesado.

Lucas também estava num sono sereno. Respirava num ritmo gostoso, lento e uniforme. Uma de suas mãos descansavam sobre a minha sobre sua barriga, apertando-a de leve algumas vezes. Eu gostava de vê-lo assim. Era bom e me deixava bem, parecia que não havia acontecido nada de ruim e que estávamos seguros.

Eu acariciava seu cabelo lentamente, sentindo seu cabelo macio e por um nano segundo fechei meus olhos.

Abri-os de novo, de repente, ouvindo mais algum murmuro de Ethan.

  -Culpa... -Ele suspirou, fazendo careta. -Minha culpa.

O que era culpa dele? Me vi atenta, aguardando mais alguma coisa, mas ele se aquietou. A curiosidade me corroía. O que Ethan viu que o deixou tão perturbado? O que aconteceu com Lucas, com suas costas, com... Seus olhos? As visões que tive foram extremamente perturbadoras, mas não me afetou da mesma forma que afetou os dois. Deve ter sido algo muito doloroso, do passado deles. Passados que eu não conheço muito.

Olhei para Lucas. Eu gostaria de saber o que ele me escondia antes de tudo. Ele teve um sonho, e, naquela situação, sonhos eram importantes. Mas ele não me contava e eu não queria mais pressionar ele.

Eu queria ter minha Essência de novo. Talvez eu pudesse curá-lo, mas achava pouco provável. Pelo jeito, não era algo totalmente físico, mas mental, algo que ele não queria nos dizer. Só ele podia se ajudar. Beijei-o de leve na testa e ele suspirou, profundo. Nós vamos dar um jeito.

Fiquei surpresa de não sentir tanto sono, o que me fez pensar: Quanto tempo ficamos presos? Não fazia ideia, e eu estava totalmente sem notícias, o que me deixava muito irritada. Será que eles já acharam a adaga? Será que Intonat já a tem? Ou Matthew? Não, eu me recusava a acreditar nisso.

Eu tinha que tentar de novo, eu precisava de uma luz nesse labirinto maldito. Fechei meus olhos, eu precisava me concentrar. Respirei fundo, procurando qualquer coisa que fosse. Nada. Nem as chamas púrpuras, nem mesmo minha consciência falava comigo. Mas tinha algo de diferente. Me concentrei mais um pouco. A voz era baixa, fraca, masculina, mas jovem, um sussurro claro.

   "Estão próximos, menina, os diurnos.
   Eles perderam alguns, mas isso          
   não os impedirá.
   Corra, menina, está ficando sem
   tempo"

Abri meus olhos. Aquilo não foi normal, mas eu não me sentia mal, da mesma forma que não me sentia bem. Não foi uma força negativa que falou comigo, eu tinha certeza, mas também não era algo que eu conhecia. Por um instante, fiquei com vontade de acordar os rapazes e contar tudo, correr em direção a seja lá onde tinhamos que ir. Mas eu não podia fazer aquilo, precisava deixa-los descansar, mesmo que por pouco. 

 Eu não me lembro de quantas horas se passaram, só me lembro de ouvir o relógio de tio Ethan apitando. Bip, bip, bip. Suspirei, ansiosa para continuar e comecei a balançar Lucas.

  -Ei. -Chamei, balançando-o. -Hora de acordar. 

 Lucas se revirou, apertando um pouco mais minha mão. 

  -Hmm... Não vou deixar... -Ele resmungou.

 Sorri, achando graça. 

  -Precisa acordar, bela adormecida. 

  -Eu não posso deixa-la...

  -Lucas! 

 Seus olhos se abriram, de repente, e meu coração se apertou de novo. Meu sorriso se foi e eu acariciei seu cabelo uma última vez. Ele suspirou, segurando minha mão mais forte, olhando para o vazio, mesmo assim, Lucas me deu um sorriso sonolento. 

As Crônicas dos Daren - Livro II Da Brisa à TempestadeOnde histórias criam vida. Descubra agora